domingo, 11 de agosto de 2013

Ouro e liberdade econômica



N. do T.: Antes de virar presidente do Banco Central americano em 1987 e renunciar a todos os seus ideias, Alan Greenspan era um famoso objetivista seguidor das teorias de Ayn Rand.  Seu artigo a seguir, de 1966, é uma fantástica defesa do padrão-ouro, das mais completas e incitantes já escritas.  É realmente lamentável que, assim que cheguem ao poder, pessoas idealistas abdiquem de suas crenças, vendam-se ao status quo e se curvem às delícias do poder.  Como presidente do Fed, Greenspan fez exatamente o oposto do que sempre defendeu ao longo de sua vida em relação ao gerenciamento da oferta monetária de uma economia.  Tal abdicação de ideais custou aos EUA sua maior recessão desde a Grande Depressão.
Embora defenda um sistema bancário de reservas fracionárias, lastreado em ouro, o texto o faz com argumentações sólidas, e reconhece que tal sistema é propenso a ciclos econômicos, embora em menor escala e intensidade que o atual sistema.
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Esse artigo apareceu originalmente no panfleto O Objetivista, publicado em 1966, e reproduzido no livroCapitalism: The Unknown Ideal, de Ayn Rand

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Um antagonismo praticamente histérico em relação ao padrão-ouro é uma postura que une estatistas de todas as persuasões.  Eles parecem sentir — talvez ainda mais clara e sutilmente que muitos defensores consistentes do laissez-faire — que o ouro e a liberdade econômica são inseparáveis, que o padrão-ouro é um instrumento que fomenta o laissez-faire, e que um implica e requer o outro.
Para entender a fonte desse antagonismo, é necessário primeiro entender a função específica do ouro em uma sociedade livre.
O dinheiro é o denominador comum de todas as transações econômicas.  É a mercadoria que serve como meio de troca, que é universalmente aceitável por todos os participantes de uma economia como meio de pagamento por seus bens e serviços, e que pode, por conseguinte, ser utilizado como um padrão de mensuração de valor de mercado e como de reserva de valor — isto é, como meio de poupança.
A existência de tal mercadoria é uma pré-condição para uma economia baseada na divisão do trabalho.  Se os homens não possuíssem uma mercadoria de valor objetivo que fosse largamente aceita como dinheiro, eles teriam de recorrer a algum tipo primitivo de escambo ou serem forçados a viver em comunidades agrícolas auto-suficientes e, assim, privar-se das inestimáveis vantagens trazidas pela especialização.  Se os homens não tivessem meios para calcular o valor e guardá-lo — isto é, poupar —, então nem o planejamento de longo prazo e nem qualquer comercialização seriam possíveis.
Qual meio de troca será aceitável para todos os participantes de uma economia não é algo determinado arbitrariamente.  Em primeiro lugar, o meio de troca deve ser durável.  Em uma sociedade primitiva, em que a riqueza é escassa, o trigo pode ser suficientemente durável para servir como um meio de troca, dado que todas as trocas ocorreriam somente durante e imediatamente após a colheita, não deixando nenhum excedente para ser acumulado.  Porém, em economias nas quais considerações sobre reservas de valor são importantes — como ocorre em sociedades mais ricas e civilizadas —, o meio de troca deve ser uma mercadoria durável, geralmente um metal.
Um metal é escolhido geralmente porque é homogêneo e divisível: cada unidade é exatamente igual a todas as outras, e ele pode ser fundido, misturado e moldado em qualquer quantidade.  Jóias preciosas, por exemplo, não são nem homogêneas nem divisíveis.  Ainda mais importante, a mercadoria escolhida como meio de troca deve ser um bem de luxo.  O desejo humano por bens de luxo é ilimitado e, portanto, bens de luxo sempre serão demandados e sempre serão aceitos.  Trigo é um bem de luxo em civilizações subnutridas, mas não em uma sociedade próspera.  Cigarros normalmente não serviriam como dinheiro, porém assumiram essa função na Europa imediatamente após a Segunda Guerra Mundial, onde eles passaram a ser considerados um artigo de luxo.  O termo "bem de luxo" implica escassez e alto valor unitário.  Por ter um alto valor unitário, tal bem é facilmente portável; por exemplo, uma onça de ouro vale meia tonelada de ferro gusa.
Nos estágios iniciais de uma economia monetária em desenvolvimento, vários meios de troca podem ser utilizados, uma vez que uma ampla variedade de mercadorias poderia satisfazer as condições acima delineadas.  Entretanto, uma das mercadorias irá começar gradualmente substituir todas as outras, por ser mais amplamente aceita.  As preferências quanto à mercadoria que será utilizada como reserva de valor serão deslocadas para aquela que vem sendo mais amplamente aceita, algo que, por sua vez, irá torná-la ainda mais aceita.  Essa mudança será progressiva até o momento em que essa mercadoria finalmente se torna o único meio de troca.  O uso de um único meio de troca é altamente vantajoso pelo mesmo motivo que uma economia monetária é superior a uma economia de escambo: possibilita que as trocas ocorram em uma escala incalculavelmente mais ampla.
Se esse meio de troca será o ouro, a prata, conchas do mar, gado ou tabaco, é algo opcional e que irá depender do contexto e do estágio de desenvolvimento de uma dada economia.  Com efeito, todos esses bens já foram utilizados, em várias épocas, como meio de troca.  Mesmo no presente século, duas grandes commodities, ouro e prata, foram utilizadas como meio internacional de troca, com o ouro se tornando o meio predominante.  O ouro, por ter usos tanto artísticos quanto funcionais, e por ser relativamente escasso, possui vantagens significativas em relação a todos os outros meios de troca.  Desde o início da Primeira Guerra Mundial, ele passou a ser praticamente o único padrão internacional de troca.  Se todos os bens e serviços fossem pagos em ouro, o pagamento de altos valores seria difícil de ser realizado, e isso tenderia a limitar a amplitude da divisão do trabalho e da especialização de uma sociedade.[*]
Sendo assim, a extensão lógica da criação de um meio de troca é o desenvolvimento de um sistema bancário e de instrumentos de crédito (certificados de depósitos) que funcionam como substitutos do ouro — e que são plenamente conversíveis em ouro, é claro.
Um sistema bancário livre e baseado no ouro é capaz de expandir o crédito criando certificados de depósitos de acordo com as necessidades de produção da economia.  Os indivíduos que possuem ouro são induzidos, por meio do pagamento de juros oferecidos pelo sistema bancário, a depositar seu ouro em um banco (depósitos esses que podem ser sacados por meio de cheques).  Porém, dado que raramente todos os depositantes irão querer sacar todo o seu ouro do sistema bancário ao mesmo tempo, o banco poderá manter como reservas apenas uma fração de todo o ouro depositado.  Isso permitirá ao banco emprestar mais do que a quantidade total dos depósitos em ouro que possui (o que significa que ele criará títulos de ouro em quantidade maior do que o total de ouro que possui em suas reservas).  Porém, essa quantidade de empréstimos que ele pode criar não é arbitrária: ele terá de saber avaliar o quanto poderá conceder de empréstimos em relação às suas reservas e calibrar tudo de acordo com a condição e a qualidade de seus investimentos.
Quando os bancos emprestam dinheiro para financiar empreendimentos produtivos e lucrativos, os empréstimos são quitados rapidamente, e o crédito bancário continua amplamente disponível.  Porém, quando os empreendimentos financiados pelo crédito bancário são menos lucrativos e, consequentemente, mais demorados para serem quitados, os bancos logo descobrem que seus empréstimos pendentes estão em excesso em relação às suas reservas de ouro — e eles começam a restringir novos empréstimos, normalmente cobrando taxas de juros mais altas.  Isso tende a restringir o financiamento de novos empreendimentos, além de exigir dos atuais devedores que eles aprimorem sua lucratividade se quiserem obter mais crédito para expansões adicionais. 
Assim, sob o padrão-ouro, um sistema bancário livre torna-se o guardião da estabilidade econômica e do crescimento econômico equilibrado.  Quando o ouro passa a ser aceito como o meio de troca pela maioria das nações — ou mesmo por todas elas —, um padrão-ouro internacional, livre e desimpedido, passa a fomentar a divisão do trabalho em escala mundial, bem como o mais amplo comércio internacional possível.  Ainda que as unidades de troca (o dólar, a libra, o franco, o marco etc.) sejam diferentes de um país para o outro, quando todas elas são definidas em termos de ouro, as economias dos diferentes países tendem a agir como se fossem uma só — desde que não haja restrições no comércio ou nos movimentos de capital.  Crédito, taxas de juros e preços tendem a seguir padrões similares em todos os países. 
Por exemplo, se os bancos de um dado país expandem o crédito muito frouxamente, as taxas de juros daquele país tenderão a cair, induzindo seus correntistas a retirar dali seu ouro e enviá-lo para outros países cujos bancos paguem juros maiores sobre os depósitos.  Isso irá imediatamente causar uma escassez de reservas bancárias no país do "crédito frouxo", induzindo-o a readotar padrões mais rígidos de concessão de crédito e, com isso, retornando a taxas de juros maiores e mais competitivas.
Até hoje, um sistema bancário completamente livre e desimpedido, em conjunto com um padrão-ouro sólido, jamais foi implementado.  Porém, antes da Primeira Guerra Mundial, o sistema bancário dos EUA (e na maior parte do mundo) era baseado no ouro e, mesmo com os governos intervindo ocasionalmente, o sistema bancário era mais livre do que controlado.  Periodicamente, como resultado da rápida expansão do crédito, os bancos ficavam alavancados até o limite de suas reservas de ouro, o que levava a um acentuado aumento dos juros, fazendo com que novas concessões de crédito fossem canceladas e que a economia entrasse em uma profunda — porém bastante curta — recessão.  (Comparados às depressões de 1920 e 1932, os declínios econômicos anteriores à Primeira Guerra Mundial foram de fato bastante brandos).  Eram as limitadas reservas de ouro que impediam que as expansões desequilibradas da atividade econômica chegassem ao tipo desastroso a que nos acostumamos após a Primeira Guerra Mundial.  Os períodos de reajuste econômico eram curtos e as economias rapidamente restabeleciam fundamentos sólidos sobre os quais retomavam sua expansão.
Porém, esse processo de cura era erroneamente diagnosticado como sendo a doença: se a escassez de reservas bancárias estava causando declínios econômicos — argumentaram os intervencionistas —, então por que não encontrar um modo de ofertar reservas crescentes aos bancos, de modo que estes não mais precisassem se preocupar com a quantidade delas?  Se os bancos puderem continuar emprestando dinheiro indefinidamente — alegaram —, então nunca mais teremos declínios econômicos.  E, assim, criou-se o Federal Reserve (o Banco Central americano) em 1913.  Ele é formado por doze sucursais regionais que nominalmente são geridas privadamente, mas que, na verdade, são garantidas, controladas e mantidas pelo governo.  O crédito expandido pelo Fed é na prática (embora não legalmente) lastreado pelo poder de tributação do governo federal.  Tecnicamente, ainda estávamos no padrão-ouro; os indivíduos ainda tinham a liberdade de portar ouro [liberdade essa abolida em 1933 por Roosevelt e só restaurada em 1975], e o ouro continuava sendo utilizado como reservas bancárias.  Hoje, porém, o crédito expandido pelo Banco Central (que cria reservas bancárias formadas meramente por dinheiro de papel) passou a servir como moeda de curso forçado utilizada para pagar os correntistas.
Quando a economia americana passou por uma suave contração em 1927, o Fed criou mais reservas bancárias de papel na esperança de evitar qualquer possível escassez de reservas bancárias.  Ainda mais desastrosa, entretanto, foi a tentativa do Fed de ajudar a Grã-Bretanha, cujo ouro estava fugindo para os EUA em decorrência da recusa do Banco Central da Inglaterra em permitir que os juros subissem quando as forças de mercado assim exigiam (tal medida era politicamente inaceitável).  O raciocínio das autoridades envolvidas era o seguinte: se o Fed injetasse quantias excessivas de dinheiro de papel nas reservas dos bancos americanos, as taxas de juros nos EUA cairiam para níveis comparáveis àqueles vigentes na Grã-Bretanha.  Isso ajudaria a interromper a atual fuga de ouro da Grã-Bretanha para os EUA, impedindo assim o embaraço político de o Banco Central da Inglaterra ter de elevar os juros. 
O Fed obteve êxito; ele interrompeu a fuga de ouro da Inglaterra, porém quase destruiu a economia mundial nesse processo.  O excesso de crédito que o Fed injetou na economia foi parar na bolsa de valores — desencadeando um fantástico frenesi especulativo.  Com muito atraso, os burocratas do Fed resolveram enxugar esse excesso de reservas por eles criado.  Ao fazerem isso, o boom da bolsa de valores foi interrompido.  Mas era tarde demais: já em 1929, os desequilíbrios especulativos haviam se tornado tão estupefacientes, que essa tentativa de enxugamento monetário gerou uma forte redução e uma consequente degradação da confiança na economia. Como resultado, a economia americana entrou em colapso.  A Grã-Bretanha saiu-se ainda pior: ao invés de absorver e lidar com as consequências de sua insensatez, ela simplesmente abandonou por completo o padrão-ouro em 1931, destruindo o que restava da confiança no sistema e gerando uma série de falências bancárias em escala mundial. 
As economias de todo o mundo mergulharam na Grande Depressão da década de 1930.
Seguindo a lógica reminiscente da geração anterior, os estatistas argumentaram que o padrão-ouro era primariamente o culpado pela débâcle do crédito que levou à Grande Depressão.  Caso não houvesse o padrão-ouro, argumentaram eles, a recusa da Grã-Bretanha em honrar seus compromissos em ouro, em 1931, não teria provocado a quebra dos bancos ao redor do mundo.  (A ironia é que, desde 1913, o mundo não estava mais no padrão-ouro clássico, mas sim naquilo que passou a ser chamado de "padrão-ouro misto"; ainda assim, foi o ouro quem recebeu toda a culpa).  Porém, a oposição ao padrão-ouro sob qualquer arranjo — oposição essa oriunda de um número crescente de defensores do estado assistencialista — foi estimulada por um critério muito mais sutil: a compreensão de que o padrão-ouro é incompatível com déficits orçamentários crônicos (a marca distintiva do estado assistencialista).  Despido de seu jargão acadêmico, o estado assistencialista nada mais é do que um mecanismo por meio do qual os governos confiscam a riqueza dos membros produtivos da sociedade para financiar uma ampla variedade de esquemas assistencialistas.  Uma parte substancial desse confisco é efetuada por meio da tributação.  Porém, os estatistas defensores do assistencialismo rapidamente perceberam que, se quisessem manter seu poder político, a quantia tributada teria de ser limitada, pois os impostos não podem subirad eternum.  Logo, restava-lhes a opção de recorrer aos maciços déficits orçamentários — isto é, eles teriam que gastar mais do que arrecadavam, tendo de cobrir essa diferença com empréstimos, emitindo títulos do governo para financiar os gastos assistencialistas em larga escala.
Sob um padrão-ouro, a quantidade de crédito que uma economia pode sustentar é determinada pelos ativos tangíveis dessa economia, dado que cada instrumento de crédito é, em última instância, um título lastreado por algum ativo tangível.  Porém, sob o padrão-ouro, os títulos do governo não são lastreados por riqueza tangível, mas somente pela promessa de que o governo irá quitá-los por meio de futuras receitas tributárias.  Isso faz com que tais títulos tenham mais dificuldades de ser aceitos pelo mercado financeiro.  Um grande volume de títulos do governo pode ser vendido ao público somente a juros progressivamente maiores.  Assim, os déficits orçamentários do governo sob um padrão-ouro tornam-se severamente limitados.
A abolição do padrão-ouro possibilitou aos estatistas defensores do assistencialismo utilizar o sistema bancário como meio de expandir ilimitadamente o crédito.  Por meio da compra de títulos públicos em posse dos bancos, o Banco Central aumenta as reservas bancárias dos bancos, as quais são inteiramente formadas por dinheiro de papel.  Os bancos passam a ter mais dinheiro em suas reservas, as quais tornam-se "lastreadas" por esses títulos públicos, que passam a ser tratados como se fossem ativos tangíveis e substitutos perfeitos do ouro.  Nesse processo, o indivíduo que está em posse de algum título público ou que possua depósitos bancários acredita que possui um título genuinamente lastreado por algum ativo real.  Mas o fato é que agora não existem mais ativos reais.
Como a lei da oferta e da demanda não pode ser abolida, à medida que a oferta de dinheiro aumenta em relação aos bens existentes na economia, os preços também terão de subir.  Consequentemente, toda a renda que foi poupada pelos membros produtivos da sociedade perde valor em termos de poder de compra.
Quando se contabiliza tudo, o indivíduo descobre que essa perda representa os bens que foram adquiridos pelo governo, para fins assistencialistas ou outros quaisquer, com o dinheiro criado pelo Banco Central para comprar títulos públicos que estavam em posse do sistema bancário — dinheiro esse que, após sua criação, foi utilizado para financiar a expansão tanto do crédito bancário quanto da dívida pública (compra de títulos emitidos pelo Tesouro).
Na ausência do padrão-ouro, não há como o indivíduo proteger sua poupança do confisco que ocorre por meio da inflação.  Não existe mais uma reserva de valor confiável.  Se existisse, o governo torná-la-ia ilegal, assim como fez com o ouro.  Se todos os cidadãos decidissem, por exemplo, converter seus depósitos bancários em prata ou cobre ou em qualquer outro bem, e em seguida se recusassem a aceitar cheques como forma de pagamento por seus bens, os depósitos bancários (formados por dinheiro de papel) perderiam todo o seu poder de compra, e a expansão do crédito bancário fomentada pelo governo passaria a ter valor zero.  A política financeira do estado assistencialista requer que não haja maneiras com que os proprietários de riqueza possam se proteger.
Eis aí o prosaico segredo por trás das investivas dos estatistas assistencialistas contra o ouro.  Os déficits orçamentários do governo são simplesmente um esquema por meio do qual se confisca a riqueza dos membros produtivos da sociedade.  O ouro impede que esse insidioso processo aconteça.  O ouro é um protetor dos direitos de propriedade.  Quando se compreende isso, não há mais dificuldades para se entender o ódio dos estatistas ao padrão-ouro.
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[*] N. do T.: na época em que esse artigo foi escrito, a onça do ouro valia apenas US$ 35 dólares, o que de fato dificultava grandes transações.  Porém, hoje, devido a toda inflação monetária que ocorreu desde aquela época, a situação se inverteu: com a onça do ouro agora valendo US$ 1.400, o problema passou a ser o pagamento de pequenos valores — função essa que a prata poderia assumir sem problemas.

Alan Greenspan nascido em 1926, é economista e foi presidente do Federal Reserve System, o Banco Central americano, de 1987 a 2006.

Tradução de Leandro Roque

A diferença entre genuínos capitalistas e progressistas



riqueza.jpgA visão que os progressistas têm do governo é facilmente entendida e faz todo o sentido quando você finalmente entende como eles pensam, quais são os equívocos de suas ideias e quais são as pressuposições implícitas que elas têm a respeito da origem da renda. 
A visão dos progressistas ajuda a explicar as políticas que eles apóiam, tais como a redistribuição de renda, e a linguagem que eles utilizam, como suas inflamadas exortações para que os ricos "deem algo de volta" para a sociedade.
Em termos gerais, os progressistas entendem a economia de uma das duas maneiras a seguir:
1) Eles supõem que a verdadeira fonte de renda das pessoas é uma gigantesca pilha de dinheiro que, em teoria, deveria ser distribuída igualmente entre todas as pessoas da sociedade.  O motivo de algumas pessoas terem mais dinheiro que outras é simplesmente porque elas chegaram a essa pilha primeiro e gananciosamente pegaram uma fatia injustamente grande para elas.  Sendo esse o caso, a justiça requer que os ricos deem algo de volta; e se eles não fizerem isso voluntariamente, o governo deve confiscar seus ganhos ilicitamente adquiridos e restituí-los aos seus donos de direito.
2) A outra visão progressista, concorrente a essa, pressupõe que toda a renda é distribuída, como em uma política de distribuição de renda.  É como se houvesse um distribuidor de dinheiro.  O motivo de algumas pessoas terem mais dinheiro do que outras é porque o distribuidor de dinheiro é racista, machista, conservador ou um representante dos "grandes interesses do capital".  Nesse caso, a única coisa certa a ser feita com aqueles para quem o distribuidor de dinheiro injustamente deu muito dinheiro é obrigá-los a devolver a fatia ilícita de seus ganhos.  Se eles se recusarem a fazer isso voluntariamente, então é função do governo desencadear a fúria daReceita Federal sobre estes insensíveis, confiscando seus ganhos ilícitos para restituí-los aos seus donos de direito.  Em suma, deve haver uma redistribuição do dinheiro na sociedade — ou aquilo popularmente conhecido como 'redistribuição de renda'.
Já os sensatos e racionais reconhecem que, em uma sociedade livre, a renda não é nem confiscada nem redistribuída; em sua grande maioria, ela é obtida por meio do trabalho.  A renda é ganha quando um indivíduo satisfaz seus semelhantes.  Quanto maior a capacidade e aptidão de satisfazer seus semelhantes, maior a fatia de riqueza que este indivíduo pode adquirir deles.  Essa fatia de riqueza é representada pela quantidade de dinheiro que ele recebe de seus semelhantes.
Digamos que eu me ofereça para lavar o seu carro.  Por ter feito isso de maneira competente, você me paga $20.  Ato contínuo, eu vou a uma mercearia e peço "Dê-me 1kg de carne e seis latas de cerveja que meus semelhantes produziram".  Com efeito, o vendedor vai me perguntar, "Williams, você está pedindo aos seus semelhantes para que eles lhe sirvam.  Você por acaso os serviu também?" E eu respondo, "Sim."  E o vendedor emendará "Então prove!"
Nesse momento vou mostrar os $20 que obtive por ter servido meu semelhante.  Podemos pensar nesses $20 como "certificados de performance".  Eles representam a prova de que eu prestei serviços ao meu semelhante.  O raciocínio em absolutamente nada mudaria caso eu fosse, por exemplo, um ortopedista com uma enorme clientela, ganhando $500.000 por ano por ter prestado serviços aos meus semelhantes.  Ademais, tendo eu já lavado o carro do meu semelhante ou já curado sua fíbula fraturada, o que mais eu devo a ele ou a qualquer outra pessoa?  Qual a justificativa de eu ser obrigado a distribuir meus ganhos para terceiros?  Agora, se alguém quiser ser caridoso, isso é outro assunto, totalmente distinto.
Compare a moralidade de ter de servir o seu semelhante para poder ganhar uma fatia daquilo que ele produz com a (i)moralidade de receber dinheiro redistribuído pelo governo (seja via assistencialismo, funcionalismo público, ou grandes empresários que trabalham que recebem subsídios do governo).  O que ocorre é que o governo simplesmente diz a esse povo: "Você não precisa servir o seu semelhante para adquirir uma fatia de tudo o que ele produz.  Nós vamos confiscar parte do que ele produz e dar tudo para você.  Apenas vote em mim".
Afinal, quem deveria devolver parte do que ganhou?  Pense em Bill Gates, que fundou a Microsoft, ou em Steve Jobs, que fundou a Apple Computer, ou em Sam Walton, que fundou a Wal-Mart.  Qual desses bilionários adquiriu sua riqueza nos obrigando a comprar seus produtos?  Qual deles confiscou a propriedade de terceiros?
Cada um desses três — e milhares de outros — é um indivíduo que enriqueceu prestando serviços aos seus semelhantes, criando produtos que tornaram a vida melhor e mais fácil.  O que mais eles devem?  Para quem eles devem?  Eles já deram e "redistribuíram" a sua fatia.
Compare-os agora aos homens do governo.  Compare os bens e serviços que cada um produziu e compare a maneira como eles enriqueceram.  É justo?
Logo, se há alguém que realmente tem a obrigação de devolver algo para a sociedade, estes são os ladrões e receptadores do roubo legalizado — a saber, as pessoas que utilizam o governo, inclusive vários magnatas que recebem subsídios corporativos, para viver à custa de seus semelhantes. 
Quando um país vilipendia os produtivos e transforma em mascotes os improdutivos, seu futuro está condenado. 

Walter Williams é professor honorário de economia da George Mason University e autor de sete livros.  Suas colunas semanais são publicadas em mais de 140 jornais americanos.

Tradução de Leandro Roque

A redescoberta do capitalismo



Direito.jpgNo fim do mês passado vimos, em São Paulo, a marcha da maconha reprimida pelas autoridades.  Por mais que o tema das drogas seja relevante, não é dele que quero falar, e sim da curiosa aliança que ocorreu nessa manifestação, entre esquerdistas e liberais; ou melhor, do que ela pode nos ensinar. Apesar das imensas divergências políticas, econômicas, morais, talvez até metafísicas, ambos os lados concordavam que um sujeito tem o direito de fazer uso pessoal de uma substância sem que o estado se intrometa.  Em outras palavras, e talvez isso choque alguns manifestantes, a marcha da maconha era uma marcha pela propriedade privada.
Passemos para o campus da USP, de onde, suponho, sai muito do suporte à descriminalização das drogas.  Um belo dia alguns meses atrás, depois de um debate na faculdade de História, um estudante veio me vender um jornalzinho socialista por ele editado.  Embora recusasse o produto, lancei a provocação amistosa: "O que você está fazendo é livre mercado! Imagine um mundo em que fosse proibido criar o próprio jornal e vendê-lo"; ao que ele respondeu que concordava, e que na URSS isso era permitido (antes de Stalin).  Não entro no mérito histórico; basta-me que até um aguerrido socialista filo-soviético defenda o princípio básico do livre mercado no nível micro, da produção e venda.  Por que será, então, que o mesmo princípio seja rejeitado quando se pensa no macro?
O princípio que está em jogo é a transação voluntária, mutuamente benéfica; pessoas se ajudando de forma que todas vivam melhor.  Não é preciso ser liberal, libertário ou economista austríaco para se ver o bem intrínseco disso.  Infelizmente, por algum motivo que desconheço, o capitalismo se desvinculou, nas mentes das pessoas, desse princípio fundamental.  Defende-se o capitalismo porque ele é mais eficiente, porque aumenta o PIB, porque faz as ações subirem, porque gera mais impostos, porque o homem é egoísta mesmo e nada podemos fazer, etc., indo do entediante ao detestável sem tocar no essencial.
Quando se quer ver como o capitalismo funciona na prática, as primeiras imagens que vêem à mente são o mundo empresarial e o mercado financeiro.  Considero esta uma das piores crias intelectuais do marxismo: a idéia de que o livre mercado seria do interesse de grandes empresários e banqueiros, enquanto que proletários explorados, desempregados e meninos órfãos são naturalmente socialistas.  O mesmo termo, "capitalista", designa tanto o defensor do capitalismo quanto o detentor de capital, e os dois são facilmente confundidos na imaginação popular.
O fato, contudo, é que empresários e banqueiros costumam defender o intervencionismo estatal.  Uma evidência: a partir do ano que vem sacolas plásticas serão proibidas em São Paulo.  Os grandes supermercados já estão se adiantando à nova lei e achando ótimo contribuir para a sustentabilidade.  Já os mercadinhos de bairro, para os quais o gasto a mais com sacolas de papel será sentido (ou que terão que pedir a seus consumidores que tragam sacolas de pano, tornando-se ainda menos práticos do que as grandes redes), a vida ficará ainda mais difícil.  No balanço geral, as regulamentações impostas pelo governo não são nocivas às grandes empresas, pois as protege da concorrência das pequenas, impedidas de existir.  Você acha que as filiais das grandes lanchonetes reclamaram da proibição da venda de alimentos em automóveis?  Enfim, no mundo do grande capital o capitalismo está moribundo.  O mercado formal é espremido por regulamentações e sugado pelos impostos.  Para encontrar o mercado saudável precisamos procurar em lugares improváveis: na economia informal e no terceiro setor.
O capitalismo sobrevive nas camadas mais baixas, nas favelas, nas transações pequenas o bastante para fugir ao radar do estado, e as quais não valeria a pena controlar.  Quando o estado aparece, é na forma de fiscais facilmente subornáveis, que viram parte do ecossistema.  Camelôs, cozinheiras, bares, cabeleireiros, lojas de roupa, escolas privadas, cinemas caseiros, lan houses — tudo operando informalmente.
Stewart Brand não é um economista libertário.  Suas causas são o ambientalismo e o fim da pobreza.  Sua fala no TED dá uma boa idéia do que é a vida nas favelas ao redor do mundo: não são campos de refugiados onde famintos aguardam de mãos estendidas (a bem da verdade, nem mesmo os campos de refugiados são assim); são gente vivendo, produzindo, construindo e trocando. "These are not people crushed by poverty; these are people busy getting out of poverty" (~ 4:30 min.)  Não se trata de pessoas esmagadas pela pobreza; e sim de pessoas ocupadas em sair da pobreza, como prova a economia vibrante das favelas.
Não é por isso que deixaremos de querer ajudar os mais necessitados.  Ajudar os pobres a enriquecer é um dos grandes méritos do capitalismo; e é por isso que os ensinamentos do mercado estão sendo emulados até pelo terceiro setor.  O paradigma do terceiro setor era, e em muitos casos ainda é, o assistencialismo estatal.  Não que as ONGs e demais iniciativas filantrópicas tradicionais sejam financiadas pelo estado (embora, infelizmente, muitas o sejam); é que a visão delas é a dos pobres como seres inertes, dependentes de caridade para sobreviver.  É essa a visão que todo político alimenta e da qual dependem sua influência e poder.  Felizmente, uma nova concepção do papel do terceiro setor vem substituindo a antiga: saem as filantropias e entra o negócio social.
O negócio social é uma empresa que gera benefícios sociais em sua operação.  Como qualquer empresa, ela tem que lucrar para sobreviver.  O criador do conceito, Muhammad Yunus, defende que o negócio social não emita lucro aos investidores; ou seja, que todo ele seja reinvestido.  Deixemos esse purismo anticapitalista de lado, mesmo porque na prática a imensa maioria dos empreendedores de negócios sociais emite lucros para si (não dá para se dedicar full-time a um empreendimento não-remunerativo).
O grande insight do negócio social, e o que o torna tão promissor, é a percepção clara de que a transação mutuamente benéfica é a resposta para a pobreza; e que todo homem, mesmo o mais pobre, tem algo de bom a oferecer.  É a essência do capitalismo sem que ninguém saiba (ainda bem!) que se trata de capitalismo.  Os chamados negócios sociais são, basicamente, negócios convencionais que conseguem manifestar aquilo que os faz lucrar: prestar um serviço valioso à comunidade.  E ao fazer isso eles ganham a legitimidade moral para fazer coisas que, nos negócios tradicionais, seriam vistas como exploração ou ganância e rapidamente regulamentadas e taxadas, destruindo a espontaneidade e a variedade que tornam o setor tão atrativo.  Vou dar alguns exemplos do setor bancário.
"Tempo para os outros. Tempo para si."  Uma formulação eloquente do princípio básico do mercado.  Esse slogan é do Banco de Tempo, um banco português em que as pessoas não depositam dinheiro, mas horas de serviço. Uma costureira remenda roupas de sua vizinha por duas horas.  Ela ganha, então, duas horas de serviços a serem prestados por outros membros do banco; digamos, um mecânico que consertará seu carro.  É fácil perceber que horas de trabalho são um meio de troca um tanto imperfeito (quem disse que o valor de algo é medido pelo tempo gasto?).  Mas o mero fato de operar com uma moeda alternativa faz com que seja visto como um banco solidário e benevolente, ao contrário dos bancos maus e egoístas do capitalismo selvagem.  Escapa, numa tacada só, da condenação social e do controle do estado.  Os participantes sentem-se realizados de ajudar os outras e serem, por sua vez, ajudados de volta.  Consideram talvez que o Banco do Tempo seja uma alternativa ao capitalismo, quando na verdade ele é o capitalismo em ação.
Podemos ir mais longe.  Todos conhecem a idéia de microcrédito (do mesmo Muhammad Yunus que pensou o negócio social).  É como o crédito convencional, mas com uma aura de serviço social por emprestar pequenos valores a empreendedores muito pobres.  Observe que, ao contrário da esmola, o empréstimo (com juros) trata o receptor não como um pobre coitado, mas como alguém capaz de fazer algo de sua vida se lhe for dada a oportunidade.  Há, em operação, redes de microcrédito que unem pessoas ao redor do mundo que emprestam pequenas quantias e depois recebem seu dinheiro de volta com juros.  O terceiro setor aderiu à idéia de que é legítimo e justo que quem deu também receba.  O sistema bancário tradicional, e o mercado formal como um todo, perderam a idéia de que o lucro possa ser legitimado moralmente.  É hora de recuperá-la.
Remova da defesa do capitalismo o verniz de egoísmo, a fixação com o mercado financeiro, a dicotomia governo x grandes empresas (que é em parte verdadeira, mas esconde a igualmente verdadeira simbiose entre os dois), e o resultado será algo que não é, ou não deveria ser, exclusividade de tecnocratas sem coração.
Numa reportagem recente da The Economist ("Market of ideas", edição de 09 de abril de 2011), mostra-se que a popularidade do livre mercado tem caído.  O Brasil aparece perto do topo na defesa do livre mercado, com 68% (em primeiro está a Alemanha com 69%).  Os EUA, outrora os primeiros, caíram para 59%; entre os americanos pobres, o apoio foi de 76% para 44%.  Doug Miller, presidente da empresa que fez a pesquisa, conclui que as empresas americanas estão perdendo seu "contrato social" com as famílias.  Sua frase diz tudo: as empresas, coletivamente, são vistas como uma entidade separada das famílias. 
Capitalismo são as grandes empresas que trazem serviços e oferecem emprego para nós, num processo nefasto de exploração e competição na lei da selva, que deveria ao menos gerar bons resultados.  Enquanto essa imagem falsa durar, o capitalismo só ficará mais impopular.  É preciso resgatar o fundamental: capitalismo é garantir a possibilidade de que produzamos e trabalhemos, livremente, uns para os outros.  Poucos são maus o suficiente para ser contra um sistema assim; muitos, no entanto, não o vêem nas defesas convencionais que se fazem do livre mercado.  Cabe a nós mudar essa percepção.
Joel Pinheiro da Fonseca é mestrando em filosofia, editor da revista Dicta&Contradicta e escreve no blog Ad Hominem.


A história de amor de Ludwig e Margit von Mises



2875.jpgFoi em 1925 que Ludwig von Mises, já com 43 anos de idade, finalmente encontrou a mulher que viria a se tornar sua esposa.
Margit Serény estava entre os seis convidados de um jantar oferecido por Fritz Kaufmann, um jovem advogado e frequentador dos seminários privados de economia lecionados por Mises em Viena.  É praticamente um milagre que Mises tenha conquistado o coração da senhora que havia se sentado ao lado dele, pois ele passou a maior parte do jantar discutindo economia.  Por outro lado, a preocupação de Mises deu a ela a oportunidade de observá-lo atentamente.  Eis como ela o percebeu:
O que me impressionou foram seus belos olhos azuis e claros, sempre concentrados na pessoa com quem ele falava, jamais se desviando para outra direção.  Seus cabelos escuros, já um tanto agrisalhados nas têmporas, estavam repartidos ao meio, nenhum fio fora do lugar.  Gostei de suas mãos, com dedos longos e magros, os quais claramente demonstravam que ele não os utilizava para trabalhos braçais.  Ele estava vestido com muita elegância.  Um terno escuro feito sob medida, uma gravata de seda bem ajustada.  Sua postura indicava que ele já havia sido um oficial do exército.[1]
Ele conversou com ela após o jantar, e então ambos foram para uma discoteca.  Aparentemente, Mises era um mau dançarino — pelo menos para os padrões de Margit —, o que fez com que eles passassem praticamente toda a noite conversando.  Na realidade, foi ela quem falou quase o tempo todo, e ele apenas escutava atentamente.  Margit era uma mulher atraente, de 1,63m, com cabelos castanhos e olhos cinza-azulados.  Enquanto eles conversavam, Mises descobriu que ela era também uma mulher espirituosa e cordial.  Ele provavelmente se apaixonou por ela naquela noite.  No dia seguinte, ele lhe mandou rosas e convidou-a para jantar.  Foi o primeiro de muitos jantares que ocorreriam nos dois anos seguintes.
Margit Seerény era uma atriz vinda de uma família burguesa de Hamburgo.  Durante a Primeira Guerra Mundial, ela havia atuado em um dos principais teatros de Viena, o Deutsche Volkstheater.  Quando Mises a conheceu, ela tinha trinta e cinco anos de idade e era uma viúva muito atraente, já com dois filhos, Guido e Gitta.  Pouco tempo após sua chegada a Viena, em 1917, ela se casou com Ferdinand Serény, um aristocrata húngaro que morreu em 1923, deixando-lhe como herança ativos que já haviam perdido quase todo o seu valor por causa da hiperinflação da época.
Como de praxe, Mises era cauteloso até mesmo quando seus sentimentos ameaçavam subjugá-lo.  Poderia ele confiar em uma atriz?  Como Margit afirmara mais tarde, a maioria das pessoas das classes mais altas considerava que atrizes eram nada mais do que garotas de programa de luxo.  Ludwig parecia também compartilhar desse preconceito.  De qualquer forma, ele tomou precauções.  Como viria a confessar à sua esposa mais tarde, ele pesquisou algumas das declarações dela a respeito de sua evolução profissional nos arquivos da Neue Freie Presse.[2]  Ele provavelmente também conversou com seu próprio primo, Rudolf Strisower, que havia sido o médico de Ferdinand Serény.  Essas investigações confirmaram a versão de Margit.
Porém, havia obstáculos mais fundamentais a atrapalhar o progresso desse romance.  De um lado, a mãe de Ludwig, Adele, tinha muitas reservas em relação a Margit.  Na verdade, nenhuma de suas namoradas jamais havia obtido a aprovação de sua mãe.  Ela provavelmente havia imaginado uma esposa mais distinta para seu amado filho, e sua opinião tinha muita importância para Ludwig, principalmente dado que ele próprio nutria determinadas visões filosóficas que invariavelmente o dissuadiam da ideia de casamento.  Essas visões diziam respeito à natureza do casamento e à possibilidade de ser tanto um marido quanto um estudioso.  Um trecho completamente não romântico de seu livro Socialism explica tudo:
Como uma instituição social, o casamento é um ajuste do indivíduo à ordem social, na qual uma determinada área de atividade, com todas as suas tarefas e exigências, é atribuída a ele.  Personalidades excepcionais, cujas habilidades as colocam muito acima dos homens comuns, não conseguem tolerar a coerção exigida por tal ajustamento à maneira de vida das massas.  O homem que sente dentro de si próprio a urgência e a necessidade de alcançar grandes feitos, que está preparado para sacrificar sua vida ao invés de ser falso em sua missão, não irá reprimir seu desejo e sua ânsia em prol de uma esposa e filhos.  Na vida de um gênio, por mais amorosa que seja, a mulher ocupa apenas um pequeno espaço.  Não se está falando aqui daqueles grandes homens para quem o sexo foi completamente sublimado e direcionado para outros canais — Kant, por exemplo —, ou daqueles cujo espírito ardente, insaciáveis na busca do amor, não conseguem se sujeitar aos inevitáveis desapontamentos da vida matrimonial e, por isso, precipitam-se com vigoroso ímpeto de uma paixão para outra.  Mesmo o homem genial cuja vida matrimonial parece seguir um caminho normal, cuja atitude em relação ao sexo não se difere daquela de outras pessoas, não consegue se sentir, no longo prazo, envolvido pelo casamento sem se sentir violado em si próprio.  Gênios não se permitem ser obstruídos por qualquer consideração em relação ao conforto de seus semelhantes, mesmo aqueles mais próximos.  Os laços do casamento se tornam amarras intoleráveis que o gênio tenta arrebentar ou ao menos afrouxar para que ele posse se sentir mais livre.  Um casal deve sempre andar lado a lado dentre os membros comuns da humanidade.  Quem quiser seguir seu próprio caminho terá de se apartar desse arranjo.  Raramente terá ele a felicidade de encontrar uma mulher disposta e capaz de seguir junto a ele nesse caminho solitário.[3]
Essa passagem sobreviveu a todas as edições do livro.  Ludwig foi lento em permitir que Margit adentrasse sua até então solitária caminhada.  Mas, por outro lado, ele estava ansioso pelo amor de uma genuína companheira.
Na Viena dos anos 1920, o principal bastião do estatismo era o partido socialista comandado por Otto Bauer, e um de seus métodos favoritos de "persuasão" política era a explícita ameaça de fazer uma violenta insurreição.  Porém, em 1927, o credibilidade dessas ameaças sofreu um sério revés quando houve um confronto entre os socialistas e a polícia de Viena.
O evento ocorreu após uma questionável decisão judicial que, na visão dos socialistas, havia sido tendenciosamente favorável à direita política.  Ato contínuo, os socialistas conclamaram uma greve geral e manifestações na sexta-feira, 15 de julho de 1927.  Para o governo, esta foi uma sutil tentativa de derrubá-lo.  Quando a multidão se reuniu em frente ao palácio sede do ministério de justiça, alguém incendiou o prédio e a polícia entrou em cena imediatamente.  Na carnificina que se seguiu, noventa manifestantes foram mortos antes mesmo de o exército chegar.  Mises comentou o episódio em uma carta enviada a um ex-aluno em Paris:
A tentativa de golpe de sexta-feira limpou a atmosfera como uma tempestade elétrica.  O partido social-democrata utilizou todos os meios de poder e ainda assim perdeu o jogo.  O confronto de rua terminou em uma completa vitória da polícia.... Todas as tropas são leais ao governo.
A greve geral entrou em colapso e os líderes dos social-democratas tiveram então de cancelá-la.
As ameaças com as quais o partido social-democrata vinha permanentemente tentando intimidar o governo e o público se comprovaram muito menos perigosas do que se imaginava.[4]
O fracasso da greve geral e o subsequente massacre também trouxeram um inesperado impacto pessoal na vida de Mises.
Ele havia se surpreendido e se deleitado com o fracasso da greve geral, mas o que não o surpreendeu foi o massacre que ocorreu quando as massas se agruparam nas ruas de Viena.  Uma de suas primeiras providências foi alertar Margit Serény do perigo.  Sob nenhuma circunstância ela deveria deixar as crianças saírem de casa.  Entretanto, como Margit ficasse fora de casa durante o dia, Mises deixou instruções detalhadas para a governanta.[5]
Quando Margit retornou para casa no final daquela tarde, ela ficou profundamente emocionada ao constatar o quanto Mises se importava com ela e com seus filhos.  Ela o tinha em grande estima, mas de modo algum havia retribuído toda a atenção que ele lhe dedicou durante os dois anos passados desde que eles haviam se conhecido pela primeira vez no apartamento de Kaufmann.  Rosas vermelhas e perfumes caros não podiam conquistar seu coração.  Ela simplesmente não conseguia entender aquele homem:
Nos primeiros anos de nosso relacionamento, Lu era praticamente um enigma para mim.  Eu nunca havia visto tanta modéstia em um homem antes.  Ele sabia de seus valores, mas jamais se gabava deles. ... Acho que foi a extrema honestidade nos sentimentos de Lu que me atraiu tão fortemente para ele.  Esses sentimentos eram tão irresistíveis e esmagadores, que ele, que já escrevera milhares de páginas sobre economia e dinheiro, não conseguia encontrar palavras para falar sobre si próprio, e explicar seus sentimentos.[6]
Felizmente, algumas vezes os gestos falam por si próprios.  Naquele dia de julho de 1927, pela primeira vez, Margit sentiu por ele algo como amor, e tornou-se cada vez mais aberta e receptiva às suas investidas.  Era o início de um crescimento intenso na amizade entre os dois, algo que menos de dois meses mais tarde acabaria estrondosamente. 
Naquela noite, Mises visitou Margit para ver se tudo estava em ordem.  Como as linhas telefônicas estavam inoperantes, ele não havia conseguido ligar para ela.  Ele então levou-a para uma caminhada na Ringstrasse, onde os acontecimentos tumultuados daquele dia ainda podiam ser sentidos: havia apenas homens nas ruas; ela não viu nenhuma outra mulher.  No fim de seu passeio, ele convidou-a para irem dançar.  Quando ela disse sim, ele sabia que tal resposta indicava um progresso.  
Alguns dias depois, ele pegou na mão dela pela primeira vez, em um clube noturno, e na semana seguinte, ele a beijou pela primeira vez em um canto escuro do Prater, o parque central de Viena — como se fossem um casal de adolescentes colegiais, como ela lembraria mais tarde.  Alguns dias depois, quando ela teve de viajar para Hamburgo, Mises lhe disse que iria pedi-la em casamento, mas que ele antes ainda tinha de lidar com a ideia de ser o padrasto dos filhos dela.  Eles se despediram com planos de se reencontrar em Berchtesgaden, uma cidade de veraneio nos Alpes da Bavária, no final de agosto.  
No dia 25 de agosto, ela tomou o trem de Munique para Berchtesgaden e foi alegremente surpreendida ao ver Mises repentinamente entrando no trem em uma das estações intermediárias.  Eles se hospedaram em um hotel em Berchtesgaden, em quartos adjacentes.  Preocupado com as aparências, Mises apresentou Margit como sua irmã.  A estória era boa o suficiente para manter as aparências, e Ludwig e Margit usufruíram um maravilhoso período de treinamento para o casamento, como ele viria a dizer mais tarde.  Eles conversaram sobre os problemas que a potencial união de ambos teria de enfrentar: ela não poderia satisfazer o desejo dele de terem um filho; ela teria de se tornar judia novamente para saciar a vontade da mãe dele; esta teria de ser mantida fora de todos os preparativos para o casamento, pois ela poderia comprometer tudo, como já havia feito em uma outra ocasião.[7]
No domingo, 4 de setembro, ambos retornaram a Viena, onde houve uma reviravolta fatídica.  Mises havia adoecido sem ter notado.  Ele a encontrou para jantarem na terça-feira seguinte, e na quarta-feira se encontraram de novo, com Mises tremendo de febre e com uma fortíssima dor de cabeça.  Dadas essas circunstâncias, ele compreensivelmente não quis falar sobre casamento.  Ele teria de estar com a mente bem clara para fazer a mais importante declaração de sua vida.  Entretanto, Margit sentia que já estava esperando há muito tempo e estava ficando cada vez mais impaciente.  Ela então lhe disse que não esperaria mais um só dia e o pressionou a tomar uma decisão.  Mais tarde, Mises mandou-lhe uma carta com os seguintes dizeres:
"Hoje ou nunca!  Não permitirei que você adie a decisão nem por mais algumas horas."  Nenhuma mulher amorosa fala desta forma.  Uma única palavra afetuosa de você já teria me feito feliz, já teria me atado a você para sempre.  Porém, você jamais disse tal palavra.  Você não foi me encontrar como uma mulher amorosa, mas sim como uma fria adversária.
Foi a maior decepção da minha vida.  Tinha a esperança de ter encontrado amor e bondade em você, porém o que encontrei foi insensibilidade, intransigente e inflexível insensibilidade.  Eu já havia superado todas as minhas antigas apreensões, as quais não escondi de você, pois achava que o amor verdadeiro era mais forte que as dificuldades que estavam atrapalhando a nossa união.[8]
Parecia ser o fim.  Eles se separaram sob a mútua declaração de que os problemas no relacionamento de ambos eram irreconciliáveis.  Ela até mesmo devolveu as cartas de amor que ele havia escrito para ela em Hamburgo.
Na manhã seguinte, Margit sentiu remorso e escreveu para Mises.  Porém, ele permaneceu em silêncio.  Ela continuou escrevendo para ele todos os dias, sem obter resposta.  Alguns dias mais tarde, ela finalmente conseguiu falar com ele ao telefone.  Mises reiterou tudo que ele havia dito naquela quarta-feira.  Estava tudo acabado, para sempre.
Não muito tempo depois, Mises aparentemente descobriu a verdadeira causa da sua febre — uma doença rara conhecida como abdômen cirúrgico agudo — e se internou em um hospital para fazer uma cirurgia.[9]  Margit havia parado de escrever para ele, mas obteve notícias sobre sua saúde através de seu primo em segundo grau, Strisower, o médico de seu falecido marido.  Ela até mesmo pediu a Deus por sua recuperação, admitindo mais tarde que sempre havia se considerado ateia, mas que essa emergência havia revelado uma crença diferente.
Com o tempo, ela começou a escrever para ele novamente.  Como ele não respondia, ela implorou ao professor Adler, médico dela, para pedir a Mises que escrevesse e explicasse todos os motivos de sua obstinada teimosia.  Com o pedido vindo de um colega como se fosse um pedido semi-oficial, Mises sentiu que tinha de acatar.  Ele escreveu uma carta com palavras veementes e nada lisonjeiras, e enfatizou que teria preferido poupá-la do constrangimento de ler seu relato.  Margit mandou a carta de volta, dizendo que ela, a carta, não condizia com ele.
Em algum momento no final de 1927, ou início de 1928, ele começou a ligar pra ela novamente.  Mas ele não dizia nada; apenas esperava-a atender ao telefone e escutava a sua voz, às vezes fazendo isso duas vezes ao dia.  E então, um dado dia, ele foi ao apartamento dela, sem nenhuma explicação, e reataram o relacionamento do ponto em que haviam encerrado em setembro de 1927.  Ela ainda esperava que ele pedisse sua mão, mas ele ainda não se sentia apto para tomar essa decisão.  Mais tarde, ela escreveu:
Antes de termos nos casado, esse amor deve ter sido um fator muito aflitivo na vida dele — tão perturbador que ele sabia que podia lutar uma batalha nos Cárpatos, mas jamais podia vencer a batalha contra si próprio.[10]
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A obrigatoriedade do diploma - ou, por que a liberdade assusta tanto?


por  

fenaj-diploma-jornalista-thezainer.jpgO STF revogou a exigência de diploma para o exercício da profissão de jornalista, uma excrescência imposta pela ditadura em 1969 com o intuito de controlar com mais rigor a divulgação de informações.  Esse decreto de 69, não obstante tenha sido criado pelos militares para proteger seus próprios interesses, acabou agradando aos comunistas — que assim finalmente conseguiram proibir a livre expressão de ideias — e aos corporativistas da classe jornalística — que agora podiam repousar sobre seus diplomas sem preocupação alguma com a concorrência ou com o fornecimento de serviços de qualidade.
Não se trata aqui de elogiar a recente ação estatal.  Afinal, o estado simplesmente retirou um empecilho — ou regulamentação, se preferir — que sequer deveria estar ali.  É como se o Congresso votasse uma lei aprovando a regulamentação de blogs, dizendo que só pode criar um blogum indivíduo com curso superior em determinada área.  Derrubar tal idiotice seria apenas um ato de correção.
Porém, como era de se esperar, a guilda foi às ruas protestar em defesa de sua reserva de mercado.  Sob a atual legislação brasileira, qualquer diploma é justamente isso: a garantia de uma reserva de mercado.  Falaremos sobre isso mais adiante.
Estudantes, professores e graduados em jornalismo ameaçaram protestar queimando seus diplomas, pois "estavam se sentindo desprestigiados pelo governo".  Mas os reais motivos do esperneio são dois: 1) a perda da reserva de mercado e o concomitante aumento da concorrência; e 2) a sensação de terem sido enganados pelo governo.
A primeira razão, embora moralmente condenável, é compreensível.  Afinal, as pessoas simplesmente não gostam de concorrência.  Se você é o dono da única padaria do seu bairro, você ficaria muito preocupado se algum concorrente abrisse outra padaria perto da sua.  Caso fosse possível, você faria de tudo para impedir que esse concorrente se estabelecesse ali, roubando sua clientela.  Em um livre mercado, você tem duas armas com as quais lutar contra seu rival: ou você diminui seus preços ou você melhora seus serviços.  No extremo, você pode escolher uma combinação dos dois.  O que é garantido é que nesse cenário quem se beneficiaria seria o consumidor — o verdadeiro patrão em um livre mercado.  Qualquer empreendedor que queira ter sucesso no livre mercado sabe perfeitamente bem que isso só será possível caso ele trate seu patrão, o consumidor, com bastante consideração.  Aliás, essa é a beleza do livre mercado.  Não importa se o sujeito é o empregado de uma empresa ou se ele é o dono dela: no final, ambos têm o mesmo patrão, o consumidor; e a ele devem gratidão e trabalho duro, como qualquer empregado deve a seu patrão.
Porém, em um mercado regulamentado, sempre existe a opção mais fácil: correr para o governo e utilizá-lo como meio de coerção para impedir a concorrência.  A obrigatoriedade do diploma — para qualquer profissão — faz justamente isso.  Após 4, 5 ou 6 anos de faculdade, você imagina que, uma vez obtido o canudo, o futuro serábrilhante.  Nada de se preocupar com a concorrência dos "lá de baixo", aquela casta ignorante e inferior que se pretende alguma sapiência.  De agora em diante, você é um ser diferenciado.  Aquele canudo vai-lhe abrir todas as portas e garantir-lhe bons proventos.  Quem não passou pelo mesmo processo que você simplesmente deve ser proibido da ousadia de querer ofertar o mesmo serviço que o seu. 
Desnecessário dizer que a livre concorrência não apenas é algo eficaz e saudável, como também é, do ponto de vista moral, um arranjo intrinsecamente superior a qualquer outro.  E isso é assim desde tempos imemoriais — basta ler o episódio bíblico de Marta e Maria (ou mesmo o de Esaú e Jacó).  Portanto, por se tratar de um processo antigo e extremamente natural, qualquer tentativa de coibi-lo não tem como resultar em um arranjo mais salutar para todos.  Sempre alguns poucos privilegiados irão ganhar em detrimento dos vários outros desafortunados.  É assim que se criam "as desigualdades sociais", se for para usar um termo mais populista e bem na moda.
Já o segundo motivo do esperneio — o fato de essas pessoas terem se sentido enganadas pelo governo — é mais complexo.  De certa forma, elas estão corretas.  O governo, ao decretar que você é obrigado a ter um diploma para trabalhar em determinadas áreas, está de fato obrigando-lhe a cursar mecanicamente alguma faculdade.  As pessoas hoje não buscam um curso superior porque estão atrás de cultura (o que, aliás, dificilmente encontrarão em uma universidade); elas buscam o ensino superior justamente porque o estado decretou que elas só poderão trabalhar em troca de um bom salário se tiverem obtido algum diploma em uma área qualquer.
Faça o leitor uma pesquisa informal: observe as pessoas bem sucedidas à sua volta.  As chances de elas estarem trabalhando em uma área diferente daquela em que elas se formaram são enormes.  É raro encontrar uma pessoa bem sucedida — isso é, que goste daquilo que faz e que viva bem em decorrência disso — que trabalhe justamente naquilo em que se formou.
Ou seja: o estado impôs a perda de tempo e dinheiro em detrimento do aprendizado verdadeiro.  E o pior: mal acostumou toda a atual geração, que se acostumou a exigir "direitos".
Funciona assim: o estado determina que você tem de ter um diploma caso queira seguir uma determinada carreira.  Você, então, passa a ser obrigado a perseguir um curso superior.  Inevitavelmente serão entre 4 e 6 anos de bons momentos, festas, muita farra e muitos pileques.  O seu objetivo é apenas ser aprovado nas matérias (em sua maioria, inúteis) e pôr as mãos no sonhado diploma.  A esperança é que, dali pra frente, o futuro será promissor, uma vez que sua reserva de mercado estará garantida.  E então o futuro chega e, surpresa!, a coisa não é nada auspiciosa.  Todas as regulamentações e tributações governamentais criaram um mercado de trabalho rígido.  Você, no máximo, encontra um emprego que paga um pouco melhor que um estágio, porém que exige muito mais; e, na maioria das vezes, você descobre que não é bem aquilo que queria.  Você se sente enganado.  Começa então a gritar por "direitos".  Começa a achar que, só porque cursou faculdade e tem um diploma, tem "direito" a emprego e salário bons.  Porém, assim como você, há vários outros na mesma situação.  E o mercado de trabalho é regulado demais para conseguir absorver toda essa mão-de-obra.  Solução: você tenta encontrar maneiras de restringir o acesso da concorrência não diplomada.  A maioria desiste e vai tentar concurso público — afinal, o indivíduo reage a incentivos; e os incentivos salariais do setor público são tentadores demais para ser rejeitados.
No caso dos estudantes de jornalismo, a decepção é maior.  Além de um mercado com poucas vagas, eles perderam a reserva de mercado que o estado havia lhes prometido — que, em última instância, foi o que os levou a investir tempo e dinheiro nesse curso.  Aqueles que estudaram em faculdade particular, então, foram ainda mais prejudicados.  Além dos dois contratempos acima, também tiveram de custear seus estudos. 
O que praticamente ninguém — independente do curso que faz — ainda entendeu é que, a partir do momento em que um bem (educação superior) é decretado obrigatório pelo estado, tem-se o cenário perfeito para a formação de cartéis.  E o que temos no Brasil é isso: um cartel universitário mantido pelo estado.  O serviço de educação superior — ao contrário de um restaurante, por exemplo — tornou-se algo obrigatório.  Você só se torna alguém se tiver perdido no mínimo quatro anos de sua vida sendo estupidificado por aqueles estabelecimentos chancelados pelo estado.  As universidades não precisam se esforçar para conseguir atrair alunos.  Elas sabem que, de um jeito ou de outro, eles terão de procurá-las.  Agora então com a expansão do ProUni a situação ficou ainda melhor para elas.  O lucro é garantido, mesmo que os serviços prestados estejam em queda livre.  Não há a disciplina imposta pelo livre mercado — aquela disciplina que garante a qualidade da comida dos restaurantes.
É por isso que está errada a discussão que alguns pretensos liberais gostam de travar sobre a privatização de universidades públicas.  A discussão não deve ser sobre universidade pública versus universidade privada.  Não.  Os reais defensores da liberdade devem defender o fim da obrigatoriedade do diploma para o exercício de todasas profissões.  Fazendo isso, a imensa maioria dos cursos universitários perderá seu sentido.  Ninguém vai perder tempo e dinheiro sendo doutrinado e estupidificado em cursos de ciências humanas, por exemplo.  O diploma será apenas um acessório adicional, que pode ou não fazer a diferença.  Hoje, com a quase universalização da internet, qualquer um está preparado para estudar por conta própria, desde que esteja munido do impulso genuíno para tal. 
Cursos que exigem aulas práticas, como engenharia, medicina, odontologia, agronomia e veterinária continuariam sendo ofertados privadamente por universidades.  A concorrência entre elas garantiria preços baixos e alta qualidade de ensino.  Nada impediria também que profissionais experientes e já treinados pelo real mercado oferecessem cursos particulares em determinadas matérias de determinadas áreas.  Por exemplo, se um indivíduo está estudando autonomamente engenharia e estivesse com dificuldades em análise estrutural, ele poderia procurar especialistas no assunto para sanar suas dúvidas, sendo que esses especialistas — justamente por estarem em busca do lucro — teriam de ter instalações adequadas para ministrarem suas aulas.  Esse arranjo seria perfeitamente organizado pelo mercado, da mesma forma que pessoas que querem aprender mandarim procuram centros especializados no ensino do idioma.
"Ah, mas esse cenário seria uma catástrofe! Na ausência da obrigatoriedade do ensino superior, teríamos cirurgiões operando pessoas sem diploma, engenheiros construindo pontes e edifícios sem nenhum preparo e dentistas manuseando perigosamente seus boticões!  Imagina o perigo!"
Em primeiro lugar, é bom deixar claro que pessoas diplomadas também cometem erros crassos, principalmente em medicina e engenharia.  Em segundo, as pessoas que querem seguir essas áreas podem sim obter um diploma e utilizá-lo como diferencial no mercado.  Mas nada impediria que os não diplomados também tentassem mostrar sua competência.  A chave de tudo, mais uma vez, chama-se concorrência.  É isso que determinaria a qualidade dos serviços.  Ademais, as próprias entidades de classe poderiam — no interesse da defesa de sua própria imagem — criar registros com os nomes das pessoas de fato capacitadas para determinados serviços.  Seria do interesse dela fazer com que os profissionais da sua área fossem os melhores.  Afinal, um profissional ruim mancharia toda a reputação da classe.  Essa solução privada já existe hoje em várias áreas — a Microsoft solta certificados de qualificação de programação que o mercado exige; a SAP também.  Da mesma forma, o CREA e seus concorrentes provavelmente teriam de instituir certificações para engenheiros, arquitetos, etc.  Na área médica, hospitais e empresas de seguro saúde também seriam forçadas pelo mercado a instituir suas certificações próprias.
Sim, hoje existem os conselhos federais.  Porém, estas são também entidades coercivas, pois utilizam o estado para impedir justamente os não diplomados de exercerem sua profissão.
Já aqueles cursos "puramente teóricos", como filosofia, direito, economia, psicologia, ciências sociais, matemática, estatística, história, geografia, física, fonoaudiologia e até mesmo ciência da computação, dificilmente seriam ofertados em grande escala como são hoje, pois não é necessário ter um exército de professores cuja única função é escrever no quadro e indicar livros-texto.  Não haveria demanda para um serviço tão básico.  Os interessados poderiam perfeitamente se virar para conseguir a educação necessária, seja através de cursos particulares, seja através do autodidatismo.  De novo: com a expansão da internet, o indivíduo não tem desculpa para não ser capaz de montar sua própria bibliografia. 
Há também o fato de que a maioria das pessoas hoje freqüenta universidades sem ter a mínima noção do que querem.  Estão lá ou porque são obrigados ou porque a educação é "gratuita", no caso das universidades públicas.  Dinheiro público e recursos escassos estão sendo desperdiçados em pessoas que estão lá apenas para matar o tempo e farrear — tudo por causa de uma estúpida imposição estatal.  E mesmo para as que se formam, fica a pergunta: formaram-se em quê?  Muito provavelmente ganharam um diploma para nada, pois dificilmente a universidade fornece o treino necessário exigido pelo mercado.  O indivíduo fica lá por anos e sai sem saber fazer absolutamente nada de prático.  Seria muito mais negócio se essas pessoas abandonassem a universidade e fossem trabalhar direto na área de que gostam.  O aprendizado seria muito melhor, mais rápido e mais proveitoso.  No caso específico do jornalismo, não é raro ouvirmos relatos de um foca que aprendeu mais em três meses de redação do que nos quatro anos do curso.
Finalmente, outro empecilho que deve ser abolido é a proibição do homeschooling (o ensino em casa).  É do ambiente familiar que nasce o genuíno impulso para a educação; se os pais não conseguem estimular seus filhos para tal, não serão os burocratas do Ministério da Educação (que, em última instância, são quem determinam os currículos) que o farão.  Educação é uma conquista pessoal e ninguém se educa por mera obrigação, contra a própria vontade e sob pressão externa.  Com o homeschooling, as escolas, principalmente as particulares, ficariam mais vazias.  Essa queda na demanda levaria a uma queda nos preços, possibilitando a matrícula de alunos filhos de pais menos endinheirados.  Vale deixar claro que as mensalidades escolares são caras hoje porque as escolas também são um serviço que foi tornado obrigatório pelo estado.  Se um serviço tem demanda obrigatória, é natural que os preços subam constantemente. Liberando-se o homeschooling, as escolas teriam de concorrer mais entre si em busca dos alunos remanescentes.  Maior concorrência é igual a preços menores e serviços melhores.
Enfim, haveria várias maneiras de o mercado fazer uma triagem, passar um pente-fino, nos pretensos profissionais de cada área.  O que se pode garantir é que, sem o protecionismo estatal, tal seleção seria muito mais eficiente que a atual.  Como Lucas Mafaldo explicou cristalinamente:
Não é preciso provar a importância da competição. Quando abrimos as portas de entrada de um mercado, abrimos também a porta para a inovação e produtividade. Sem a proteção do Estado, os empreendedores precisam competir para melhor servir o cliente, e melhorar o processo de certificação, o que invariavelmente passa por uma combinação de dois mecanismos: melhorar a qualidade do serviço e baixar seu custo.
Remover a obrigatoriedade do diploma para o exercício de determinadas profissões abriria a porta para os diplomados competirem com os não-diplomados. Isso forçaria os portadores de diploma a mostrar resultados, impedindo-os de descansar sobre seus títulos. Isso também criaria um incentivo para os alunos escolherem apenas as universidades que realmente os preparassem para o mercado de trabalho de trabalho. As universidades teriam um incentivo para cortar toda a "gordura" de seus currículos, deixando apenas aquilo que realmente aumentasse a eficiência profissional dos seus alunos.
E, principalmente, com o aumento da competição, os consumidores veriam a qualidade dos serviços subirem e os preços caírem. Precisamos de diplomas, mas eles não precisam ser obrigatórios. Se alguém realmente quiser ajudar o consumidor, o primeiro passo é abolir as reservas de mercado criadas pelas licenças dos conselhos profissionais — e a obrigatoriedade do diploma é apenas uma delas.
A pergunta a ser respondida pelos protecionistas: por que temem tanto a liberdade e a concomitante responsabilidade própria que esta impõe?

O cartel dos advogados



oab.jpgNo século XIX, a advocacia era uma profissão aberta para o mercado.  Não havia decretos estipulando o tipo ou mesmo a duração da formação que um indivíduo deveria possuir para exercer a advocacia.  Nenhuma lei restringia nenhuma pessoa de ofertar seus serviços nesta área.  Os únicos que reclamavam eram aqueles advogados que queriam forçar "padrões mais elevados" sobre o mercado.
[No Brasil, o Instituto dos Advogados do Brasil foi criado em 1843.  O IAB exigia a formação acadêmica, mas não tinha poderes para fiscalizar e não obrigava os formandos a se cartelizar para poder exercer sua profissão.  Em 1930, Getulio Vargas, por meio do Decreto n.º 19.408, de 18 de novembro de 1930, institui a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), entidade que passaria a ser quem efetivamente daria o aval para que a pessoa pudesse ou não exercer a profissão advocatícia. 
Entretanto, até a década de 1970, ainda era possível exercer a advocacia sem se possuir formação acadêmica, sendo esse profissional pejorativamente chamado de Rábula.  Foi a partir dos anos 1970 que a OAB começou a endurecer, culminando com uma lei de 1994, decretada pelo governo federal, declarando que a advocacia seria prerrogativa exclusiva dos bacharéis em Direito aprovados no exame de ordem da OAB.  Ou seja, o advogado é o único profissional que, ao terminar a sua graduação, deve obrigatoriamente se submeter a um teste para poder exercer sua profissão.  Criou-se assim a mais poderosa guilda do Brasil; uma reserva de mercado extremamente eficiente para restringir a oferta de serviços e, com isso, encarecer os preços ao mesmo tempo em que derruba a qualidade, pois a concorrência é extremamente restrita.
Tão poderosa é essa guilda, que ela se tornou a única entidade corporativista citada em um texto constitucional.  Como bem disse Roberto Campos: "A OAB conseguiu a façanha de ser mencionada três vezes na 'Constituição besteirol' de 1988.  É talvez o único caso no mundo em que um clube de profissionais conseguiu sacralização no texto constitucional."]
Atualmente, a advocacia é uma área restrita exclusivamente àqueles que podem bancar as amplamente inúteis e altamente custosas etapas exigidas para se obter uma licença, tudo graças ao lobby dessa associação de advogados.  Você não pode "advogar" — um conceito extremamente vago — a menos que possua uma licença concedida pela guilda que opera sob a proteção do estado.  E você não consegue obter uma licença sem passar pela tortura extremamente dispendiosa das faculdades de direito e, principalmente, pelo próprio exame da Ordem.  A "prática não autorizada da advocacia" (uma regra jurídica) protege da concorrência esse cartel legitimado pelo estado (todo cartel só funciona quando sancionado pelo estado).
Ao elevar artificialmente o custo de entrada no mercado, a Ordem reduz sobremaneira a quantidade de concorrentes.  Aqueles que conseguem entrar nesse mercado altamente cartelizado estão livres para cobrar preços muito mais altos, sem temor de concorrência.  Nos EUA, ocorreu uma situação cômica: a própria American Bar Association (a OAB americana) publicou vários estudos que concluíram que um grande número de cidadãos americanos não conseguia bancar os honorários de advogados, o que significava que havia uma grande parcela de cidadãos que simplesmente não tinha condições de contratar um bom advogado para nada.  Porém, ao invés de seguir a lógica e defender um livre mercado para a advocacia, a ABA passou a fazer lobby para que o governo americano começasse a subsidiar os pobres para que estes pudessem bancar os caríssimos honorários dos advogados.  Ou seja, na prática, não satisfeita com seu cartel chancelado pelo estado, a ABA queria tambémreceber dinheiro diretamente do governo.
Em 1987, o presidente da Legal Services Corporation (entidade privada e sem fins lucrativos que busca garantir acesso igualitário à justiça para todos os americanos que não podem bancar advogados), W. Clark Durant, fez um discurso na sede da ABA pedindo a abolição de sua própria agência e de todas barreiras à concorrência, pedindo um livre mercado para a advocacia.  No dia seguinte, o presidente da ABA pediu que Durant fosse demitido.
A Ordem é extremamente vigilante e ciosa de seu mercado restrito, sempre intimidando e processando advogados "não-autorizados".  Quando instada a defender suas medidas, ela apenas diz que está tentando "proteger" os consumidores contra 'provisionados' destreinados e incompetentes.  Porém, tal justificativa não faz sentido.  Consumidores que porventura fossem prejudicados por um advogado sem formação poderiam facilmente processá-lo, e sem dúvida contariam com os ávidos e entusiásticos préstimos de um advogado formado.
Outro exemplo americano muito ilustrativo vem da cidade de Portland, no estado do Oregon.  Robin Smith havia trabalhado como técnica jurídica em um grande escritório de advocacia por vários anos, mas estava enojada com o fato de que os advogados de seu escritório cobravam altos honorários de seus clientes por um trabalho que era todo feito por ela, e honorários que a maioria das pessoas mal podia pagar.  Sendo assim, ela se demitiu e abriu um negócio próprio, a People's Paralegal, Inc (algo como Assistência Jurídica do Povo).  Durante vários anos, seu empreendimento se expandiu continuamente, oferecendo a baixo custo serviços que eram amplamente demandados, tal como esboço de testamentos e papelada para divórcios.  Ela sabia que tinha de fornecer serviços de alta qualidade para poder ser aprovada pelo teste que realmente importa, o teste do mercado — e assim, ela se esforçou para fazer um bom trabalho, um trabalho que satisfizesse seus clientes.  E ela de fato se saiu muito bem.
Porém, o sucesso é perigoso e a guilda é furiosa e temerosa da concorrência trazida pelo livre mercado.  A Ordem dos Advogados do Oregon entrou com um processo contra Smith por violação do estatuto da "prática não autorizada da advocacia" e o veredito foi aquele totalmente previsto para um cartel legalizado.  Não apenas aPeople's Paralegal foi coagida a jamais "violar a lei" novamente, como também Smith foi obrigada a ressarcir à Ordem todos os custos que a mesma incorreu na ação judicial contra Smith!  Os cidadãos do Oregon perderam uma fonte alternativa e de baixo custo para assistência jurídica e Robin Smith e seus empregados perderam a liberdade de servir pessoas que voluntariamente procuravam seus serviços.
A guilda não vai atrás apenas daqueles indivíduos que têm a audácia de concorrer contra ela no mercado; ela também vai atrás de qualquer pessoa que ouse publicar livros que forneçam informações para aqueles que queiram lidar sozinhos com seus próprios problemas jurídicos.  Nos EUA, ficou famoso o caso da Ordem dos Advogados de Nova York agitando contra Norman Dacey, autor do livro "How To Avoid Probate!" (Como Evitar a Inventariação!).  Porém, a Corte de Apelação de Nova York se recusou a atender aos pedidos da Ordem de proibir a comercialização do livro. 
No Texas, a Ordem do estado intimidou e "investigou" a editora Nolo Press, de Berkeley, Califórnia, por publicar livros de auto-ajuda jurídica.  A Ordem avisou à Nolo que ela deveria comparecer em juízo e responder à acusação de que, ao vender livros e softwares que permitiam que indivíduos fizessem seu próprio trabalho jurídico, a empresa era culpada de "praticar advocacia" sem ter licença.  A Nolo reagiu e disse que tal investigação era o início de uma ampla censura estatal.  A Associação Americana de Biblioteconomia Jurídica e a Associação Bibliotecária do Texas apoiaram a Nola.  No final, a legislatura do Texas aprovou a lei HR 1507, que expressamente eximia livros e websites da acusação de praticar advocacia sem ter licença, desde que eles "declarassem de forma clara e conspícua que tais produtos não são substitutos para os conselhos de um advogado".
Estes e milhares de outros casos de "prática não autorizada da advocacia" mostram por que essa abordagem regulatória da "proteção" ao consumidor é um engodo.  O cartel legitimado ataca todo e qualquer tipo de liberdade de contrato e de ocupação, privando desta forma inúmeras pessoas dos benefícios do mercado.  A Ordem serve apenas para restringir escolhas que seriam benéficas para todas as partes envolvidas.
Licenciamentos fornecidos por cartéis não são nem necessários e nem suficientes para garantir competência.  Vários advogados incompetentes se formam em faculdades de direito e são aprovados no exame da Ordem.  O que estimula profissionais a fazer um bom trabalho, licenciados ou não, é o poderoso incentivo gerado pelo livre mercado, que necessariamente obriga a prestação de bons serviços e a satisfação de seus clientes.  Não há substituto para isso.
No estado de Maryland, um cidadão chamado Paul Kurtz, que não era membro da Ordem e que nem sequer havia estudado em uma faculdade de direito, conseguiu representar mais de 100 clientes em questões legais, inclusive processos judiciais.  Vários juízes, ignorantes deste fato, simplesmente supuseram que ele era um advogado "de verdade", pois sua atuação era completamente profissional.  O The New York Times citou um advogado que havia dito que Kurtz havia "atuado admiravelmente ao apresentar um dossiê jurídico e vários argumentos em uma audiência."
Kurtz conseguiu aprender — de maneira autodidata — tudo o que precisava saber sobre direito para fazer um bom trabalho, e sem ter passado por todo o castigo imposto pela guilda: faculdades de direito e o exame da Ordem.  Kurtz foi preso, acusado de violar o estatuto da "prática não autorizada da advocacia" de Maryland.  Como os advogados gostam de dizer, res ipsa loquitor: a coisa fala por si própria.
Se os advogados realmente quiserem fazer algo que melhore sua imagem e reduza o número de piadas maldosas sobre sua profissão, eles deveriam começar por demolir todas as barreiras impeditivas e exclusivistas que eles construíram ao redor do mercado de serviços jurídicos.