segunda-feira, 23 de setembro de 2013

SÓ 10% DOS PLANOS DE SAÚDE SATISFAZEM O CONSUMIDOR



» MARINELLA CASTRO

Em meio à batalha judicial iniciada pelos grandes planos de saúde para reverter as punições que suspendem a venda de convênios no país, o presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), André Longo, diz que o órgão brigará na Justiça, sem trégua, para manter o atual método de cálculo e avaliação das infrações. A intenção é prosseguir com a suspensão da venda de 212 planos de 21 operadoras, que não conseguiram atender seus consumidores dentro de prazos estabelecidos pela legislação e acumulam reclamações como a negativa de cobertura. A medida está sub judice, o que prejudica os consumidores, que continuam comprando planos de péssima qualidade e, pior, pagando caro. “Podemos e devemos reverter esse processo na Justiça”, sustenta o executivo.

Para ele, processos para melhorar a qualidade dos convênios estão sendo intensificados. Nos próximos dias, a ANS divulgará o resultado de projeto piloto que mede a satisfação dos consumidores com seus convênios médicos. O levantamento revela que, das 89 operadoras que participaram do processo, apenas nove conseguiram ficar na faixa de maior satisfação do consumidor. Ou seja, apenas 10% entregam plenamente o que prometem. A agência também divulgará um mapeamento sobre a oferta de planos individuais e familiares nomercado nacional, já que esse segmento — ao contrário dos contratos coletivos — tem preços controlados e vem sendo alvo de desinteresse das empresas que estão deixando de comercializar o produto. O caso mais recente de saída desse mercado foi a Golden Cross, que repassou todos os cliente individuais para a Unimed-Rio. A intenção é mostrar que a oferta está firme. “Não há desabastecimento”, defende Longo. Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista.

 
Monique Renne/CB/D.A Press 

Operadoras de grande porte, entre elas, a Amil e a Sul América, recorreram à Justiça pedindo a revisão do modelo de cálculo utilizado pela ANS para suspender a venda de planos de saúde. A agência pretende mudar essa fórmula?
Não. Podemos e devemos reverter esse processo na Justiça. É preciso dizer que esse é um modelo que aposta no protagonismo do consumidor. É o usuário que informa à agência quando as regras não são cumpridas, tanto os prazos para atendimento quanto a negativa de cobertura. Esse modelo foi discutido com o setor antes de entrar em vigor. O que ocorre é que ele criou uma dificuldade para as operadoras, mas é um monitoramento muito importante para garantir que o consumidor tenha o que contratou. A judicialização desse processo nos preocupa, porque pode gerar uma instabilidade, afetando a mediação de conflitos que hoje atingem quatro a cada cinco demandas que chegam à agência. O monitoramento é para todos, pequenos e grandes, mas colocou duas grandes operadoras em evidência. Todos precisam ampliar seus esforços para atender a demanda de seus clientes. A suspensão atinge aqueles que são reincidentes na falha.

Qual o ponto de maior conflito no modelo de cálculo?
As operadoras têm prazo para responder e enviar documentos à agência. Mas, muitas vezes, as respostas são imprecisas, sem clareza. As empresas alegam que, mesmo com essas falhas, as reclamações não poderiam ser computadas no índice da ANS. Esse é um dos pontos que estão sendo discutidos judicialmente. É importante deixar claro que isso é muito ruim, pois deve haver um estímulo para que as respostas ocorram de forma adequada.

A ANS realizou projeto piloto para medir a satisfação do brasileiro com a sua operadora. Quais foram as respostas desse programa?
Vamos anunciar esses resultados com detalhes nos próximos dias. Participaram do monitoramento piloto 89 operadoras, que representam mais de 17 milhões de usuários. Foram realizadas mais de 60 mil entrevistas. Nove empresas estão no maior patamar, de muita satisfação do consumidor, as outras ficaram na faixa da satisfação.

No passado, a ANS já considerou autorizar índices de reajustes maiores ou menores, de acordo com a qualidade do serviço prestado pela operadora. Essa proposta ainda permanece?
Estamos investindo para acelerar os processo de qualidade, para depois pensarmos em colocar os resultados para influenciar os preços dos planos. Hoje, o consumidor já pode avaliar a qualidade da operadora para exercer a portabilidade (levar o convênio para outra empresa). O índice de reclamações é um bom indicador para medir essa satisfação do usuário. No último índice, de agosto, por exemplo, entre as operadoras mais reclamadas, 12 estão com medida cautelar e sete operadoras de grande porte estão suspensas.

Em qual medida o rol de novos procedimentos que entra em vigor em 2014, incluindo coberturas como medicamentos para câncer, vai repercutir no índice de reajuste dos planos de saúde?
Vamos avaliar essas repercussões ao longo do ano de 2014, para compor o índice de aumento de 2015. O último rol teve um impacto próximo a 1%. O maior efeito virá da inclusão de medicamentos para o câncer, mas, em muitos casos, o que ocorrerá é a substituição de drogas venosas pelo medicamento oral, além da redução dos gastos com internações. Operadoras que já trabalham com os medicamentos estimam os gastos em reais por usuário/ano. O impacto não deve ser muito maior que o do último rol.

Qual o futuro dos planos individuais? Especialistas apontam que, após 2020, as mensalidades terão os preços insuportáveis para o consumidor, e a longevidade do brasileiro vai pesar nos custos da carteira.
O que preocupa o setor é a sustentabilidade, o alto custo da tecnologia e o pacto intergeracional. Em 2030, a população brasileira com mais de 60 anos vai duplicar e, em 2050, triplicar. No ano de 2023, triplicará, também, a população com mais de 80 anos. Nessa faixa etária, reduz-se a capacidade de pagamento do consumidor. Nesse caso, o que precisamos fazer é reforçar o modelo de assistência e de prevenção. Estamos aguardando que a Susep (Superintendência de Seguros Privados) autorize a oferta de um produto (VGBL) aos usuários de planos de saúde. Uma espécie de poupança que serviria para arcar com as mensalidades após os 60 anos. O que ainda está em estudo é o grau de isenção fiscal desse produto, que poderá ser portado pelo consumidor quando ele mudar de operadora.

Muitas operadoras já deixaram de comercializar planos individuais, que têm reajustes controlados pela ANS, priorizando os planos coletivos, com maior liberdade para aumento de preços. Já existe desabastecimento no mercado de planos individuais?
Não há desabastecimento. A ANS realizou um estudo sobre a oferta de planos individuais em todo o país e vai divulgá-lo em breve. O levantamento aponta para um equilíbrio. Nos últimos cinco anos, a população cresceu na ordem de 5,4% e os planos individuais, 9,3%. Cooperativas médicas ainda investem fortemente nesse produto. Quem deixou de comercializá-lo, em parte, foram algumas seguradoras, que têm um foco mais econômico (olham mais para os sinistros, ou total de uso dos convênios) e menos assistencial.