terça-feira, 22 de outubro de 2013

Uma missionária da educação - Veja entrevista

Entrevista com: WENDY KOPP

André Petry de Nova York

Ela nunca deu aula nem estudou pedagogia, mas 
lidera uma revolução nas escolas que começou há mais de
 duas décadas nos EUA e está agora em outros 25 países
WENDY KOPP

Quando estava no último ano da Universidade Princeton
Wendy Kopp teve uma ideia que a todos pareceu maluca. 
Ela se propôs a recrutar alguns dos mais brilhantes 
universitários recém-formados e colocá-los para dar
 aula nas escolas mais miseráveis dos Estados 
Unidos. Apostou-se que ela conseguiria convencer 
algumas dezenas. Wendy queria 500. Conseguiu
 2500. Assim começou o Teach for America,
 que hoje tem10.400 professores lecionando para
 750.000 crianças americanas.

Com o nome de Ensina!, o programa chegou a 
outros 25 países, entre os quais Argentina, Chile, Colômbia, México e Peru.
 No Brasil, ele emperrou. Na sala onde deu entrevista a VEJA, há uma
 mensagem na parede: "Acredite nas suas ideias malucas".

A senhora já disse que, se tivesse experiência em educação, 
não teria criado o Teach for America. Por quê? 
Wendy Kopp: Quando estava me formando em Princeton, no fim dos anos 80, 
sentia uma urgência em criar algo como o Teach for America. Acho que
 esse sentimento era nutrido pela minha ingenuidade e inexperiência. Eu não 
sabia o que era impossível, e toquei em frente. Se soubesse, talvez não tivesse feito 
o que fiz.

Os universitários que aderem ao programa também são movidos
 por certa ingenuidade? 
Wendy Kopp: Sempre digo que precisamos deles agora, já, quando ainda são
 capazes de fazer, entre aspas, perguntas malucas, quando ainda são capazes
 de perseguir aquilo que outros julgam impossível. É ilusão achar que eles podem
 pegar o diploma, fazer carreira e depois voltar para dar aula aos pobres. Não é assim 
que funciona.

De onde veio o modelo de recrutar os melhores formandos
 e despachá-Ios para as escolas pobres por dois anos? 
Wendy Kopp: Na minha época de faculdade, o pessoal de Wall Street 
[centro financeiro dos Estados Unidos] batia à porta dos universitários mais
 brilhantes para convencê-los a trabalhar por dois anos no mercado financeiro. 
Eram agressivos no recrutamento. Talvez por isso nossa geração era chamada 
de "geração eu", porque, aparentemente, só estávamos preocupados em 
enriquecer. Eu percebia que essa caracterização era equivocada. O clima
 nas universidades era outro, as pessoas estavam em busca de algo
 significativo, transformador. Então, pensei em recrutar os melhores, 
exatamente como Wall Street, e convidá-los a passar os primeiros dois 

anos fora da universidade dando aula nas comunidades mais pobres do
 país. Muitos imaginavam que ninguém se interessaria. Deu-se o contrário. 
Na verdade, o interesse também é imenso em outros países.

Inclusive no Brasil? 
Wendy Kopp: Sim. O Ensina! começou no Rio de Janeiro com a 
ideia de selecionar trinta jovens. Apareceram 2400 candidatos, número 
retumbante. Conversei com os selecionados. São jovens incríveis, bem
 formados e talentosas, à altura dos melhores universitários americanos 
que recrutamos.

Por que o Ensina! foi interrompido? 
Wendy Kopp: Logo no começo do trabalho, as circunstâncias mudaram. 
A prefeitura do Rio não conseguiu garantir que nossos professores dessem 
aula no horário regular da escola. Então, eles passaram a lecionar depois do
 horário normal, como se fosse um reforço escolar. Mas esse não é o nosso 
modelo. Nos Estados Unidos e nos outros 25 países onde atuamos, nossos 
professores estão na sala de aula regular, assumindo integral responsabilidade
 pelo sucesso de seus alunos. Por isso, depois de dois anos, o trabalho foi 
suspenso. Agora o Ensina! está em busca de novas parcerias com 
estados e prefeituras. Tenho certeza de que o Ensina! será um sucesso
 no Brasil. É só uma questão de acertar os ponteiros.

Os professores tradicionais ficam incomodados com a 
chegada de gente sem formação pedagógica para dar aula? 
Wendy Kopp: Cada país tem suas peculiaridades. Nos Estados Unidos, 

quando começamos, em 1989, o primeiro passo foi colocar professores do 
Teach for America em escolas onde havia falta de professores tradicionais.
 Agora, temos gente em todos os tipos de escola. Em geral, nossos professores 
são recrutados através de um processo altamente seletivo, passam cinco 
semanas em treinamento intensivo e são então colocados nas escolas, contratados
 pelos governos, São professores assim como os demais.

Entre os recrutados, há formandos em pedagogia? 
Wendy Kopp: Qualquer um pode se candidatar, mas não gastamos nossa
 energia procurando formandos em pedagogia. De todos os nossos professores,
cerca de 3% se formaram em pedagogia.

Por que tão poucos? 
Wendy Kopp: É evidente que há estudantes fantásticos de pedagogia, 
mas, na média, eles não representam os universitários academicamente
 mais promissores. Nosso processo é muito seletivo. Procuramos jovens 
capazes de exercer liderança excepcional dentro da sala de aula, não
 importa a faculdade que tenham cursado. Nem sempre esses critérios nos
 levam ao pessoal da pedagogia. Além disso, o problema é que muitos dos 
estudantes de pedagogia não querem dar aula nas comunidades pobres, que
 são o nosso alvo.

A senhora acha que o Congresso americano deveria 
acabar, ou ser mais flexível, com a obrigatoriedade de 
certificação de professores? 
Wendy Kopp: É uma questão delicada. Por um lado, devemos 

nos preocupar em aumentar a qualidade dos professores. Por outro, 
não há correlação entre a exigência de certificação e a qualidade dos 
professores. Ou seja: gastamos bilhões de dólares em um sistema
 ineficiente, que exclui muita gente boa da sala de aula. Se estivéssemos
 criando nosso sistema agora, acho que não optaríamos pelo modelo atual.
 Deveríamos, em vez de pedir a certificação, apenas exigir que os professores 
fossem inteiramente responsáveis pelo sucesso dos alunos. Ponto.

Um bom professor nasce ou é criado? 
Wendy Kopp: É criado. Procuramos selecionar universitários com 
certas características. Escolhemos aqueles que acreditam no potencial de
 todas as crianças, que são incansáveis na busca dos objetivos, que perseveram
 diante dos desafios, que são capazes de influenciar e motivar os alunos. Mas, 
além dessas qualidades, eles precisam aprender a trabalhar com crianças e 
adquirir habilidades e conhecimentos para virar professores mais eficazes, mais 
decisivos. E tudo isso é ensinado.
Professora ANAM PALLA - Paquistão
O que define um bom professor? 
Wendy Kopp: No contexto em que trabalhamos, de escolas em comunidades
 desfavorecidas, o bom professor é o bom líder. Em nossa rede no Paquistão, há 
o caso exemplar da professora Anam Palla. Ela recebeu uma turma de sessenta 
meninas que estavam estudando na cidade para depois voltar para sua 
comunidade, casar e ter filhos. As garotas cursavam o 1º ano do ensino médio, 
mas tinham um atraso acadêmico de quatro a cinco anos. Estavam no caminho do
 fracasso. Anam Palla definiu que seu objetivo seria preparar todas elas para
 entrar nas melhores universidades, se quisessem. Ela foi incansável. Encontrou-se
com os pais das meninas, estabeleceu um regime de trabalho duro. Algumas meninas
 voltaram para sua comunidade para casar e ter filhos, mas se tornaram defensoras
 da educação, convencendo outras famílias a mandar as filhas à escola. Outras 
acabaram nas melhores universidades. O que fez a diferença? Só tenho uma resposta:
 Anam Palla é uma grande líder.

Qual é a melhor estratégia pedagógica? 
Wendy Kopp: Vi tantas que deram certo e tantas que deram errado que hoje 
acredito no seguinte: é preciso oferecer meios para que professores e diretores 
assumam responsabilidade integral pelo sucesso acadêmico dos alunos. Eles 
precisam ter poder, flexibilidade para definir o currículo, decidir como o dinheiro
 será gasto. Numa situação precária, faz sentido impor um currículo, mas tudo depende 
de como ele é implementado.

O que acontece com os professores depois de dois anos dando aula? 
Wendy Kopp: A experiência de ensinar em comunidades de baixa renda não tem
 impacto apenas nas crianças, mas também nos professores. Depois dos dois anos 
regulares, entre 60% e 70% dos professores estabeleceram-se na área da 
educação como professores, diretores de escola, formuladores de políticas de
educação. Na Índia, ninguém acreditava que os universitários se interessariam
 pelo programa. Tivemos 11.000 candidatos no primeiro ano, em 2008, e 70% 
seguiram na área da educação. Nos Estados Unidos, em pouco mais de vinte anos,
37000 deram aula e 80% têm hoje empregos relacionados à educação. Lembre-se: 
a quase totalidade desses jovens brilhantes não era da área de educação.

A taxa de retenção também é alta no meio rural? 
Wendy Kopp: É menor, mas significativa. Há pouco, visitei o Delta do Mississippi, 
 onde atuamos há duas décadas. Helena, uma comunidade muito pobre no Arkansas, 
além da tradicional escola de ensino médio que sempre teve, hoje conta com mais
 quatro escolas, todas dirigidas por ex-membros do Teach for America. Antes, 
5% das crianças de Helena iam para a universidade. Hoje, todas estão no caminho
 do ensino superior. Perguntei à comunidade o que havia mudado nesses vinte anos. 
As pessoas disseram: a expectativa em relação às crianças. Um jovem contou que, 
em 1994, eram raros os estudantes que faziam o teste para a universidade e, quando 
tiravam 17, 18 ou 19, era uma festa. Agora, o sobrinho dele, que ainda está no 2° ano
 do ensino médio, fez o teste, tirou 24 e eles querem saber como fazer para que
 ele chegue a 28 e possa entrar em qualquer universidade. Seis crianças de Helena 
entraram na Universidade Vanderbilt neste ano.

Onde a presença do Teach for America fez mais diferença? 
Wendy Kopp: Por muitos anos, Nova Orleans foi considerada a cidade 
mais complicada do país. Nada parecia funcionar. Depois do furacão Katrina, 
veio à tona a dramática realidade das escolas. Crianças do 8° ano tinham o mesmo
 nível das do 2° ano. Um desastre. Em cinco anos, o porcentual de crianças 
que atingem o padrão exigido pelo estado mais do que dobrou. Cerca de 40% 
dos diretores de escola são ex-membros do Teach for America. O atual secretário 
de Educação de Louisiana também pertenceu ao nosso programa.

Já é possível avaliar o impacto do programa em outros países? 
Wendy Kopp: Estamos há dez anos na Inglaterra. O sucesso é enorme. Cerca de
 60% dos recrutados ficam na área da educação. Estive há pouco em Londres e
 visitei a King Solomon Academy, que faz um trabalho extraordinário. Lá, as 
crianças do 5° ano estão no nível das do 7° ano das escolas na vizinhança. Sou 
otimista quanto ao futuro. Os problemas da educação são muito parecidos em
 todos os países, o que significa que as soluções podem ser compartilhadas.

Se fosse possível copiar o sistema educacional de algum país, qual 
deveria ser o escolhido? 
Wendy Kopp: Todo mundo está infeliz com seu sistema educacional. Na 
Coreia do Sul, quem diria, o nível de insatisfação é abissal. Falei com empreendedores 
sociais, estudantes, empresários, autoridades do governo. Todos dizem que o sistema 
está falido.

Mas, nas provas internacionais, os coreanos não estão entre os 
melhores? 
Wendy Kopp: Os pais pagam para os filhos irem a academias privadas, que ensinam 
o que a escola regular não ensina. Os alunos entram às 3 da tarde e saem às 11 da 
noite. O dado relevante na Coreia é o poder de uma cultura que valoriza a educação.
 Se as crianças não estão aprendendo na escola, em algum outro lugar elas terão de aprender.

A senhora teve um professor favorito? 
Wendy Kopp: Tive dois. Ambos me mostraram que meu potencial era maior do que
 eu imaginava. Por coincidência, os dois trabalhavam com a escrita. Sei escrever por
 causa deles. E escrever direito me serviu tanto na vida...

É verdade que a senhora coloca o despertador para 3 ou 4 da manhã? 
Wendy Kopp: É verdade. Meu ideal é deitar às 9 da noite, e gosto de ter algumas horas
 para mim antes que as crianças acordem. (Wendy tem filhos de 13, 11, 9 e 5 anos.)

A senhora conhece os professores dos seus filhos? 
Wendy Kopp: Lógico, conheço todos.

Fonte: Revista VEJA - Entrevista (Páginas amarelas) - Edição 2319 - Ano 46 - nº
 18 - 1º de Maio de 2013 - Páginas 19-23 - Edição impressa.

A Economia do céu e do Inferno por Diogo Costa

Por Diogo Costa   
Golden Rule
 
Talvez você já tenha ouvido alguma versão da seguinte parábola:
Um homem é transportado até o inferno e o inferno é um imenso banquete. Carnes e frutas e massas e doces cobrem uma longa mesa de ponta a ponta. Mas espera! Como é que as pessoas sentadas ao redor da mesa estão gemendo de fome? O visitante então repara que todos têm seus cotovelos dobrados para fora de maneira que não conseguem levar os talheres até a boca. Tanta abundância e, ainda assim, tanta aflição, lamenta.
O homem é então levado até o céu. Lá está outra mesa com os mesmos alimentos, e lá estão outras pessoas com os mesmos cotovelos invertidos. Mas no céu todos comem com satisfação, porque cada pessoa alimenta quem está ao seu lado.
Ouvi essa alegoria pela primeira vez da boca de um cantor brasileiro. Caetano, ou Gil talvez Chico, contava essa estória em um dos comerciais da campanha Natal Sem Fome, que passavam na TV em 1994. A mensagem ficou comigo: o abismo entre o paraíso e a danação pode estar numa pequena diferença na forma como as pessoas reagem às mesmas circunstâncias. O inferno é o egoísmo dos outros, o céu é o altruísmo para com os outros.

Quando comecei a estudar economia e liberalismo, passei a rejeitar a parábola como representando o lado negro da ética altruísta. Perdidos na beleza da metáfora, nos esquecemos que aqui na terra os seres humanos foram feitos com cotovelos que se voltam para dentro. Dobrá-los para fora não melhora a vida das pessoas. Os humanitários de TV pareciam querer construir seu céu quebrando nossos cotovelos até que todos sejamos obrigados a servir aos demais sem que ninguém sirva a si mesmo. O cotovelo humano voltado para dentro era apenas mais uma evidência que o ser humano foi feito para servir a si próprio.

O significado parábola só se esclareceu quando fui ler Alexis de Tocqueville. O segundo livro de Democracia na América chama atenção para uma curiosa distinção americana. Enquanto na Europa aristocrática se falava das virtudes do sacrifício desinteressado, nos Estados Unidos democrático, as pessoas combatiam o egoísmo falando da utilidade de doses diárias de pequenos sacrifícios. ”O amor esclarecido por si mesmos”, dizia Tocqueville sobre os americanos, “os leva sem cessar a se ajudar uns aos outros”. Ele chamava essa interseção entre caridade e utilidade de interesse corretamente compreendido. Percebi que céu e inferno na parábola do cotovelo não contrastava altruísmo e egoísmo, mas interesse esclarecido e interesse emburrecido.

Se as pessoas entenderem que o bem estar de seus vizinhos é contrário ao seu próprio bem estar, o interesse próprio pode lhes fazer mergulhar em “vergonhosas misérias”, dizia Tocqueville “com medo de sacrificar algo de seu bem estar à prosperidade de seus semelhantes”. Entender que servir ao próximo constitui parte do seu próprio bem estar firma a sociedade nas bases da cooperação humana.
Em linguagem de escolha racional, podemos dizer que os jogadores do inferno acham que estão em um dilema do prisioneiro. Aos seus olhos, o custo de servir ao próximo parece superar o benefício de ser servido. Uma mera mudança de percepção seria capaz de transformar o equilíbrio da fome infernal no equilíbrio da satisfação celeste. Basta esclarecermos nosso interesse próprio para que um dilema do prisioneiro passe a ser percebido como  um jogo de cooperação.

Ao conjugá-la com o interesse esclarecido de Tocqueville, fui percebendo a profundidade econômica da parábola dos cotovelos. De certa maneira, todos nós humanos temos nossos cotovelos econômicos enrijecidos. Sozinhos, somos capazes de nada. Nem mesmo de fazer um lápis ou uma torradeira. Se tivéssemos que sobreviver em auto-suficiência, a maior parte da população mundial pereceria mais rapidamente que o menino do Into The Wild. É a cooperação econômica com outras pessoas que nos veste, alimenta, educa, e nos permite ver a vida como uma jornada em vez de uma curta agonia.

O fundamento econômico de toda a civilização, de qualquer sociedade humana, é a possibilidade de cooperação, “o fato de que o trabalho efetuado valendo-se da divisão do trabalho é mais produtivo que o trabalho solitário”, comoescreveu Ludwig von Mises, “e o fato de que a razão humana é capaz de perceber esta verdade.”

Assim como a efetividade da cooperação não conseguiria existir se houvesse uma inimizade inata, uma inveja insuperável entre as pessoas, também os laços de amizade e o sentimento de empatia que imaginamos existir entre os habitantes do céu metafórico dependiam da possibilidade dos ganhos mútuos da cooperação. Se a escravidão fosse mais produtiva que o trabalho voluntário, as ineficientes sociedades abolicionistas iriam se tornar cada vez vulneráveis à dominação externa. Os abolicionistas de hoje se tornariam os escravos de amahã. A história tem demonstrado o contrário, que a vitória do abolicionismo é em parte uma vitória dos ganhos mútuos da cooperação humana.

A biologia chega às mesmas conclusões quando percebe que a evolução das espécies não é apenas um exercício de competição, como também um alargamento da cooperação. Desde a cooperação entre bactérias que se unem dentro de uma mesma membrana até a cooperação entre vespas que dividem o trabalho entre a rainha e os operário. Os insetos que passaram a cooperar em colônias obtiveram mais sucesso que o resto. O psicólogo Jonathan Haidt explica que apesar dos “insetos coloniais representarem apenas 2% de todas as espécies de insetos, em um curto período de tempo eles dominaram os melhores locais para a alimentação e reprodução, empurraram seus competidores para a margem e mudaram a maioria dos ecossistemas terrestres.”

Da mesma maneira, foram as nações mais cooperativas da terra que acabaram atingindo grau mais alto de prosperidade e influência. Diferente “das sociedades de formigas, abelhas e vespas”, dizia Mises, “o traço característico da sociedade humana é a cooperação propositada.” Nós cooperamos de maneira consciente e deliberada para atingir determinados fins. O progresso econômico depende da expansão de nossa percepção empática e de nossa prática cooperativa. Por isso a expansão cosmopolita da cooperação humana trazida pela globalização é algo tão maravilhoso.

Quanto a assuntos da pauta do dia, a parábola dos cotovelos pode servir para explicar a mentalidade protecionista de uma forma geral, e, em específico, os entraves das tentativas de cooperação multilateral da OMC na rodada de Doha. Nas negociações de abertura econômica internacional, políticos tratam acordos de cooperação internacional como a matriz do dilema do prisioneiro. Não importa se os países estrangeiros abrem ou fecham suas fronteiras à circulação de mercadorias; os governos nacionais sugerem que ‘o meu país sempre se dará melhor se mantiver as barreiras protecionistas’. O Brasil chega até a decidir rever os termos do comércio com o México a partir do momento que as exportações das montadoras mexicanas ultrapassam as nossas. A diplomacia comercial é tão avessa à ideia de permitir que seus países sirvam aos demais que sequer percebem que a única forma para cada país prosperar é receber dos outros aquilo que eles não conseguem produzir a tão baixo custo. Tome Suíça e Chile por exemplo. Os cotovelos suíços não conseguem produzir vinho e os cotovelos chilenos não conseguem produzir relógios. Mas os braços chilenos podem dar vinho aos suíços que lhes recompensam oferecendo-lhes relógios.

Assim como um marxista que vê seu trabalho intelectual como a formação de consciência de classe, o liberal também pode se achar num projeto socrático, de esclarecer às pessoas qual o seu verdadeiro interesse próprio. O mal político vem da ignorância dos que acreditam que seu interesse enquanto indivíduo ou membro de um grupo é irreconciliável aos dos outros indivíduos ou grupos da sociedade. Cabe ao liberal fazê-las perceber que, ao servir aos demais, ela está servindo a si própria; que a bifurcação que separa céu da prosperidade do inferno da pobreza está na diferença que Tocqueville encontrava entre a América e a Europa do seu tempo:
“Não creio, tudo bem pesado, que haja mais egoísmo entre nós do que na América; a única diferença é que lá ele é esclarecido e aqui não. Cada americano sabe quando sacrificar parte de seus interesses particulares para salvar os demais; nós queremos salvar tudo e com frequência pomos tudo a perder.”
Em vez de repetir os clichês daqueles liberais de egoísmo mesquinho, Capitalismo Para Os Pobres propõe expandir a abrangência da empatia e da cooperação humana para que alcancem os mais pobres da sociedade. Os ricos brasileiros não percebem que é do seu interesse que os pobres tenham acesso a trabalho, crédito, comércio, empreendedorismo e consumo. O Capitalismo Para Os Pobres se posiciona contra a atitude exclusivista do brasileiro em acreditar que os imigrantes do nordeste empobrecem as capitais do sudeste, que a inflação é causada pelo maior consumo da classe C, ou que o problema da infraestrutura  brasileira são os pobres comprando carros e passagens aéreas para engarrafar a rua e transformar o aeroporto numa rodoviária.

Enquanto pensarmos na estreiteza desse interesse emburrecido, os pobres continuarão reservados a uma segunda mesa abastecida com as migalhas que caem da mesa dos ricos. Realizar o Capitalismo Para Os Pobres é aumentar o número de cadeiras para que todos, pobres e ricos, alimentem-se do grande banquete da cooperação humana.

fonte  - http://www.capitalismoparaospobres.com/?p=819

Bichinhos assustados por Olavo de Carvalho


Bichinhos assustados
 
 

 

SXC
De fosse preciso alguma prova suplementar daquilo que escrevi no artigo "A animalização da linguagem", os srs. Nirlando Beirão, Luís Antonio Giron, Paulo Ghiraldelli e mais meia dúzia se apressaram gentilmente a fornecê-la antes mesmo de que o artigo fosse publicado.
Não li ainda o livro do Lobão, O Manifesto do Nada na Terra do Nunca. Mas, por si mesmas, as reações que essas criaturas lhe ofereceram ilustram de maneira exemplar a animalização da linguagem.
A desenvoltura ingênua com que imaginam que basta carimbar um autor como "direitista" para sepultá-lo sob dez toneladas de irrelevância mostra que não usam a linguagem como seres humanos, para representar e analisar o mundo, mas como cães que cheiram os órgãos genitais uns dos outros e, ali reconhecendo instantaneamente o membro do grupo ou o estranho, dão o assunto por encerrado.
 
Isso é a mais alta atividade cerebral de que são capazes.
 
Não se trata, sequer, de catalogação ideológica no sentido em que a praticavam os velhos marxistas, a qual exigia ir além das meras aparências partidárias e investigar se a intenção profunda de uma obra ia na direção do realismo – "humanismo", no sentido de Lukács – ou da negação idealista do processo histórico. 
 
Nessa operação, o direitismo ou o esquerdismo imediatos já não contavam como provas suficientes de uma identidade ideológica, de maneira  que reacionários de marca como Aristóteles, Shakespeare, Dostoiévski e Balzac podiam até ser absorvidos no corpus da doutrina marxista como  seus antecessores e parceiros.
 
Uma vez o poeta Bruno Tolentino sugeriu que os "intelectuais de esquerda" – na época ainda existiam alguns – deveriam ler meus livros com esse espírito. Se o fizessem, teriam algumas surpresas e algum ganho. Mas eles todos já morreram. O que sobrou foram os farejadores de genitais, que ao primeiro sinal de uma presença hostil já saem correndo para dar o alarma ao resto da matilha e, feito isso, julgam que cumpriram o mais sublime dos deveres intelectuais.
 
As categorias interpretativas em que baseiam seus diagnósticos não têm nada a ver com teoria marxista ou com qualquer tipo de pensamento filosófico reconhecível. São estereótipos de histórias em quadrinhos, filmes de aventuras e conversas de botequim. 
 
O sr. Giron, por exemplo, cataloga-me "à direita de Átila, o Huno" e sai todo pimpão, congratulando-se do símile originalíssimo. Nada mais significativo da mentalidade de um falante do que a fonte de onde extrai suas figuras de linguagem. Átila, historicamente, foi o líder das massas bárbaras que, por onde passavam, desmantelavam a ordem social imperial. Um revolucionário em toda a linha. No imaginário infantil, porém, ele simboliza apenas o malvadão, donde o sr. Giron, sentindo o cheiro de coisa ruim e espremendo suas cadeias sinápticas até à potência máxima, conclui que deve ter sido um direitista. Dizem que o estilo é o homem. Mas às vezes não chega a ser um homem: é apenas um cãozinho amedrontado.
 
Quanto aos demais, nada tenho a acrescentar à nota que coloquei no Facebook: "Estou impressionado com o número de pessoas que atacam o Lobão por ter lido Olavo de Carvalho – um pecado que elas jamais cometeram e cuja mera possibilidade lhes inspira um horror sacrossanto. No mundo inteiro, quem critica um autor gaba-se de conhecer seus escritos melhor que ninguém. No Brasil, a autoridade de julgá-lo e condená-lo nasce da perfeita e intransigente recusa de ler o que ele escreve. Tento explicar esse fenômeno aos americanos, mas eles acham que estou com gozação."
 
A aliança de uma deprimente inferioridade mental com o instinto exacerbado de autodefesa grupal produziu esse resultado: a absoluta impossibilidade de um debate, de um confronto polêmico, mesmo feroz, entre essas pessoas e um intelecto cujo conteúdo lhes escapa e do qual só podem ter notícia, quando muito, pelos insultos com que o grupo o designa de longe, entre zunzuns cavernosos, risos forçados e juramentos de morte que jamais serão cumpridos.
 
A condição de todo debate, com efeito, é alguma intimidade com a mente do adversário, alguma compreensão das percepções que o levaram à sua visão do mundo. Isso pressupõe a disposição e a coragem de deixar-se permear pela sua influência, confiando na própria força de superá-la depois.
 
Mas quem sobrou vivo entre os "intelectuais públicos" deste país para absorver e, se possível, superar ou contestar o que ensinei em O Jardim das Aflições, em Aristóteles em Nova Perspectiva, em O Futuro do Pensamento Brasileiro, em A Filosofia e seu Inverso e em nada menos de quarenta mil páginas de aulas e conferências transcritas, sem contar uns quinhentos artigos publicados na mídia desde 1998 e os trezentos e tantos  programas de rádio em que traduzi (ou talvez deformei) um pouco do meu pensamento na linguagem do mais acessível esculacho popular?
 
Pode até parecer inacreditável, mas a hipótese de estudar a obra inteira de um autor, mesmo na esperança de demoli-la impiedosamente, já está fora do alcance e da capacidade não só de cada um desses indivíduos, mas até deles todos em conjunto. 
No Brasil a vida intelectual superior, mesmo na sua expressão mais tosca, que é o debate ideológico, acabou. Se nos testes internacionais os nossos estudantes tiram sempre os últimos lugares, não é sem razão: o exemplo vem de cima.
 
Portanto, o conteúdo da minha obra, ou de qualquer outra que pareça detestável, não interessa mais. Basta a rotulagem superficial, passada de pata em pata entre bichinhos assustados para mantê-los a uma profilática distância de uma influência ameaçadora.
 
Olavo de Carvalho é ensaísta, jornalista e professor de Filosofia
 

Classe operária não quer revolução, quer emprego - por Mario Tonocchi




Ferreira Gullar ao lado de Rogério Amato, presidente da ACSP. - Agliberto Lima/Diário do Comércio
O populismo que domina a América Latina, hoje, é a expressão do fracasso do movimento comunista no mundo. Com o fim do socialismo e da União Soviética, a sobrevivência do radicalismo dos jovens que lutaram contra as ditaduras nos países abaixo do equador, apoiou-se na fórmula de dar à massa de necessitados o que eles precisam para formar sua base eleitoral. Foi o que afirmou ontem o escritor, poeta  e jornalista Ferreira Gullar na palestra O Neopopulismo no Brasil e na América Latina, ontem na  Associação Comercial de São Paulo (ACSP). Para ele, essa tendência deve acabar no Brasil. 
 Para o poeta, não existe, na vida cotidiana brasileira, espaço para ditadura de esquerda como o chavismo, na Venezuela, que tende a acabar com a morte de Hugo Chaves.
"O PT radical não sobreviverá. Terminado o período da ditadura no Brasil, o poder foi disputado por duas correntes de esquerda: a moderada de Fernando Henrique Cardoso e a radical de Luiz Inácio Lula da Silva. Enquanto pregou o radicalismo, Lula sempre perdeu a eleição presidencial. Só ganhou quando se apropriou do discurso moderado de FHC. O povo escolheu a esquerda moderada depois da ditadura. Com o fim do governo Dilma Rousseff, que encampou o populismo da ala radical montado no governo Lula, deve-se fechar um ciclo. O que vem de novo, como o provável candidato à Presidência Eduardo Campos, é a nova geração não ideológica", disse Gullar.
Ele também criticou os apoios que o governo Dilma dá aos governos populistas de esquerda e especialmente ao presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad. "Ele é inqualificável. Mas o fundamental é: o que temos a ver com ele? A Dilma nem sabe quem ele é. O que acontece nessa rede de apoios entre os ditos governos de esquerda, hoje ditaduras ou populistas, é uma tentativa de manter uma tendência comunista que não existe mais no mundo." 
"Essa ligação é a expressão do esquerdismo de araque. A teoria de colocar a classe operária contra a burguesia acabou em colocar o pobre contra o rico", afirmou Gullar.
Ele classificou o capitalismo como algo natural do ser humano. Para ele, a tendência política capitalista é uma criação da humanidade gestada através das gerações. 
O socialismo, por outro lado, é uma criação intelectual e somente por isso durou apenas 100 anos. "Não se pode propor mudar radicalmente tudo o que foi criado pelo homem por centenas de anos." 
Ferreira Gullar lembrou de costumes como, por exemplo, tomar o café da manhã. Para que o consumidor tenha isso em casa, deve existir uma infraestrutura de produção, distribuição e transformação que foi gestada ao longo do tempo.
Para o poeta, estabelecer  lutas entre a classe operária e a burguesia ou os pobres contra os ricos como no Brasil atual, desvia o foco do debate. 
"Uma sociedade justa nunca acontecerá. Não acontecerá porque a natureza não é justa, mas sempre é possível uma sociedade melhor", afirmou o poeta. Também não é justo, segundo o escritor, condenar a classe empresarial como somente um elemento explorador do trabalho das classes trabalhadoras. 
"A classe operária não quer a revolução, quer manter o emprego. O empresário é um intelectual que em vez de fazer poesia faz empresas."


fonte - http://www.dcomercio.com.br/index.php/politica/sub-menu-politica/109412-classe-operaria-nao-quer-revolucao-quer-emprego

Devotos de um vigarista, por Olavo de Carvalho



 

A Folha de S. Paulo perguntou, meses atrás, a quatro dos seus mais típicos mentores por que ainda é importante ler Karl Marx. Nenhum deles deu a resposta certa: porque ninguém pode ignorar, sem grave risco, as ideias que mataram mais seres humanos do que todos os terremotos, furacões, epidemias e desastres aéreos do último século, mais duas guerras mundiais. 
 
Infringindo a regra elementar do próprio Marx, de que a verdadeira substância de uma ideia é sua prática e não sua mera formulação conceitual, três deles mostraram enxergar o marxismo como pura teoria, separada da ação que exerceu no mundo, e incorreram no delito de "formalismo burguês", o mais abominável para um cérebro marxista. Eu não tomaria aulas de marxismo com esses sujeitos nem se eles me pagassem.
 
O quarto, prof. Delfim Netto, na ânsia de redimir-se ante a intelectualidade esquerdista do pecado de ter servido à ditadura militar, caprichou no hiperbolismo e atribuiu a Karl Marx o dom da eternidade, que numa perspectiva marxista não faz o menor sentido.
 
O prof. José Arthur Gianotti recomendou reler Marx cuidadosamente, porque "sua concepção da história foi adulterada, por ter sido colada, sem os cuidados necessários, a um darwinismo respingado de religiosidade."
 
Adulterada? Colada? Nenhum dos continuadores de Marx revelou tanta dívida intelectual para com Charles Darwin quanto o próprio Karl Marx, que declarou ser sua filosofia nada mais que a interpretação darwinista 
 
da História e só não dedicou O Capital ao autor de A Origem das Espécies porque este não permitiu. Quanto à tonalidade religiosa, ou pseudo-religiosa, ela é mais do que notável nos Manuscritos de 1944 e ressoa em cada linha das verberações proféticas anticapitalistas espalhadas ao longo de toda a obra de Marx. O prof. Gianotti é que quer separar artificialmente aquilo que nasceu junto. "Reler cuidadosamente"? Não é preciso. Bastaria ter lido.
 
Mas o mais cômico dos quatro foi o sr. Leandro Konder, que intelectualmente já saiu do mundo dos vivos há três décadas e não precisaria ter abandonado seu estado de animação suspensa para confirmar, na Folha, aquilo que ele já provou centenas de vezes: sua prodigiosa incultura, seu total desconhecimento dos assuntos em que opina.
 
Disse ele: "Os grandes pensadores são grandes porque abordam problemas vastíssimos e o fazem com muita originalidade. 
 
A perspectiva burguesa, conservadora, evita discuti-los. E é isso o que caracteriza seu conservadorismo."
 
Os conhecimentos que não só ele pessoalmente, mas toda a corriola de mentecaptos marxistas deste País tem daquilo que ele chama "perspectiva burguesa" podem ser avaliados pelo Dicionário Crítico do Pensamento da Direita, em que 104 dessas criaturas ridículas se encheram de dinheiro público para dar um show de ignorância como nunca se viu no mundo. 
 
 
Essa gente simplesmente não estuda os pensadores que parecem antipáticos ao seu partido. Adivinha ou cria suas ideias à distância, partindo de fofocas, piadas, fantasias preconcebidas e lendas urbanas que constituem, no seu ambiente mental provinciano, a única bibliografia requerida para quem deseje pontificar a respeito. Se fazem isso comigo, que tenho uma obra publicada relativamente escassa, por que não o fariam com os autores de muitas dezenas de volumes, como Leibniz, Husserl, Voegelin ou o nosso Mário Ferreira dos Santos?
 
A um boboca que desconhece tudo aquilo que despreza, é forçoso que o horizonte de problemas pensado por Karl Marx pareça, em comparação com o nada, "vastíssimo". Mas Marx, em verdade, pensou num único problema: a luta de classes. Todos os outros conceitos da sua filosofia foram recebidos prontos, como os de dialética, de alienação ou de comunismo, ou são apenas afirmados sem discussão crítica, como o próprio "materialismo dialético", ou derivam da luta de classes por mero automatismo, como os de ideologia, superestrutura etc. 
 
Longe de ampliar o horizonte dos problemas filosóficos, o que Marx fez foi restringi-lo com um dogmatismo acachapante, instituindo aquilo que Eric Voegelin caracterizou como "proibição de perguntar".
 
Já nem falo dos grandes problemas clássicos como o fundamento do ser, o sentido da existência, o bem e o mal, etc. Nem o próprio conceito de "valor", essencial na sua economia, ele discute. Postula-o no começo de O Capital e segue adiante, sem notar que disse uma tremenda asneira.
 
Comparado ao de Leibniz, de Aristóteles ou de Platão, o horizonte de problemas de Marx é deploravelmente pobre. Sua cultura literária é a de um professor de ginásio, seus conhecimentos de história da pintura, da arquitetura e da música praticamente nulos, suas noções de teologia não fazem inveja a um seminarista. 
 
Pergunto-me, por exemplo, qual a relevância do pensamento de Karl Marx para as ciências biológicas, para a física, para as matemáticas. Zero. A breve incursão do seu amigo Engels nesses domínios foi um vexame espetacular.
 
Em matéria de ética, então, o tratamento que Marx dá ao problema da felicidade humana é decerto o mais besta, o mais grosseiro de todos os tempos: tomemos o dinheiro da burguesia e todos serão felizes. Enfeitado o quanto seja, o argumento é esse. 
 
Só por esse detalhe o homem já mereceria o adjetivo com que o resumiu Eric Voegelin: "Vigarista".
 
Olavo de Carvalho é ensaísta, jornalista e professor de Filosofia
 
-

"Como Ler Livros" - Palestra de José Monir Nasser


A cultura brasileira ficou mais pobre neste mês de março de 2013.
Morreu em Curitiba, aos 56 anos, o professor José Monir Nasser, autor do livro “A Economia do Mais” e realizador do programa “Expedições ao Mundo da Cultura”.


Crônica em homenagem ao professor José Monir Nasser

Por Paulo Briguet/Gazeta do Povo

José Monir Nasser, que morreu no dia 16 de março, em Curitiba, foi o pai intelectual de um sem-número de pessoas. Empresários, estudantes, professores, economistas, profissionais liberais, presidentes de entidades, jornalistas – todos se tornavam alunos diante dele. Era um educador no sentido verdadeiro da palavra, se pensarmos que a palavra educar vem do latim ex ducare, conduzir para fora. Suas aulas sobre literatura, filosofia e desenvolvimento econômico literalmente conduziam os ouvintes para fora da caverna da ignorância, mostrando-lhes a luz pura e espiritual do conhecimento. Luz que emanava dos grandes clássicos: Aristóteles, Platão, Santo Agostinho, Boécio, Dante, Shakespeare, Dostoievski, Kafka, Chesterton.

Virgílio de tantos pequenos Dantes, que antes de conhecê-lo não conheciam a comédia das próprias vidas, ele comprovou que o mundo da criação literária e o mundo da criação de riquezas não estão separados, mas fazem parte de um mesmo princípio, essencialmente espiritual. Uma de suas frases – e ele era um frasista genial – ilustra esse pensamento: “Uma sociedade não pode ser rica antes de ser inteligente. Não pode existir uma economia realmente sólida e desenvolvida sem que haja uma elite cultural voltada para os bens espirituais, capaz de guiar, julgar e interpretar os esforços da comunidade”.

Era um crítico impiedoso do sistema educacional brasileiro – esse mesmo sistema que dá nota máxima a redações com erros primários de ortografia e concordância. Em uma de suas palestras, sentenciou: “O que chamamos de educação é, na verdade, ensino. E esse ensino não passa de uma distribuição de promoções sociais em forma de diplomas, na qual ninguém acha que vai aprender coisa alguma”.

Um padre amigo costuma dizer que a vida humana é sustentada por dois pulmões: a fé e a cultura. Monir sabia muito bem disso. No sábado passado, uma empresária aluna (ele não tinha “ex-alunos”) lembrou-se de um episódio em que se queixava ao professor das dores e dramas da vida cotidiana. Monir respondera à empresária, com um sorriso: “Neste mundo não vamos encontrar a tranquilidade. A paz definitiva só existe no Céu”.

Minutos depois de a aluna ter recordado esse episódio, José Monir Nasser fez a sua passagem definitiva. Deixou muitos órfãos – inclusive o autor destas linhas, que nunca o encontrou pessoalmente, mas leu e ouviu suas palavras de mestre.

Obrigado, professor Monir.
..........................................................................................
Palestra proferida por José Monir Nasser na É Realizações, marca a volta do livro de Mortimer J. Adler ao deficiente mercado editorial brasileiro.



Tem esta apresentação em http://fernandonogueiracosta.files.wordpress.com/2010/12/como-ler-livros.pdf que trata do tema também.