Sobre o humano
A reprodução dos trechos abaixo tem o simples objetivo de estimular a reflexão sobre a natureza humana, o humano demasiado humano como diria Nietzsche. Não é apenas sobre o passado que as palavras se referem; elas dizem muito a respeito do presente…
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“Essa atitude “objetiva” – falar dos campos de concentração em termos de “administração” e dos campos de extermínio em termos de “economia” – era típica da mentalidade da SS, e algo que Eichmann ainda muito se orgulhava no julgamento.”[2]
“… os assassinos não eram sádicos ou criminosos por natureza; ao contrário, foi feito um esforço sistemático para afastar todos aqueles que sentiam prazer físico com o que faziam.”[3]
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“A autêntica religião em geral, e a fé cristã em particular, com sua incansável ênfase sobre o indivíduo e seu papel na salvação, conduzindo à elaboração de um catálogo de pecados maior que o de qualquer outra religião, nunca poderiam ser utilizados como tranqüilizantes. As ideologias modernas, sejam elas políticas, psicológicas ou sociais, são muito mais qualificadas para imunizar a alma do homem contra o impacto traumatizante da realidade do que qualquer religião tradicional que conheçamos. Comparada com as diversas superstições do século XX, a pia resignação à vontade de Deus é como um canivete de criança em competição com armas atômicas.”[5]
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“… os homens não sabem ser honrosamente maus, nem perfeitamente bons, e como uma maldade tem em si alguma coisa de grande ou é generosa em alguma parte, os homens não sabem praticá-la.”[6]
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“Cativos, martirizados, eles se enforcam em séries, atiram-se às caldeiras de garapa fervente – o suicídio é o fato comum; é por exceção que matam o senhor algoz. Relativamente, são raríssimas as vinganças e represálias. A escrava martirizada ontem pela senhora toma-lhe hoje o filho e o cria, amorosa, solícita, com o cuidado e a ternura da maternidade desinteressada. Ainda hoje, os descendentes destes escravizados de três séculos afagam por aí, com o seu carinho esquecido e submisso, o egoísmo do branco absorvente.”[8]
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“Eles mandam, e vós servis; eles dormem, e vós velais; eles descansam, e vós trabalhais; eles gozam o fruto de vossos trabalhos, e o que vós colheis deles é um trabalho sobre outro. Não há trabalhos mais doces que os das vossas oficinas; mas toda essa doçura para quem é? Sois como as abelhas, de quem disse o poeta: ‘Sic vos non vobis mellificatis apes[9]’”[10]
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“Afora os artistas e os intelectuais, poucos agentes sociais dependem tanto, no que são e no que fazem, da imagem que têm de si próprios e da imagem que os outros e, em particular, os escritores e artistas, têm deles e do que eles fazem.”[11]
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E você, caro(a) leitor(a), qual a sua reflexão sobre estas breves citações? Quais palavras que você acrescentaria?
[1] ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 60.
[2] Idem, p. 83.
[3] Idem, p. 121.
[4] PAINE, Thomas. Senso Comum e outros escritos políticos. São Paulo: IBRASA, 1964, p. 3. (Clássicos da Democracia)
[5] ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. São Paulo, Editora Perspectiva, 2001, p. 179.
[6] MAQUIAVEL, Discorsi, I, 27, apud in BIGNOTO, Newton. Maquiavel Republicano. São Paulo: Loyola, 1991, p. 103.
[7] BONFIM, Manuel. A América Latina. In: SANTIAGO, Silviano. (Org. ) Intérpretes do Brasil. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 2000, pp. 607-917 – a citação é da p. 652.
[8] Id., p. 792.
[9] Verso atribuído a Virgílio: “Assim vós, mas não para vós, fabricais o mel, abelhas”.
[10] Padre Antonio Vieira, citado em: BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. São Paulo: Editora Cultrix, 2006, p. 46.
[11] BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo, Editora Perspectiva, 1974, p. 108.
[12] FOX, Robin Lane. Cultura escrita e poder nos primórdios do cristianismo. In: BOWMAN, Alan K. e WOOLF, Greg. (Org.) Cultura escrita e poder no mundo antigo. São Paulo, Ed. Ática, 1998, p. 155.
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