terça-feira, 30 de julho de 2013

BRASIL GASTA R$ 2,33 BILHÕES COM A AVENTURA LULÍSTICA NO HAITI PARA ATENDER OS INTERESSES DO FORO DE SÃO PAULO. QUEM PAGA A CONTA É O POVO BRASILEIRO!


Com razão os soldados da tropa enviada ao Haiti olham para o Lula com olhar de desprezo, como se constata nesta foto.
O governo brasileiro gastou R$ 689 milhões, em valores atualizados, apenas com adicionais salariais para os militares que servem na missão das Nações Unidas no Haiti, no período que vai do início da operação, em 2004, até dezembro de 2012.
O valor, obtido pela Folha em consultas aos comandos do Exército, Marinha e Aeronáutica --com base na Lei de Acesso à Informação--, era desconhecido até então e não integrava os balanços do governo nem de grupos de fiscalização de gastos federais.
Previsto em lei aprovada pelo Congresso, o adicional, que tem o nome técnico de "indenização", funciona da seguinte forma: o militar que é escolhido para participar da operação no Haiti ganha uma remuneração mensal em dólar, paga em espécie, sem prejuízo do vencimento normal que já recebe no Brasil.
Um terceiro-sargento, por exemplo, que recebe no Brasil em média R$ 2.700 líquidos, obtém mais US$ 3 mil (R$ 6.700) mensais pela missão no Haiti --há hoje 231 terceiros-sargentos atuando no país caribenho.
O valor escalonado dos adicionais foi estabelecido em 2004 por meio de lei elaborada pelo governo. As despesas com os adicionais só em 2012 (R$ 106,3 milhões), por exemplo, foram o dobro do desembolsado pelo Exército com o programa "preparo e emprego combinado das Forças Armadas".
Na justificativa enviada ao Congresso quando da aprovação da lei, o então ministro da Defesa, José Viegas, procurou relativizar o gasto, ao dizer que "o custo de uma operação de paz estará, em linhas gerais, limitado aos gastos com pagamento de pessoal no exterior e às despesas com viagens de inspeção, apoio e coordenação".
Segundo Viegas, "os demais custos" seriam "reduzidos ou cobertos pelas indenizações e reembolsos previstos na legislação da ONU para esse tipo de evento".
REEMBOLSOS
O reembolso da ONU ficou muito abaixo dos gastos reais. Em 2004, o Brasil passou a comandar a missão no Haiti como parte da estratégia do governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) de buscar apoio internacional para obter uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU --o que até hoje não ocorreu.
Com as "indenizações", o gasto total do governo brasileiro no Haiti de 2004 a dezembro de 2012 atingiu R$ 3,04 bilhões, em valores atualizados pela inflação. No mesmo período, a ONU reembolsou o Brasil em R$ 709 milhões, em valores igualmente corrigidos. Assim, o Tesouro brasileiro desembolsou efetivamente R$ 2,33 bilhões.
Em nota à Folha, o Ministério da Defesa afirmou que os reembolsos da ONU "cobrem os custos gerados pelo emprego efetivo da tropa na missão de paz".
"Os custos referentes às fases anteriores e posteriores ao emprego da tropa (mobilização, preparo e desmobilização) são, em geral, arcados pelo país contribuinte, como no caso do Brasil", diz o texto do ministério.
Não há previsão oficial para a saída das tropas brasileiras do Haiti --hoje são 1.120 militares na missão.
Em ao menos duas ocasiões, o ministro da Defesa, Celso Amorim, já manifestou sua preocupação sobre evitar "uma zona de conforto" no Haiti. Em maio último, disse que o Brasil pretende "progressivamente deixar para o Haiti a responsabilidade por sua segurança e pela manutenção da lei e da ordem".

Indagado pela Folha sobre os benefícios da presença brasileira no Haiti, o Exército disse, em nota, que a missão "traz crescente prestígio à política externa e às Forças Armadas brasileiras, aumentando a projeção nacional no cenário mundial". Da Folha de S. Paulo desta terça-feira

As falhas, incoerências e falácias do arcabouço intelectual de Karl Marx




Marx-Fussnagel.jpgO principal trabalho teórico de Marx é sua grande obra em três volumes, sobre o capital. Os fundamentos de sua teoria da exploração estão expostos no primeiro destes volumes, o único a ser publicado em vida do autor em 1867.  O segundo, editado postumamente por Engels, em 1885, está em total harmonia com o primeiro, quanto ao conteúdo. Menos harmônico é sabidamente o terceiro volume, publicado novamente após um intervalo de vários anos, em 1894. Muitas pessoas, entre elas o autor destas linhas, acreditam que o conteúdo do terceiro volume seja incompatível com o do primeiro, e vice-versa. Mas, como o próprio Marx não admitiu isso e, ao contrário, também no terceiro volume exigiu que se considerassem totalmente válidas as doutrinas do primeiro, a crítica deve considerar as teses expostas nesse primeiro livro expressão da verdadeira e permanente opinião de Marx. Mas é igualmente válido — e necessário — abordar no momento adequado as doutrinas do terceiro volume, como ilustração e crítica.
A teoria de Marx sobre o valor
Marx parte do principio de que o valor de toda mercadoria depende unicamente da quantidade de trabalho empregada em sua produção.  Marx coloca este princípio no ápice de sua teoria, dedicando-lhe uma explicação extensa e fundamentada.
O campo de pesquisa que Marx se propõe a examinar para entender a origem do valor dos bens fica limitado originalmente às mercadorias, o que, para Marx, não significa todos os bens econômicos, mas apenas os produtos de trabalho criados para o mercado.  Ele começa com uma análise da mercadoria.  A mercadoria é, por um lado, uma coisa útil cujas qualidades satisfazem algum tipo de necessidade humana, um valor de uso; por outro, constitui o suporte material do valor de troca.  A análise passa agora para este último.  
O valor de troca aparece de imediato como a relação quantitativa, a proporção na qual valores de uso de um tipo se trocam com valores de uso de outro tipo, relação essa que muda constantemente, conforme tempo e lugar.
Portanto, parece ser algo casual. Mas nessa troca deveria haver algo de permanente, que Marx trata de pesquisar. E faz isso na sua conhecida maneira dialética:
Tomemos duas mercadorias, por exemplo, trigo e ferro. Seja qual for a sua relação de troca, pode-se representá-la sempre numa equação segundo a qual uma quantidade dada de trigo é igualada a uma quantidade de ferro, p. ex., um moio de trigo x quintais de ferro. O que significa essa equação? Que existe algo de comum, do mesmo tamanho, em duas coisas diferentes, ou seja, em um moio de trigo e x quintais de ferro. Portanto, as duas coisas se equiparam a uma terceira, que em si não é nem uma nem outra. Cada uma das duas, portanto, na medida em que tem valor de troca, deve ser reduzível a essa terceira.
Dialética do valor em Marx
Esse elemento comum não pode ser uma característica métrica, física, química, ou outra característica natural das mercadorias. Suas características corporais, aliás, só entram em consideração na medida em que as tornam úteis, e são, portanto, valores de uso. Mas, por outro lado, a relação de troca das mercadorias aparentemente se caracteriza por se abstrair dos valores de uso dessas mercadorias. Segundo ela, o valor de uso vale tanto quanto qualquer outro, desde que apareça na proporção adequada. Ou, como diz o velho Barbon: "... Um tipo de mercadoria é tão bom quanto outro, quando seu valor de troca for igual. Não existe distinção entre coisas do mesmo valor de troca.' Como valores de uso, as mercadorias são principalmente de qualidades diferentes, como valores de troca só podem ser de quantidades diferentes e, portanto, não contêm um átomo sequer de valor de uso.
Abstraindo o valor de uso das mercadorias, elas guardam ainda uma característica, a de serem produtos de trabalho. No entanto, também o produto de trabalho já se transformou em nossas mãos. Se abstrairmos o seu valor de uso, também estaremos abstraindo os elementos e formas corporais que o tornam valor de uso. Não se trata mais de mesa, ou casa, ou fio, ou outra coisa útil. Todas as suas características sensoriais estão apagadas. Ele também já não é o produto da marcenaria, ou da construção, ou da tecelagem, ou de qualquer trabalho produtivo. Com o caráter utilitário dos produtos de trabalho, desaparece o caráter utilitário dos trabalhos neles efetuados, e somem também as diversas formas concretas desses trabalhos. Eles já não se distinguem entre si [p.283]: reduziram-se todos ao mesmo trabalho humano, trabalho humano abstrato.
Consideremos agora o que restou dos produtos de trabalho. Nada resta deles senão aquela mesma objetualidade espectral, mera gelatina de trabalho humano indistinto, ou seja, o gasto de forças de trabalho humanas sem consideração pela forma desse dispêndio. Essas coisas apenas nos dizem que na sua produção se gastou força de trabalho humano, se acumulou trabalho humano. Como cristais dessa substancia social comum, eles são valores.
Assim se define e se determine o conceito de valor.  Segundo a teoria dialética, ele não é idêntico ao valor de troca, mas relaciona-se com ele de maneira íntima e inseparável: ele é uma espécie de destilado conceitual do valor de troca. Para usar as palavras do próprio Marx, ele é "a parte comum que aparece na relação de troca ou valor de troca das mercadorias".  O reverso é igualmente válido: "o valor de troca é a expressão necessária ou a manifestação do valor".
O "tempo de trabalho socialmente necessário" de Marx
Marx passa da determinação do conceito de valor para a exposição de sua medida e grandeza.  Como o trabalho é a substância do valor, consequentemente a grandeza do valor de todos os bens se mede pela quantidade de trabalho neles contido, ou seja, pelo tempo de trabalho.  Mas não aquele tempo de trabalho individual, que aquele indivíduos que produziu o bem casualmente precisou gastar, mas o "tempo de trabalho necessário para produzir um valor de uso, nas condições sociais normais de produção disponíveis, e com o grau de habilidade e intensidade do trabalho possíveis nessa sociedade".
Só a quantidade de trabalho socialmente necessário ou o tempo de trabalho socialmente necessário para produzir um valor de uso é que determina o seu valor. A mercadoria isolada vale aqui como exemplo médio da sua espécie. Mercadorias contendo igual quantidade de trabalho, ou que podem ser produzidas no mesmo tempo de trabalho, têm por isso o mesmo valor. O valor de uma mercadoria relaciona-se com o valor de outra mercadoria, da mesma forma que o tempo de trabalho necessário para a produção de uma delas se relaciona com o tempo de trabalho necessário para a produção da outra. Como valores, todas as mercadorias são apenas medidas de tempo de trabalho cristalizado.
A "lei do valor" de Marx
De tudo isso, deduz-se o conteúdo da grande "lei de valor", que é "imanente à troca de mercadorias" e que domina as condições de troca.  Essa lei significa — e só pode significar — que as mercadorias se trocam entre si segundo as condições de trabalho médio, socialmente necessário, incorporado nelas.  Há outras formas de expressão da mesma lei: nas palavras de Marx, as mercadorias "se trocam entre si conforme seus valores" ou "equivalente se troca com equivalente".
É verdade que, em casos isolados, segundo oscilações momentâneas de oferta e procura, também aparecem preços que estão acima ou abaixo do valor.  Só que essas "constantes oscilações dos preços de mercado (...) se compensam, se equilibram mutuamente e se reduzem ao preço médio, que é sua regra interna".  Porém, no longo prazo, "nas relações de troca casuais e sempre variáveis", "o tempo de trabalho socialmente necessário acaba sempre se impondo à força, como lei natural imperante".
Marx considera essa lei como sendo a "eterna lei de troca de mercadorias", como "racional", como "a lei natural do equilíbrio".  Os casos eventuais em que mercadorias são trocadas a preços que se desviam do seu valor são considerados "casuais" em relação à regra, e os próprios desvios devem ser vistos como "infração da lei de troca de mercadorias".
A "mais-valia" de Marx
Sobre essa base da teoria do valor, Marx ergue a segunda parte de sua doutrina, a sua famosa doutrina da mais-valia.  Ele examina a origem dos ganhos extraídos pelos capitalistas dos seus capitais.  Os capitalistas tomam determinada soma em dinheiro, transformam-na em mercadorias, e, por meio da venda, transformam as mercadorias em mais dinheiro — com ou sem um processo intermediário de produção.  De onde vem esse incremento, esse excedente da soma de dinheiro obtida em relação à soma originalmente aplicada, ou, como diz Marx, essa mais-valia"?
Marx começa limitando as condições do problema, na sua peculiar maneira de exclusão dialética.  Primeiro, ele explica que a mais-valia não pode vir do fato de que o capitalista, como comprador, compra as mercadorias regularmente abaixo do seu valor e, como vendedor, regularmente as vende acima do seu valor.  Portanto, o problema é o seguinte: "Nosso ( ... ) dono do dinheiro tem de comprar as mercadorias pelo seu valor, e vendê-las pelo seu valor, mas, mesmo assim, no fim do processo, tem de extrair delas um valor mais alto do que o que nelas aplicou. . .  Essas são as condições do problema. Hic Rhodus, hic salta!" [Aqui é Rodes, então salte aqui!" (N. do T.)]
Marx encontra a solução dizendo que existe uma mercadoria cujo valor de uso tem a singular faculdade de ser uma fonte de valor de troca.  Essa mercadoria é a 'capacidade de trabalho', ou seja, a força de trabalho.  Ela é posta à venda no mercado sob dupla condição: a primeira, de que o trabalhador seja pessoalmente livre — caso contrário não seria a força de trabalho o que ele estaria vendendo, mas ele próprio, sua pessoa, como escravo; e a segunda, de que o trabalhador seja destituído "de todas as coisas necessárias para a realização de sua força de trabalho", pois, se delas dispusesse, ele preferiria produzir por conta própria, pondo à venda seus produtos, em vez de sua força de trabalho.  
Pela negociação com essa mercadoria, o capitalista obtém a mais-valia. O processo se dá da seguinte forma:
O valor da mercadoria "força de trabalho" depende, como o de qualquer outra mercadoria, do tempo de trabalho necessário para sua produção, o que, nesse caso, significa que depende do tempo de trabalho necessário para produzir todos os alimentos que são indispensáveis à subsistência do trabalhador.  Se, por exemplo, para os alimentos necessários para um dia for preciso um tempo de trabalho de seis horas, e se esse tempo de trabalho corporificar três moedas de ouro, a força de trabalho de um dia poderia ser comprada por três moedas de ouro. Caso o capitalista tenha efetuado essa compra, o valor de uso da força de trabalho lhe pertence, e ele a concretiza fazendo o trabalhador trabalhar para ele.  Se o fizesse trabalhar apenas as horas diárias corporificadas na força de trabalho pelas quais ele teve de pagar quando comprou essa força de trabalho (seis horas), não existiria a mais-valia.
Ou seja, as seis horas de trabalho não podem atribuir ao produto em que elas se corporificam mais do que três moedas, uma vez que foi isso que o capitalista pagou como salário.  Contudo, os capitalistas não agem dessa maneira.  Mesmo que tenham comprado a força de trabalho por um preço que corresponde só a seis horas de trabalho, fazem o trabalhador trabalhar o dia todo.  Então, no produto criado durante esse dia, se corporificam mais horas de trabalho do que as que o capitalista pagou, o que faz o produto ter valor mais elevado do que o salário pago. A diferença é a "mais-valia", que fica para o capitalista.
Tomemos um exemplo: suponhamos que um trabalhador possa tecer em seis horas cinco quilos de algodão em fio, com o valor de três moedas.  Suponhamos, também, que esse algodão tenha custado vinte horas de trabalho para ser produzido e que, por isso, tem um valor de dez moedas; suponhamos, ainda, que o capitalista tenha despendido, por meio de sua máquina de tecer utilizada para estas seis horas de tecelagem, o correspondente a quatro horas de trabalho, que representam um valor de duas moedas. Assim, o valor total dos meios de produção consumidos na tecelagem (algodão + máquina de tecer) equivalerá a doze moedas, correspondentes a vinte e quatro horas de trabalho.  Se acrescentarmos a isso as seis horas do trabalho de tecelagem, o tecido pronto será pois, no total, produto de trinta horas de trabalho, e terá, por isso, valor de quinze moedas.  Se o capitalista deixar o trabalhador trabalhar apenas seis horas por dia, a produção do fio vai custar-lhe 15 moedas: 10 pelo algodão, 2 pelo gasto dos instrumentos, 3 em salário.  Não existe mais-valia.
Muito diferente seriam as circunstâncias se este mesmo capitalista fizesse o trabalhador cumprir 12 horas diárias. Nestas 12 horas, o trabalhador processaria 10 quilos de algodão, nos quais já teriam sido corporificadas, anteriormente, 40 horas de trabalho, com um valor de 20 moedas.  Os instrumentos teriam consumido o produto de 8 horas de trabalho, no valor de 4 moedas, mas o trabalhador acrescentaria ao material bruto um dia de 12 horas de trabalho, ou seja, faria surgir um valor adicional de 6 moedas.  As despesas do capitalista — 20 moedas pelo algodão, 4 moedas pelo gasto dos instrumentos, e 3 pelo salário — somariam apenas 27 moedas.  Iria, então, sobrar uma "mais-valia" de 3 moedas.
Portanto, para Marx, a mais-valia é uma consequência do fato de o capitalista fazer o trabalhador trabalhar para ele sem pagamento durante uma parte do dia.  O dia de trabalho se divide, assim, em duas partes: na primeira, o "tempo de trabalho necessário", o trabalhador produz seu próprio sustento, ou o valor deste; por essa parte do trabalho, ele recebe o equivalente em forma de salário.  Durante a segunda parte, o "superávit em tempo de trabalho", ele é "explorado", e produz a "mais-valia", sem receber qualquer equivalente por ela.  
Portanto, o capital não é apenas controle sobre o trabalho, como diz Adam Smith.  É essencialmente controle sobre o trabalho não-pago.  Toda a mais-valia, seja qual for a forma em que vá se cristalizar mais tarde — lucro, juro, renda etc. — é, substancialmente, materialização de trabalho não pago.  O segredo da autovalorização do capital reside no controle que exerce sobre determinada quantidade de trabalho alheio não pago.
Marx escolheu um método de análise defeituoso
Alguém que busque uma verdadeira fundamentação da tese em questão poderá encontrá-la por meio de dois caminhos naturais: o empírico e o psicológico.  O primeiro caminho nos leva a simplesmente examinar as condições de troca entre mercadorias, procurando ver se nelas se espelha uma harmonia empírica entre valor de troca e gasto de trabalho.  O outro — com uma mistura de indução e dedução muito usada em nossa ciência — nos leva a analisar os motivos psicológicos que norteiam as pessoas nas trocas e na determinação de preços, ou em sua participação na produção.  Da natureza dessas condições de troca poderíamos tirar conclusões sobre o comportamento típico das pessoas.  Assim, descobriríamos, também, uma relação entre preços regularmente pedidos e aceitos, de um lado, e a quantidade de trabalho necessária para produzir mercadorias de outro.  Mas Marx não adotou nenhum desses dois métodos naturais de investigação.  É muito interessante constatar, em seu terceiro volume, que ele próprio sabia muito bem que nem a comprovação dos fatos nem a análise dos impulsos psicológicos que agem na "concorrência" teriam bom resultado para a comprovação de sua tese.
Marx opta por um terceiro caminho de comprovação, aliás, um caminho bastante singular para esse tipo de assunto: a prova puramente lógica, uma dedução dialética tirada da essência da troca.
Marx já havia encontrado no velho Aristóteles que "a troca não pode existir sem igualdade, e a igualdade não pode existir sem a comensurabilidade".  Marx adota esse pensamento.  Ele imagina a troca de duas mercadorias na forma de uma equação, deduz que nas duas coisas trocadas — portanto igualadas — tem de existir "algo comum da mesma grandeza", e conclui propondo-se a descobrir o que é essa coisa em comum, à qual as coisas equiparadas podem ser reduzidas como valores de troca.
Fatos que antecedem uma troca devem evidenciar antes desigualdade do que igualdade
Gostaria de intercalar aqui um comentário.  Mesmo a primeira pressuposição — a de que na troca de duas coisas existe uma "igualdade" das duas, igualdade essa que se manifesta, o que, afinal, não significa grande coisa — me parece um pensamento muito pouco moderno e também muito irrealista, ou, para ser bem claro, muito precário. Onde reinam igualdade e equilíbrio perfeitos não costuma surgir qualquer mudança em relação ao estado anterior.  Por isso, quando no caso da troca tudo termina com as mercadorias trocando de dono, é sinal de que esteve em jogo alguma desigualdade ou preponderância que forçou a alteração.
Exatamente como as novas ligações químicas que surgem a partir da aproximação entre elementos de corpos: muitas vezes o "parentesco" químico entre os elementos do corpo estranho aproximado não é forte, mas é mais forte do que o "parentesco" existente entre os elementos da composição anterior.  De fato, a moderna ciência econômica é unânime em dizer que a antiga visão escolástico-teológica da "equivalência" de valores que se trocam é incorreta.  Mas não darei maior importância a esse assunto, e volto-me agora ao exame crítico daquelas operações lógicas e metódicas através das quais o trabalho termina por surgir como aquela coisa em "comum" à qual as coisas equiparadas se poderiam reduzir.
Método intelectual errôneo de Marx
Para a sua busca desse algo em "comum" que caracteriza o valor de troca, Marx procede da seguinte maneira: coteja as várias características dos objetos equiparados na troca e, depois, pelo método de eliminação das diferenças, exclui todas as que não passam nessa prova, até restar, por fim, uma única característica, a de ser produto de trabalho.  Conclui, então, que seja esta a característica comum procurada.
É um procedimento estranho, mas não condenável.  É estranho que, em vez de testar a característica de modo positivo — o que teria levado a um dos dois métodos antes comentados, coisa que Marx evitava —, ele procure convencer-se, pelo processo negativo, de que a qualidade buscada é exatamente aquela, pois nenhuma outra é a que ele procura, e a que ele procura tem de existir.  Esse método pode levar à meta desejada quando é empregado com a necessária cautela e integridade, ou seja, quando se tem, escrupulosamente, o cuidado necessário para que entre realmente, nessa peneira lógica, tudo o que nela deve entrar para que depois não se cometa engano em relação a qualquer elemento que porventura fique excluído da peneira.
Mas como procede Marx?
Desde o começo, ele só coloca na peneira aquelas coisas trocáveis que têm a característica que ele finalmente deseja extrair como sendo a "característica em comum", deixando de fora todas as outras que não a têm.  Faz isso como alguém que, desejando ardentemente tirar da urna uma bola branca, por precaução coloca na urna apenas bolas brancas.  Ele limita o campo da sua busca da substância do valor de troca às "mercadorias".  Esse conceito, sem ser cuidadosamente definido, é tomado como mais limitado do que o de "bens" e se limita a produtos de trabalho, em oposição a bens naturais. Consequentemente, fica óbvio que, se a troca realmente significa uma equiparação que pressupõe a existência de algo "comum da mesma grandeza", esse "algo comum" deve ser procurado e encontrado em todas as espécies de bens trocáveis: não só nos produtos de trabalho, mas também nos dons da natureza, como terra, madeira no tronco, energia hidráulica, minas de carvão, pedreiras, jazidas de petróleo, águas minerais, minas de ouro etc.[1]
Excluir, na busca do algo "comum" que há na base do valor de troca, aqueles bens trocáveis que não sejam bens de trabalho é, nessas circunstâncias, um pecado mortal metodológico.  É como se um físico que quisesse pesquisar o motivo de todos os corpos terem uma característica comum, como o peso, por exemplo, selecionasse um só grupo de corpos, talvez o dos corpos transparentes, e, a seguir, cotejasse todas as características comuns aos corpos transparentes, terminando por demonstrar que nenhuma das características — a não ser a transparência — pode ser causa de peso, e proclamasse, por fim, que, portanto, a transparência tem de ser a causa do peso.
A exclusão dos dons da natureza (que certamente jamais teria ocorrido a Aristóteles, pai da ideia da equiparação na troca) não pode ser justificada, principalmente porque muitos dons naturais, como o solo, são dos mais importantes objetos de fortuna e comércio. Por outro lado, não se pode aceitar a afirmação de que, em relação aos dons naturais, os valores de troca são sempre casuais e arbitrários: não só existem preços eventuais para produtos de trabalho, como também, muitas vezes, os preços de bens naturais revelam relações nítidas com critérios ou motivos palpáveis.  É conhecido que o preço de compra de terras constitui um múltiplo da sua renda segundo a porcentagem de juro vigente.  É também certo que, se a madeira no tronco ou o carvão na mina obtêm um preço diferente, isso decorre da variação de localização ou de problemas de transporte e não do mero acaso.
Marx se exime de justificar expressamente o fato de haver excluído do exame anterior parte dos bens trocáveis. Como tantas vezes, também aqui sabe deslizar sobre partes espinhosas de seu raciocínio com uma escorregadia habilidade dialética: ele evita que seus leitores percebam que seu conceito de "mercadoria" é mais estreito do que o de "coisa trocável".  Para a futura limitação no exame das mercadorias, ele prepara com incrível habilidade um ponto de contato natural, através de uma frase comum, aparentemente inofensiva, posta no começo do seu livro: "A riqueza das sociedades em que reina a produção capitalista aparece como uma monstruosa coleção de mercadorias."  Essa afirmação é totalmente falsa se entendermos o termo "mercadoria" no sentido de produto de trabalho, que o próprio Marx lhe confere mais tarde.  Pois os bens da natureza, incluindo a terra, são parte importante e em nada diferente da riqueza nacional.  Mas o leitor desprevenido facilmente passa por essas inexatidões, porque não sabe que mais tarde Marx usará a expressão "mercadoria" num sentido muito mais restrito.
Aliás, esse sentido também não fica claro no que se segue a essa frase.  Ao contrário, nos primeiros parágrafos do primeiro capitulo fala-se alternadamente de "coisa", de "valor de uso", de "bem" e de "mercadoria", sem que seja traçada uma distinção nítida entre estes termos. "
A utilidade de uma coisa", escreve ele na p. 10, "faz dela um valor de uso". "A mercadoria. . . é um valor de uso ou bem". Na p. 11, lemos: "o valor de troca aparece... como relação quantitativa... na qual valores de uso de uma espécie se trocam por valorem de uso de outra."
Note-se que aqui se considera primordialmente no fenômeno do valor de troca também a equação 'valor de uso = bem'.  E com a frase "examinemos a coisa mais de perto", naturalmente inadequada para anunciar o salto para outro terreno, mais estreito, de análise, Marx prossegue:  "Uma só mercadoria, um 'moio' de trigo, troca-se nas mais diversas proporções por outros artigos."  E ainda: "tomemos mais duas mercadorias" etc.  Aliás, nesse mesmo parágrafo ele volta até com a expressão "coisas", e logo num trecho muito importante, em que diz que "algo comum da mesma grandeza existe em duas coisas diferentes" (que são equiparadas na troca).
A falácia de Marx consiste em uma seleção tendenciosa de evidências
No entanto, na p. 12, Marx prossegue na sua busca do "algo comum" já agora apenas para o "valor de troca das mercadorias", sem chamar a atenção, com uma palavra que seja, para o fato de que isso estreitará o campo de pesquisa, direcionando-o para apenas uma parcela das coisas trocáveis. 
Logo na página seguinte (p. 13), ele abandona de novo essa limitação, e a conclusão, a que há pouco havia chegado para o campo mais restrito das mercadorias, passa a ser aplicada ao círculo mais amplo dos valores de uso dos bens. "Um valor de uso ou bem, portanto, só tem um valor, na medida em que o trabalho humano abstrato se materializa ou se objetiva nele!"
Se, no trecho decisivo, Marx não houvesse limitado sua pesquisa aos produtos de trabalho, mas tivesse também procurado o "algo comum" entre os bens naturais trocáveis, ficaria patente que o trabalho não pode ser o elemento comum.  Se Marx houvesse estabelecido essa limitação de maneira clara e expressa, tanto ele quanto seus leitores infalivelmente teriam tropeçado nesse grosseiro erro metodológico.  Teriam sorrido desse ingênuo artifício, através do qual se "destila", como característica comum, o fato de "ser produto de trabalho", pesquisando num campo do qual antes foram indevidamente retiradas outras coisas trocáveis que, embora comuns, não são "produto do trabalho".  
Só seria possível lançar mão deste artifício da maneira como o fez — ou seja, sub-repticiamente — com uma dialética ríspida, passando bem depressa pelo ponto espinhoso da questão.  Expresso minha admiração sincera pela habilidade com que Marx apresentou de maneira aceitável um processo tão errado, o que, sem dúvida, não o exime de ter sido inteiramente falso.
Continuemos.
Por meio do artifício acima descrito, Marx conseguiu colocar o trabalho no jogo.  Através da limitação artificial do campo de pesquisa, o trabalho se tomou a característica "comum".  No entanto, além dele, há outras características que deveriam ser levadas em conta, por serem comuns.  Como afastar essas concorrentes?
Marx faz isso por meio de dois raciocínios, ambos muito breves, e ambos contendo um gravíssimo erro de lógica
No primeiro, Marx exclui todas as "características geométricas, físicas, químicas ou quaisquer outras características naturais das mercadorias".  Isso porque "suas características físicas só serão levadas em conta na medida em que as tornam úteis, portanto as transformam em valores de uso.  Mas por outro lado, a relação de troca das mercadorias aparentemente se caracteriza pela abstração de seus valores de uso".  Pois "dentro dela (da relação de troca) um valor de uso cabe tanto quanto outro qualquer, desde que exista aí em proporção adequada".
O que diria Marx do argumento que segue?  Em um palco de ópera, três cantores, todos excelentes — um tenor, um baixo e um barítono —, recebem, cada um, um salário de 20.000 moedas por ano.  Se alguém perguntar qual é a circunstância comum que resulta na equiparação de seus salários, respondo que, quando se trata de salário, uma boa voz vale tanto quanto outra: uma boa voz de tenor vale tanto quanto uma boa voz de baixo, ou de barítono, o que importa é que a proporção seja adequada.  Assim, por poder ser, "aparentemente", afastada da questão salarial, a boa voz não pode ser a causa comum do salário alto.
É claro que tal argumentação é falsa.  É igualmente claro também que é incorreta a conclusão a que Marx chegou, e que foi por mim aqui transcrita.  As duas sofrem do mesmo erro.  Confundem a abstração de uma circunstância em geral com a abstração das modalidades específicas nas quais essa circunstância aparece.  Em nosso exemplo, o que é indiferente para a questão salarial é apenas a modalidade específica da boa voz, ou seja, se se trata de voz de tenor, baixo ou barítono.  Mas não a boa voz em si.
Da mesma forma, para a relação de troca das mercadorias, abstrai-se da modalidade específica sob a qual pode aparecer o valor de uso das mercadorias, quer sirvam para alimentação, quer sirvam para moradia ou para roupa. Mas não se pode abstrair do valor de uso em si.  Marx deveria ter deduzido que não se pode fazer abstração desse último, pelo fato de que não existe valor de troca onde não há valor de uso.  Fato que o próprio Marx é forçado a reconhecer repetidamente.[2]
Mas coisa pior acontece com o passo seguinte dessa cadeia de argumentação.  "Se abstrairmos do valor de uso das mercadorias", diz Marx textualmente, "resta-lhes só mais uma característica: a de serem produtos de trabalho".  Será mesmo?  Só mais uma característica?  Acaso bens com valor de troca não têm, por exemplo, outra característica comum, qual seja, a de serem raros em relação à sua oferta?  Ou de serem objetos de cobiça e de procura?  Ou de serem ou propriedade privada ou produtos da natureza?
E ninguém diz melhor nem mais claramente do que o próprio Marx que as mercadorias são produtos tanto da natureza quanto do trabalho: Marx afirma que "as mercadorias são combinação de dois elementos, matéria-prima e trabalho", e conclui dizendo que "o trabalho é o pai (da riqueza) e a terra é sua mãe".
Por que, pergunto eu, o princípio do valor não poderia estar em qualquer uma dessas características comuns, tendo de estar só na de ser produto de trabalho?  Acresce que, a favor dessa última hipótese, Marx não apresenta qualquer tipo de fundamentação positiva.  A única razão que apresenta é negativa, pois diz que o valor de uso, abstraído, não é princípio de valor de troca.  Mas essa argumentação negativa não se aplica, com igual força, a todas as outras características comuns, que Marx ignorou?
E há mais ainda!  Na mesma p. 12, em que Marx abstraiu da influência do valor de uso no valor de troca, argumentando que um valor de uso é tão importante quanto qualquer outro, desde que exista em proporção adequada, ele nos diz o seguinte sobre o produto de trabalho:
Mas também o produto de trabalho já se transformou em nossas mãos.  Se abstrairmos do seu valor de uso, abstrairemos também dos elementos materiais e das formas que o tornam valor de uso.  Ele já não será mesa, casa ou fio, ou outra coisa útil.  Todas as suas características sensoriais serão eliminadas.  Ele não será produto de trabalho em marcenaria, construção ou tecelagem, ou outro trabalho produtivo.  O caráter utilitário dos trabalhos corporificados nos produtos de trabalho desaparece se desaparecer o caráter utilitário destes produtos de trabalho, da mesma forma que desaparecem as diversas formas concretas desse trabalho: elas já não se distinguem; são reduzidas a trabalho humano igual, a trabalho humano abstrato.
Será que se pode dizer, de modo mais claro e explícito, que, para a relação de troca, não apenas um valor de uso, mas uma espécie de trabalho, ou produto de trabalho, "vale tanto quanto qualquer outro, desde que exista na proporção adequada"?  E que se pode aplicar ao trabalho exatamente o mesmo critério em relação ao qual Marx antes pronunciou seu veredito de exclusão contra o valor de uso?  Trabalho e valor de uso têm, ambos, um aspecto quantitativo e outro qualitativo.  Assim como o valor de uso é qualitativamente diverso em relação a mesa, casa ou fio, assim também são qualitativamente diferentes os trabalhos de marcenaria, de construção ou de tecelagem.  Por outro lado, trabalhos de diferentes tipos podem ser diferenciados em função de sua quantidade, enquanto é possível comparar valores de uso de diferentes tipos segundo a magnitude do valor de uso.  É absolutamente inconcebível que circunstâncias idênticas levem, ao mesmo tempo, à exclusão de alguns elementos e à aceitação de outros!
Se, por acaso, Marx houvesse alterado a sequência de sua pesquisa, teria excluído o trabalho com o mesmo raciocínio com que exclui o valor de uso.  Com o mesmo raciocínio com que premiou o trabalho, proclamaria, então, que o valor de uso, por ser a única característica que restou, é aquela característica comum tão procurada.  A partir daí poderia explicar o valor como uma "cristalização do valor de uso".
Creio que se pode afirmar, não em tom de piada, mas a sério, que nos dois parágrafos da p. 12 onde se abstrai, no primeiro, a influência do valor de uso e se demonstra, no segundo, que o trabalho é o "algo comum" que se buscava, esses dois elementos poderiam ser trocados entre si sem alterar a correção lógica externa.  E que, sem mudar a estrutura da sentença do primeiro parágrafo, se poderia substituir "valor de uso" por "trabalho e produtos de trabalho", e na estrutura da segunda colocar, em lugar de "trabalho", o "valor de uso"!
Assim é a lógica e o método com que Marx introduz em seu sistema o princípio fundamental de que o trabalho é a única base do valor.  Julgo totalmente impossível que essa ginástica dialética fosse a fonte e a real justificativa da convicção de Marx. Um pensador da sua categoria — e considero-o um pensador de primeiríssima ordem —, caso desejasse chegar a uma convicção própria, procurando com olhar imparcial a verdadeira relação das coisas, jamais teria partido por caminhos tão tortuosos e antinaturais.  Seria impossível que ele tivesse, por mero e infeliz acaso, caído em todos os erros lógicos e metodológicos acima descritos, obtendo, como resultado não conhecido nem desejado, essa tese do trabalho como única fonte de valor.
Creio que a situação real foi outra.  Não duvido de que Marx estivesse sinceramente convencido de sua tese. Mas os motivos de sua convicção não são aqueles que estão apresentados em seus sistemas.  Ele acreditava na sua tese como um fanático acredita num dogma.  Sem dúvida, foi dominado por ela por causa das mesmas impressões vagas, eventuais, não bem controladas pelo intelecto, que antes dele já tinham desencaminhadoAdam Smith e David Ricardo, e sob influência dessas mesmas autoridades.  E ele, certamente, jamais alimentou a menor dúvida quanto à correção dessa tese.  Seu princípio tinha, para ele próprio, a solidez de um axioma.  No entanto, ele teria de prová-lo aos leitores, o que não conseguiria fazer nem empiricamente nem segundo a psicologia que embasa a vida econômica.
Voltou-se, então, para essa especulação lógico-dialética que estava de acordo com sua orientação intelectual.  E trabalhou, e revolveu os pacientes concertos e premissas, com uma espécie de admirável destreza, até obter realmente o resultado que desejava e que já de antemão conhecia, na forma de uma conclusão externamente honesta.
Conforme vimos acima, Marx teve pleno sucesso nessa tentativa de fundamentar convincentemente sua tese, enveredando pelos caminhos da dialética. Mas será que teria obtido algum amparo se tivesse seguido aqueles caminhos específicos que evitou, ou seja, o empírico e o psicológico?

Leia também: A teoria marxista da exploração e a realidade

[1] Karl Knies objeta com muito acerto contra Marx: "Na exposição de Marx não há nenhum motivo pelo qual a equação 1 "moio" de trigo = x quintais de madeira produzida na floresta não permita uma segunda equação, também válida, que diga: 1 "moio" de trigo = w quintais de madeira virgem = y acres de terra virgem = z acres de terra cultivada com prados naturais." (Das Geld, Iª ed. p. 121;1 2ª ed p. 157).
[2] Por exemplo, na p. 15, final: "Por fim, nenhuma coisa pode ter valor sem ser objeto de uso. Se for inútil, o trabalho nela contido será inútil, não valerá como trabalho (sic!), e por isso não constituirá valor."
Já Karl Knies chamara atenção para o erro lógico do texto. Veja-se Das Geld, Berlim, 1873, p. 123 ss. (2ª ed. p. 160 ss). Estranhamente, Adler (Grundlagen der Karl Marxschen Kritik, Tübingen, 1887, p. 211 ss) entendeu mal meu argumento, quando me censura dizendo que "boas vozes" não são mercadorias no sentido marxista. Para mim, não se tratava de considerar "boas vozes" como bens econômicos, segundo a lei marxista de valor, mas sim de dar o exemplo de um silogismo que revela o mesmo erro de Marx. Eu poderia muito bem escolher outro exemplo, que não tivesse nenhuma relação com o terreno econômico. Por exemplo, poderia ter demonstrado que, segundo a lógica marxista, o "algo comum" está em haver colorido em sabe-Deus-o-quê, mas não em haver uma mistura de várias cores. Pois uma mistura de cores — por exemplo, branco, azul, amarelo, preto, violeta — vale para a qualificação "colorido" o mesmo que a mistura de verde, vermelho, laranja, azul etc., desde que as cores apareçam em proporção adequada. Portanto, vamo-nos abstrair, no momento, das cores e das misturas de cor!

Eugen von Böhm-Bawerk (1851-1914) foi um economista austríaco da Universidade de Viena e ministro das finanças.  Desvendou a moderna teoria intertemporal das taxas de juros em sua obra Capital and Interest. Em seu segundo livro, The Positive Theory of Capital, ele continuou seus estudos sobre a acumulação e a influência do capital, argumentando que há um período médio de produção em todos os processos produtivos.  Sua ênfase na importância de se pensar claramente sobre taxas de juros e sua natureza intertemporal alterou para sempre a teoria econômica.  Böhm-Bawerk tornou-se famoso por ser o primeiro economista a refutar de forma completa e sistemática a teoria da mais-valia e da exploração capitalista.  Veja sua biografia.

 


Sobre o valor-trabalho e as cinco exceções factuais negligenciadas por Marx






Marx.jpgA experiência mostra que o valor de troca está em relação com a quantidade de trabalho apenas em parte dos bens, e, mesmo nesses, isto só acontece incidentalmente.  A relação factual, embora seja muito conhecida em decorrência da obviedade dos fatos em que se baseia, é raramente levada em conta.  Todo mundo — inclusive os intelectuais socialistas — concorda que a experiência não confirma inteiramente o princípio do trabalho.  Frequentemente encontramos a opinião de que os casos em que a realidade está de acordo com o princípio do trabalho formam a regra geral, e que os casos que contrariam esse princípio são uma exceção bastante insignificante.  Essa ideia é muito errônea.  Para corrigi-la de uma vez por todas, pretendo reunir as "exceções" que proliferam no início do trabalho, dentro da ciência econômica.  Verão que as "exceções" são tão numerosas, que pouco sobra para a "regra".
1) Em primeiro lugar, todos os "bens raros" foram excluídos do princípio do trabalho. Esses são todos os bens que não podem nunca — ou só podem limitadamente — ser reproduzidos em massa, por algum impedimento objetivo ou legal.  Ricardo menciona, por exemplo, estátuas e quadros, livros raros, moedas raras, vinhos excelentes, e comenta ainda que esses bens "são apenas uma parte muito pequena dos bens diariamente trocados no mercado".  Se pensarmos que nessa mesma categoria se situam, além da terra, todos os inúmeros bens cuja produção está relacionada à patente de invenção, direitos autorais ou segredo industrial, não se consideraria insignificante a extensão de tais bens.
2) Todos os bens que não se produzem por trabalho comum, mas qualificado, são considerados como exceção. Embora nos produtos diários de um escultor, de um marceneiro especializado, de um fabricante de violinos ou de um construtor de máquinas, não se corporifique mais trabalho do que no produto diário de um simples trabalhador manual, ou de um operário de fábrica, os produtos dos primeiros frequentemente têm valor de troca mais elevado — às vezes muito mais elevado — que os dos segundos.
Os defensores da teoria do valor-trabalho naturalmente não puderam ignorar essa exceção.  Porém, singularmente, fazem de conta que isso não é exceção, mas apenas uma pequena variante, que ainda se mantém dentro da regra.  Marx, por exemplo, considera o trabalho qualificado apenas um múltiplo do trabalho comum. "O trabalho complexo", diz ele, "vale só como trabalho comum potenciado, ou multiplicado.  Assim, uma pequena quantidade de trabalho complexo equivale a uma quantidade maior de trabalho comum.  A experiência nos mostra que essa redução acontece constantemente.  Uma mercadoria pode ser produto de um trabalho complexo mas, se seu valor a iguala ao produto de trabalho comum, ela passa a representar apenas determinada quantidade de trabalho comum".
Eis urna obra-prima de espantosa ingenuidade!  Não há nenhuma dúvida de que em muitas coisas — por exemplo, no valor monetário — um dia de trabalho de um escultor pode valer cinco dias de trabalho de um cavador de valetas.  Mas que 10 horas de trabalho do escultor sejam realmente 60 horas de trabalho comum, certamente ninguém pretende afirmar.  Acontece que, para a teoria — assim como para se estabelecer o princípio do valor — não importa o que as pessoas pretendem, e sim o que é real.  Para a teoria, o produto diário do escultor continua sendo produto de um dia de trabalho.  Se, por acaso, um bem que seja produto de um dia de trabalho vale tanto quanto outro bem que seja produto de cinco dias de trabalho, não importa o que as pessoas queiram que ele valha.
E aí está uma exceção à regra — que se quer impor — de que o valor de troca dos bens se mede pela quantidade de trabalho humano neles corporificado.  Imaginemos uma ferrovia que determinasse suas tarifas segundo a extensão do trajeto exigido por passageiros e cargas, mas que determinasse também que, dentro de um trecho com operações particularmente dispendiosas, cada quilômetro fosse computado como dois quilômetros.  Será possível a alguém dizer que a extensão do trajeto é o único princípio para a determinação das tarifas da ferrovia? Certamente não; finge-se que sim, mas, na verdade, o princípio é modificado levando em conta a natureza do trajeto.  Assim também; apesar de todos os artifícios, não se pode salvar a unidade teórica do princípio do trabalho.
Essa segunda exceção abrange também significativa parcela dos bens comerciais, o que não deve ser necessário explicar mais detidamente.  Se quisermos ser rigorosos, estão aí contidos praticamente todos os bens, uma vez que na produção individualizada de quase todos os bens entra em jogo ao menos um pouco de trabalho qualificado: o trabalho de um inventor, de um diretor, de um capataz etc.  Isso eleva o valor do produto a um nível um pouco acima daquele que corresponderia apenas à quantidade de trabalho.
3) A quantidade de exceções aumenta com o número bastante grande de bens produzidos por trabalho extraordinariamente mal pago.  É sabido que — por razões que aqui não se precisa mencionar — em certos ramos da produção o salário de trabalho está sempre abaixo do mínimo necessário para a sobrevivência, como, por exemplo, no caso do trabalho manual feminino, como bordados, costura, malharia etc.  Os produtos dessas ocupações têm, então, um valor extraordinariamente baixo.  Não é incomum que o produto de três dias de trabalho de uma simples costureira não valha nem mesmo o produto de dois dias de uma operária de fábrica.
Todas as exceções que mencionei até aqui eximem certos grupos de bens da validade da lei do valor do trabalho, reduzindo, pois, o campo de validade desta própria lei.  Na verdade, deixam para a lei do valor do trabalho apenas aqueles bens para cuja reprodução não há qualquer limite, e que nada exigem para sua criação além de trabalho.  Mas mesmo esse campo de aplicabilidade tão reduzido não é dominado de modo absoluto pela lei do valor do trabalho: também aí, algumas exceções afrouxam sua validade.
4) Uma quarta exceção do princípio do trabalho é formada pelo conhecido e admitido fenômeno de que também aqueles bens cujo valor de troca se harmonize com a quantidade de custos de trabalho não demonstram tal harmonia em todos os momentos.  Ao contrário: pelas oscilações de oferta e procura, frequentemente o valor de troca sobe ou desce além ou aquém daquele nível que corresponderia ao trabalho corporificado naqueles bens, trabalho esse que só determinaria um ponto de gravitação, não uma fixação do valor de troca.
Parece-me que os defensores socialistas do princípio do trabalho também se ajeitam depressa com essa exceção. Constatam-na, sim, mas a tratam como uma pequena irregularidade passageira, que em nada prejudica a grande "lei" do valor de troca.  Mas não se pode negar que tais irregularidades não são mais que exemplos de valores de troca regulados por outros motivos que não a quantidade de trabalho.  Esse fato deveria provocar pelo menos uma investigação, no sentido de examinar a possibilidade de existir um princípio mais geral do valor de troca, que explicaria não só os valores de troca "regulares", mas também aqueles que — do ponto de vista da teoria do trabalho — são tidos como irregulares.  Nenhuma investigação desse tipo será encontrada entre os teóricos dessa linha.
5) Por fim, vemos que, além dessas oscilações momentâneas, o valor de troca dos bens se desvia da quantidade de trabalho que eles corporificam, de maneira considerável e constante.  De dois bens cuja produção exige exatamente a mesma quantidade média de trabalho, aquele que exigiu maior quantidade de trabalho "prévio" vale mais.  Como sabemos, Ricardo comentou extensamente essa exceção do princípio de trabalho, em duas seções do Capitulo I de suas Grundsätze.  Marx a ignorou na formulação de suas teorias,[1] sem a negar expressamente, o que não poderia fazer: é conhecido demais, para admitir dúvidas, o fato de que o valor de um tronco de carvalho centenário é mais elevado do que o correspondente ao meio-minuto que sua semeadura requer.
Vamos resumir: parcela considerável dos bens não faz parte daquela presumida "lei" segundo a qual o valor dos bens é determinado pela quantidade de trabalho neles corporificada, e o restante dos bens nem obedece sempre, nem com exatidão.  Esse é o material empírico que serve de base para os cálculos do teórico do valor.
Que conclusão um investigador imparcial pode tirar?  Certamente não será a de que a origem e medida de todo valor se fundamenta exclusivamente no trabalho. Uma conclusão dessas não seria em nada melhor do que aquela a que se poderia chegar, pelo método experimental, a partir da constatação de que a eletricidade vem não só do atrito, mas também de outras fontes: toda eletricidade provém de atrito.
Em contrapartida, pode-se concluir que o dispêndio de trabalho exerce ampla influência sobre o valor de troca de muitos bens.  Mas não como causa definitiva, comum a todos os fenômenos de valor, e sim como causa eventual, particular.  Não haverá a necessidade de procurar uma fundamentação interna para essa influência do trabalho sobre o valor, pois ela não seria encontrada.  Pode também ser interessante — além de importante — observar melhor a influência do trabalho sobre o valor dos bens, e expressar esses resultados na forma de leis.  Mas não se pode esquecer que estas não serão mais que leis particulares, que em nada atingem a essência do valor.
Para usar de uma comparação: leis que formulam a influência do trabalho no valor dos bens estão para a lei geral do valor mais ou menos como a lei "Vento oeste traz chuva" está para uma teoria geral da chuva.  Vento oeste é uma causa eventual de chuva, como o emprego de trabalho é causa eventual do valor dos bens.  Mas a essência da chuva se fundamenta tão pouco no vento oeste quanto o valor se fundamenta no emprego de trabalho.
Marx agravou o erro de Ricardo
O próprio Ricardo ultrapassou um pouco as fronteiras legítimas. Ele sabia muito bem que sua lei do valor do trabalho era somente uma lei particular de valor, e que o valor dos "bens raros", por exemplo, tem outros fundamentos.  Mas Ricardo engana-se na medida em que valoriza demais o campo de abrangência dessa lei, atribuindo-lhe uma validade praticamente universal.  A este engano pode-se relacionar o fato de que, em fases posteriores, ele praticamente não dá mais atenção às exceções, pouco valorizadas, que no começo de sua obra mencionara com bastante acerto.  E muitas vezes — injustamente — fala de sua lei como se ela fosse realmente uma lei universal de valor.
Foram os seus sucessores — que ampliaram o campo de abrangência dessa lei — que caíram no erro quase inconcebível de apresentar o trabalho, com pleno e consciente rigor, como princípio universal de valor.  Digo "erro quase inconcebível", pois, com efeito, é difícil acreditar que homens de formação teórica pudessem firmar, depois de reflexão madura, uma doutrina que não podiam apoiar em coisa alguma: nem na natureza da coisa, uma vez que nesta natureza não se revela absolutamente nenhuma relação necessária entre valor e trabalho; nem na experiência, pois esta, ao contrário, mostra que o valor geralmente não se coaduna com o dispêndio de trabalho; nem mesmo, por fim, nas autoridades, pois as autoridades invocadas jamais afirmaram o princípio com aquela pretendida universalidade que agora lhe era conferida.
Mas os seguidores socialistas da teoria da exploração, quando apresentam um princípio tão precário, não o colocam numa posição secundária, em algum ângulo inofensivo de sua doutrina teórica.  Colocam-no no topo de suas afirmações práticas mais importantes. Sustentam que o valor de todas as mercadorias repousa no tempo de trabalho nelas corporificado.  Em outro momento, atacam todos os valores que não se coadunam com essa "lei" (por exemplo, diferenças de valor que recaem como mais-valia para os capitalistas), dizendo-os "ilegais", "antinaturais" e "injustos", e condenando-os a anulação.
Portanto, primeiro ignoram a exceção e proclamam a lei do valor como sendo universal.  Em seguida, após terem obtido, sub-repticiamente, a universalidade dessa lei, voltam a prestar atenção às exceções, rotulando-as de infração dessa lei.  Com efeito, tal argumentação não é muito melhor do que a de alguém que constate que existe gente louca — ignorando que também há gente sensata — e que, a partir desta constatação, chegue a uma "lei de valor universal" segundo a qual "todas as pessoas são loucas", exigindo que se exterminem todos os sábios, considerados "fora da lei".


[1] Marx só lhe dá atenção expressa no terceiro volume, póstumo, como era de se esperar, e, como resultado, entra em contradição com as leis do primeiro volume que tinha construído sem levarem em conta a exceção.  

Eugen von Böhm-Bawerk (1851-1914) foi um economista austríaco da Universidade de Viena e ministro das finanças.  Desvendou a moderna teoria intertemporal das taxas de juros em sua obra Capital and Interest. Em seu segundo livro, The Positive Theory of Capital, ele continuou seus estudos sobre a acumulação e a influência do capital, argumentando que há um período médio de produção em todos os processos produtivos.  Sua ênfase na importância de se pensar claramente sobre taxas de juros e sua natureza intertemporal alterou para sempre a teoria econômica.  Böhm-Bawerk tornou-se famoso por ser o primeiro economista a refutar de forma completa e sistemática a teoria da mais-valia e da exploração capitalista.  Veja sua biografia.

Dilma zomba do fim dos protestos no Brasil


" O Brasileiro tem no sangue o samba e o futebol e não tem sangue para reivindicações bobas"

Nesta sexta feira pela manhã a presidente Dilma fez um comentário meio sem noção sobre as manifestações no Brasil.

Perguntada se ela tinha medo da volta dos protestos pelo Brasil ele disse " O povo Brasileiro não tem costume de protestar, eu e minha equipe já prevíamos o final dos protestos, já temos estratégias para despistar a atenção do povo na copa do mundo"
O repórter Amarildo Lima perguntou o por que ela achava que os protestos não voltariam
" O Brasileiro tem no sangue  o samba e o futebol e não tem sangue para reivindicações bobas"

A presidente Dilma fez esses comentários e logo depois o porta voz da presidência da república veio  trazer retratações da presidente dizendo:
"não falei nada demais apenas falei do ponto positivo dos brasileiros, simplesmente eu já  sabia que esses protestos apenas eram rápidos"
A notícia virou polêmica e está na internet se espalhando.

Preferem salvar pássaros e acabar com pessoas!



Como já anunciado há algum tempo, a histeria do aquecimento global está verdadeira e finalmente acabada, mas as ameaças dos ambientalistas às liberdades individuais não se limitam a esta fraude de aquecimento... alias, elas não têm limites!  Talvez o limite seja quando conseguirem acabar com toda a vida humana na Terra — logicamente poupando a si próprios, já que suas recomendações nunca se aplicam a eles mesmos, como nos mostram, por exemplo, Al Gore e o Príncipe Charles.


E é exatamente isto que os criminosos da Polícia Federal estão fazendo aberta e impunemente no Brasil hoje.  O cartunista comunista Ziraldo (que recebeu mais de R$1 milhão do governo e recebe uma pensão de mais de R$4 mil por mês) foi sadicamente preciso ao ilustrar o cartaz da campanha criminosa que é exibido em todos os aeroportos do país (pelo qual deve ter recebido do estado outro volumoso pagamento):
 CartazTraficodeAnimais_PF.jpg
É isto.  Estão sequestrando seres humanos e os jogando em cadeias pelo motivo de preservar pássaros intocados no mato, longe dos olhos dos humanos que os admiram e gostariam de preservá-los perto deles.  A inversão devalores morais é assustadora, onde, conforme já denunciei em um artigo, "esta ideologia valoriza mais insetos, sapos, micos e mato do que o homem."
Fernando Chiocca é um intelectual anti-intelectualpraxeologista e conselheiro do Instituto Ludwig von Mises Brasil.

postado por Fernando Chiocca 

A França e sua social-democracia em um cul-de-sac






barbekta.jpgHá pouco mais de um ano, em meio a uma persistente crise econômica, François Hollande celebrou sua vitória sobre Nicolas Sarkozy nas eleições presidenciais da França.  Hollande se tornou o líder de um país economicamente debilitado.  Durante todo o ano passado, ele praticamente teve passe livre para implantar sua agenda econômica, uma vez que o Partido Socialista francês, do qual ele é o líder, possui maioria no parlamento francês.
A França possui um histórico de gastos governamentais portentosos, mesmo para os parâmetros dos países europeus.  O gasto público equivale a 57% do produto doméstico, e a dívida pública está acima de 90% do PIB.  Embora 'austeridade' seja o jargão em voga no resto da Europa desde 2009, o que resultou apenas em um muito modesto declínio dos gastos governamentais como porcentagem do PIB naquele continente, a França não faz parte desta tendência.
O setor público francês hoje responde por praticamente dois terços de toda a atividade econômica direta — e mais ainda se levarmos em conta toda a atividade indireta.  Esta grande e crescente dependência do governo é desastrosa, pois é financiada por impostos cada vez maiores.  Esta alta carga tributária não apenas é um fardo enorme para o setor privado, como também confere ao setor público uma aura de impotência, pois este se mostra totalmente incapaz de estimular a economia (quem imaginava isso?) e de controlar seus crescentes gastos.  E os seguidos déficits no orçamento do governo lograrão apenas fazer com que as futuras gerações de cidadãos franceses tenham de pagar pelas generosidades do governo atual.
Profundamente arraigada na psique francesa está a ideia de que cortes em seu colossal setor público iriam afetar sobremaneira toda a população.  Esta incapacidade de considerar uma economia na qual o setor privado preencha a lacuna deixada pelo governo, quando menos serviços públicos forem ofertados, vem reforçando a relutância de políticos, e mais especificamente de François Hollande, de adotar medidas de austeridade (no caso, corte de gastos) para superar a crise.  Em vez disso, a solução vigente foi a de aumentar ainda mais os gastos do governo, criando mais empregos no setor público.  Por esta razão, o governo Hollande prometeu elevar o salário mínimo de todos os empregados, tanto do setor privado quanto do público, e contratar mais 60.000 professores para o setor público.
Além dos atuais aumentos nos gastos públicos, as medidas de Hollande já garantiram inevitáveis aumentos futuros no gasto público.  Ele revogou a iniciativa de Sarkozy de elevar a idade de aposentadoria de 60 para 62, o que significa que os pagadores de impostos franceses serão obrigados a não apenas dar amparo ao explosivo número de funcionários públicos que "trabalham" hoje, como também a sustentar o crescente número de aposentados amparados pelos generosos benefícios da previdência.
Em um esforço para combater o aumento das taxas de juros dos títulos de sua dívida — pois os investidores estrangeiros estão cada vez mais desconfiados da capacidade do governo de pagar os juros de sua dívida —, o governo francês iniciou uma campanha para elevar os impostos para continuar financiando seus inchados gastos.  Com efeito, uma das principais promessas eleitorais de Hollande foi a de impor uma alíquota de 75% sobre os chamados riche (cidadãos que ganham mais de 1 milhão de euros por ano).
A França possui uma das maiores alíquotas de imposto de renda de pessoa jurídica em toda a União Europeia, maior até mesmo do que a da Suécia.  Ao passo que a alíquota média da União Europeia está em declínio (de aproximadamente 50% em 2005 para 44% em 2012), a alíquota da França permaneceu em um nível extremamente alto (de mais de 65% entre 2005 e 2012).
Além das altas alíquotas tributárias, as empresas francesas também têm de enfrentar as mais altas e inflexíveis demandas sociais de toda a União Europeia — como as dos sindicatos —, bem como todas as opressivas regulamentações governamentais.  Estes fatores fazem com que o ambiente empreendedorial seja totalmente desestimulante.  Recentemente, várias grandes empresas preferiram fechar suas portas a ter de lidar com essas difíceis condições empreendedoriais, o que resultou em milhares de pessoas perdendo seus empregos.  Neste clima, não é de se surpreender que não estejam surgindo novas empresas.
Em resposta à ameaça de impostos mais altos na França, o primeiro-ministro britânico David Cameron se ofereceu para "estender o tapete vermelho" para qualquer francês "rico" que queira emigrar e fugir dos impostos franceses.  É claro que seria ingenuidade pensar que Cameron estivesse motivado por algum outro objetivo que não o de conseguir mais dinheiro para seus combalidos cofres; mas o resultado, no entanto, é positivo, pois significa que está havendo uma concorrência tributária entre as nações.
Antes do advento da União Monetária Europeia, nações altamente endividadas buscavam atenuar suas aflições fiscais por meio de políticas inflacionárias.  Só que a França aboliu essa opção ao adotar o euro.  Ironicamente, como Philipp Bagus demonstrou em seu livro A Tragédia do Euro, foram os franceses que mais agressivamente lutaram pela integração monetária da Europa.  Eles agora estão tendo de aderir aos resultados desta decisão.
Como Jesús Huerta de Soto explicou detalhadamente, a união monetária funciona como uma espécie de padrão-ouro moderno.  Assim como o ouro impedia que os governos incorressem em déficits contínuos, o euro está restringindo as nações europeias de maneira similar, retirando delas a capacidade de adotar uma política monetária autônoma.
Sem poder recorrer a políticas monetárias inflacionistas, o governo francês está à mercê dos investidores estrangeiros e do mercado de títulos.  Quanto mais os emprestadores se preocuparem com a solvência do governo francês e sua capacidade de quitar suas dívidas, tanto agora quanto no futuro, mais as taxas de juros subirão (como já subiram).  À medida que o custo dos novos empréstimos for aumentando, o governo francês terá de reduzir seus déficits, seja por meio de um corte nos gastos ou por meio de um aumento nos impostos.  O setor privado francês já representa a minoria severamente sobrecarregada, e dado o atual êxodo de empresas e empreendedores franceses para outros países, qualquer aumento de imposto estaria incidindo sobre um número cada vez menor de pagadores de impostos.
Assim como vários de seus colegas, François Hollande sabe que a combalida economia francesa precisa de uma mudança radical.  O que ele tem de fazer é se concentrar nas áreas que ele pode mudar.  Se ele quiser reduzir o desemprego, ele terá de cortar gastos para poder reduzir impostos.  Não há alternativa.  Adicionalmente, o setor privado tem de ganhar espaço para respirar e poder se recuperar, em vez de ser tratado como um ganso a ser depenado.  Esta é a única maneira na qual o governo francês poderá continuar operando; e, ainda mais importante, a única maneira de tirar a França de seu beco sem saída — ou cul-de-sac, no idioma de Bastiat.

David Howden é professor assistente de economia na Universidade de St. Louis, no campus de Madri, e vencedor do prêmio do Mises Institute de melhor aluno da Mises University.

50 ANOS DA RENUNCIA DE JANIO QUADROS

A renúncia do ex-presidente Jânio Quadros completa 50 anos em 25 agosto. Para explicar os acontecimentos daquele tempo, as dificuldades de um país que mal entrara na democracia e já namorava o caos e o autoritarismo que culminariam no golpe militar de 1964, a equipe de VEJA preparou uma reportagem especial em três plataformas: na internet, em tablets e também na edição impressa. A unir esses três universos, estão os textos do jornalista Augusto Nunes, colunista do site de VEJA e um profundo conhecedor das desventuras do imprevisível Jânio.  Foram três meses de pesquisa em acervos de fotos, vídeos e áudios, revistas, biografias de Jânio, documentos históricos e entrevistas com especialistas - um passeio multimídia pela história do político da “vassourinha” e pelos sete meses que marcaram sua breve presidência.
Jânio Quadros

O populismo como religião


Em campanhas sucessivas, o professor de geografia que não fizera sucesso como advogado atraiu eleitores para um caminho que dispensou projetos políticos e programas ideológicos. Nascia o janismo
Jânio Quadros

O ilusionista do palanque


Num tempo em que comícios eram como novela das 8, ninguém fez tanto sucesso quanto Jânio
Quadro de Jânio Quadros, Praça dos Três Poderes, Brasília

Sete meses na montanha-russa


Entre freadas bruscas e acelerações vertiginosas, Jânio governou à beira do penhasco

Artigo: O gesto que antecipou a ditadura militar



Augusto Nunes


Renúncia

"Foi o maior erro que cometi"


A confissão tardia, feita ao neto pouco antes da morte, não absolve Jânio. Com a desistência abrupta, a democracia brasileira, ainda em sua infância, começou a agonizar em 25 de agosto de 1961


O último ato oficial

Trecho do cinejornal 'Brasil, República Parlamentar – Imagens da Crise que Abalou a Nação', com Jânio Quadros na comemoração do Dia do Soldado, seu último ato como presidente em 1961 (Arquivo Nacional)

O gesto que antecipou a ditadura militar

Augusto Nunes
Otavio
Sete anos depois do suicídio de
 Getúlio Vargas, sete meses depois
da posse, o presidente Jânio Quadros precipitou, com sete linhas manuscritas, a sequência de crises que conduziria, sete anos
 mais tarde, ao Ato Institucional n° 5 — e à instauração da ditadura sem camuflagens.
Na manhã de 25 de agosto de 1961, a democracia, ainda em sua infância, viu-se forçada
a renunciar à maturidade, que só seria alcançada caso fossem cumpridos integralmente
dois mandatos consecutivos. O Brasil civilizado pareceu mais distante do que nunca no
 dia em que o presidente sumiu.
Abrupto e inesperado, o último ato foi um fecho coerente para a ópera do absurdo
 composta desde o primeiro dia de gestão. “Ele foi a UDN de porre no governo”, resumiu
 Afonso Arinos de Mello Franco, ministro das Relações Exteriores.  “Faltou alguém trancá-lo
 no banheiro”, lastimou. 
Só se fosse para sempre, sabe-se hoje. Algumas horas de cárcere privado só adiariam a
tentativa de instituir o presidencialismo autoritário que o deixaria livre para agir.
Na carta da renúncia, o signatário informou que deixara com o ministro da Justiça as razões do seu gesto. O segundo texto confiado a Oscar Pedroso Horta é um amontoado de queixas difusas, alusões a “forças terríveis”, declarações de amor ao Brasil e juras de apreço ao Povo (com maiúscula). Ele só contou a verdade alguns meses antes de morrer, em 16 de fevereiro de 1992, numa conversa com Jânio John Quadros Mulcahy, o único filho homem de Tutu Quadros.
Em 25 de agosto de 1991, 30 anos depois da renúncia, o paciente internado no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, foi acometido de um surto de sinceridade provocado pela curiosidade do neto. 
“O vice João Goulart era uma espécie de Lula, completamente inaceitável para a elite”, comparou. “Eu o mandei para a China para que estivesse longe de Brasília no dia da renúncia, sem condições de reivindicar o cargo e fazer articulações políticas. Achei que iriam implorar-me para que ficasse.”
O intuitivo genial só se esqueceu de combinar com os adversários, com os militares e com o povo. “Fiquei com a faixa presidencial até o dia 26”, contou ao neto. “Deu tudo errado. E o país pagou um preço muito alto.” Jango acabou engolido pelos quartéis, mas seria expelido três anos mais tarde. A tentativa de implantação de uma ditadura civil resultou no advento de uma ditadura militar ortodoxa.
Como o país, Jânio pagou caro pela renúncia ao mandato conferido por mais de 5,6 milhões de eleitores. Transformado numa caricatura de si próprio, tentou a ressurreição impossível antes e depois da cassação, em 1964. Fracassou em 1962 e em 1982, na tentativa de voltar ao governo paulista, e elegeu-se prefeito da capital em 1985. Aos 75 anos, morreu pensando na presidência. Aparentemente, a frustração pela morte política não foi compensada pela fortuna depositada num banco suíço.
Cinquenta anos depois da renúncia, o Brasil parece bem menos primitivo, a democracia tem solidez e Jânio figura na galeria presidencial como outro ponto fora da curva. Mas tampouco parece suficientemente moderno para considerar-se livre de reprises da farsa. Países exauridos pela corrupção endêmica serão sempre vulneráveis a aventureiros que, com um discurso sedutoramente agressivo, prometam varrer a bandalheira.