segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Qual o tamanho ideal e a função adequada do estado?



rothbard_direito.jpgTrata-se de um tema muito grande e muito complexo, e provavelmente ambicioso demais para ser abordado em um único ensaio.  Embora o que virá a seguir possa ser um tanto longo, ainda assim não tem como ser uma abordagem completa.  Várias perguntas ficarão sem respostas e várias objeções — inclusive as várias que já posso antecipar — não serão discutidas.  Mas, ainda assim, espero que o leitor considere válido o esforço.
Durante muito tempo me considerei um liberal clássico — assim como Ludwig von Mises, que inspirou a maior parte do meu trabalho.  Mas hoje eu não mais considero que tal posição seja logicamente consistente.  A ideologia liberal clássica, embora defenda um estado muito menor do que aquele que o consenso político atual preconiza, ainda assim atribui poderes excessivos ao estado.  Não obstante, ela oferece um bom ponto de partida para a discussão.  Portanto, comecemos por ela.
Argumentos utilitaristas para o estado estritamente limitado
A posição liberal clássica acerca do papel do estado pode ser descrita aproximadamente da seguinte forma: o estado deve ficar completamente de fora da economia.  Não há funções para o estado exercer no setor industrial, no setor bancário ou no setor monetário.  O dinheiro é o ouro ou qualquer outra commodity livremente escolhida pelo público para efetuar suas trocas de mercado.  A oferta monetária está, portanto, totalmente fora do controle político, e o sistema bancário e financeiro são entidades que operam em um mercado totalmente livre e desimpedido, sem usufruir nenhum tipo de auxílio estatal, nenhuma garantia e nenhum amparo explícito ou implícito.
Adicionalmente, todos os meios de produção são propriedade privada, e a maneira como eles são empregados é guiada pelo sistema de preços do mercado, sempre se buscando oportunidades de lucros e procurando se evitar prejuízos.  Lucros e prejuízos são os sinais essenciais por meio dos quais os consumidores direcionam as atividades das empresas privadas, de modo que elas sempre estejam se esforçando ao máximo para satisfazer os desejos do público consumidor. 
O estado não está envolvido na educação, na saúde, na previdência ou em quaisquer outros "serviços sociais".  Todas estas atividades são organizadas privadamente, pelo simples motivo de que todas elas requerem o uso de recursos escassos, inclusive mão-de-obra; e qualquer alocação racional de recursos escassos requer preços de livre mercado.  O planejamento econômico racional só é possível quando tem como base preços de mercado.  Somente preços de mercado transmitem a urgência que o público atribui aos vários e concorrentes fins para os quais os recursos escassos devem ser empregados.
Porém, preços de mercado só podem ser determinados se os recursos forem propriedade privada e se eles puderem ser livremente comercializados no mercado.  A propriedade privada é, portanto, a ferramenta essencialpara uma ampla cooperação social.  A propriedade privada permite o comércio e, consequentemente, a formação de preços de mercado.  Isto, por sua vez, permite que empreendedores empreguem estes recursos de maneira racional e eficiente.  Este processo é o único logicamente possível para se facilitar uma vasta divisão do trabalho e a constante acumulação do capital empregado em empresas privadas.  É a ampla divisão do trabalho e a constante acumulação de capital o que possibilitam que nosso padrão de vida cresça continuamente.
Um exemplo
Peguemos como exemplo um sistema de saúde estatal.  Não importa que seja de um país pobre ou de um país rico: ele jamais poderá realizar um serviço satisfatório.  E não é porque as pessoas que nele trabalham sejam incompetentes ou preguiçosas.  Elas podem muito bem ser as pessoas mais motivadas, dedicadas e bem intencionadas do planeta, e ainda assim irão entregar apenas resultados sub-ótimos, e a custos consideráveis.  Por quê?  Porque um sistema de saúde estatal tem de fornecer serviços de saúde para toda uma nação sem o auxílio de genuínos preços de mercado e, consequentemente, sem poder calcular corretamente seus lucros e prejuízos.  Gostem ou não, são estas as ferramentas capitalistas que permitem que o setor privado tome decisões corretas e fundamentadas sobre quais são os melhores recursos a serem utilizados — 'corretas e fundamentadas' porque refletem as preferências e desejos dos clientes, os consumidores.
Não obstante o poderoso apelo sentimental gerado por um sistema público de saúde e seu superficialmente atraente lema de fornecer serviços de saúde "gratuitos" (algo que obviamente não é verdade para a maioria dos cidadãos), as fundamentais deficiências de qualquer serviço organizado segundo moldes socialistas já deveriam estar patentemente óbvias para qualquer um: ao passo que o setor de telefonia celular — empreendimento privado que, na maioria dos países, ainda é relativamente pouco regulado — fornece as últimas novidades em tecnologia para todas as pessoas distribuídas ao longo de todo o espectro social a uma velocidade notável e a preços declinantes, a burocracia estatal dos serviços de saúde faz com que as pessoas tenham de esperar em longas filas até mesmo para procedimentos básicos e de rotina; e, pior ainda, fornecem tais serviços lastimáveis a custos espantosamente crescentes para os pagadores de impostos.
Que serviços de saúde e de educação sejam considerados importantes demais para serem deixados a cargo do mercado privado é um clichê que inverte completamente a lógica econômica: é justamente por serem muito importantes é que deveriam ser entregues aos auspícios do mercado privado.
Mas, e quanto àquelas pessoas que são pobres demais ou que por qualquer motivo são incapazes de obter a renda necessária para garantirem a si próprias até mesmo um mínimo destes serviços?  Não irei me esquivar desta pergunta.  Voltarei a ela daqui a pouco.
Até agora, qual a implicação de toda esta argumentação para o tamanho e a função do estado?  O estado seria, é claro, muito pequeno para os padrões de hoje.  Ele teria apenas uma função: proteger a propriedade privada, a qual inclui necessariamente a propriedade sobre nós mesmos.  O papel do estado seria o de proteger cada indivíduo e sua propriedade contra agressões, seja tal agressão originada dentro do país ou fora do país.  O estado seria reduzido àquilo que os social-democratas alemães do final do século XIX pejorativamente, mas ainda assim corretamente, chamavam de "estado vigia noturno".  O estado forneceria serviços de segurança, incluindo-se aí polícia, exército, tribunais e outros serviços relacionados.  Sua única função seria fornecer segurança e proteção.  Aqueles cidadãos que não violassem a propriedade ou a pessoa de outros indivíduos, ou que não fossem igualmente agredidos, muito dificilmente teriam qualquer contato com o estado e seus representantes.  Seria de fato um estado mínimo.
Até aqui os argumentos foram feitos tendo por base considerações utilitaristas.  Uma sociedade próspera requer um alto grau de divisão do trabalho e um eficiente uso de recursos (naturalmente escassos), o que por sua vez requer preços de mercado, o que por sua vez requer propriedade privada.  Sob o utilitarismo, a propriedade privada é acima de tudo uma convenção social, um meio para se atingir um fim.  E a função do estado é assegurar este meio: a propriedade privada, a existência de um domínio privado inviolável para todo e qualquer indivíduo, é a base para a cooperação voluntária contratual e para o crescimento espontâneo da sociedade.
Argumentos éticos para o estado estritamente limitado
Este estado mínimo pode, no entanto, também ser erigido sobre bases éticas e seguindo considerações de justiça.  Todo estado é uma instituição que se baseia na compulsão e na coerção.  O estado pode ser visto como uma instituição que detém o monopólio legitimado, institucionalizado e regulado da violência ou da ameaça do uso da violência.  No entanto, qual tipo de violência é eticamente defensável e que, portanto, pode servir de fundamento aceitável para justificar a violência institucionalizada?  Apenas a violência defensiva satisfaz este requisito.
Para responder a perguntas sobre ética é necessário começar considerando o indivíduo que age.  Em uma sociedade normalmente pacífica e cooperativa, a partir de que ponto estaria eu justificado a utilizar de violência ou ameaçar utilizar de violência contra outras pessoas?  Apenas se e quando estas pessoas ameaçassem minha vida, minha saúde ou minha propriedade.  Isto não significa que qualquer tipo de resposta violenta seria justificável em tais situações; porém, resta óbvio que, se a força e a violência podem ser justificadas, elas somente o serão em situações de autodefesa, as quais incluem a defesa da propriedade.  Se posso justificadamente me defender de um ataque, também tenho de poder defender aqueles bens materiais que adquiri por meio do meu trabalho honesto, no qual utilizei meu próprio corpo e minha própria mente.  Caso contrário, caso outros indivíduos tivessem a permissão de se servirem livremente dos frutos do meu trabalho, simplesmente tomando-os de mim quando quisessem, isso significaria que eles poderiam viver totalmente à custa do meu trabalho e, com isso, praticamente me escravizarem, o que seria o equivalente a um ataque à minha pessoa.
Ao se transferir o direito individual à autoproteção e à autodefesa da vida e da propriedade a uma organização especializada com a missão de zelar igualitariamente por esses direitos de todos os membros da sociedade, nenhum novo direito foi criado.  Não se está dando ao estado nenhum direito ou poder que o próprio indivíduo já não possua.  Com efeito, a força legitimada do estado teria sua origem em um conceito de direitos naturais que se originam do indivíduo e os quais o indivíduo teria mesmo em uma sociedade sem estado (embora em tal sociedade ele teria de impingir estes direitos por conta própria ou por meio de uma cooperação voluntária com outros).  O estado talvez possa ser visto como um agrupamento destes direitos individuais com o intuito de gerar a mais organizada e padronizada — e, portanto, mais previsível — proteção.
O argumento utilitarista contra o estado assistencialista
Podemos agora abordar a questão da oferta de serviços para indivíduos pobres ou para aqueles que por algum motivo sejam incapazes de adequadamente se sustentarem.  Embora possam ser feitos bons argumentos afirmando que aqueles indivíduos mais abonados têm a obrigação moral de auxiliar os membros mais frágeis da sociedade, tal raciocínio deixa claro que o estado não deve forçar e impingir tais auxílios.  Repetindo: o estado é uma organização que opera por meio da compulsão e da coerção.  Ao assumir responsabilidades 'sociais', o estado terá de redistribuir renda e propriedade de maneira contínua, sempre recorrendo à força ou à ameaça de força, desta forma incorrendo em permanente violação de sua missão original, a qual era proteger a propriedade honestamente adquirida contra qualquer interferência violenta.  Dado que a função do estado é justamente defender a instituição da propriedade privada — a qual identificamos como sendo absolutamente essencial para qualquer sociedade civilizada —, uma função social, que exige redistribuição de renda e propriedade, estaria em flagrante contradição com sua missão precípua.  O estado não pode simplesmente acrescentar uma função redistributiva à sua função de proteção da propriedade — a primeira sempre irá violar a última.  Ambas as função estão em conflito lógico.  Ou o estado é um protetor da propriedade ou ele é um redistribuidor e realocador de propriedade.  Ele não pode ser ambos ao mesmo tempo.
No conceito original do estado, em que sua função é atuar como força organizada para o fornecimento de segurança, um indivíduo que honestamente obteve sua propriedade por meio da produção ou de trocas voluntárias com outros membros da sociedade deveria poder confiar no estado para que este protegesse sua propriedade de qualquer violação perpetrada por terceiros.  Porém, no momento em que o estado assume a responsabilidade da 'justiça social' ou da 'justiça redistributiva', ele acabou de se tornar ele próprio um violador da propriedade privada, de modo que todo e qualquer indivíduo deve agora temer que partes da sua renda e da sua propriedade — embora legalmente obtidas — sejam confiscadas à força pelo estado e realocadas para outros membros da sociedade.
Resta claro que, sob um estado que assume responsabilidades 'sociais', qualquer direito de propriedade se torna totalmente condicional.  Os direitos de propriedade serão protegidos pelo estado somente enquanto ele não considerar que há outras pessoas mais necessitadas e mais moralmente dignas de serem as proprietárias da propriedade em questão.  Cada fatia de propriedade em tal sociedade estará, portanto, sob uma nuvem de incerteza, e isso está em total contradição com a missão original do estado.  O elemento incerteza é amplificado pelo fato de que, embora seja possível especificar regras claras e universais sobre como a propriedade pode ser honesta e legalmente adquirida — desta forma fornecendo a cada membro da sociedade regras claras, conhecidasantes do ato de produção e comércio, sobre o que constitui obtenção correta e o que constitui obtenção ilícita de propriedade —, qualquer noção explicitada após o ato de produção e comércio sobre o que constitui 'justiça distributiva' será necessariamente arbitrária e estará sujeita a consideráveis mudanças ao longo do tempo.
Não é nada surpreendente que todos os estados tenham expandido enormemente a variedade e a amplitude de políticas redistributivas, legislações sociais e regulamentações ao longo das últimas décadas.  Uma vez que o estado se encarregou de buscar o logicamente indefinível objetivo da igualdade e da justiça social, ele passou a exigir poderes cada vez mais amplos.  A consequência é que a ideia de um estado mínimo já se tornou hoje completamente irrealista.
Em contrapartida, qualquer redistribuição de propriedade ou de renda por meio de atos de caridade não apresenta conflito algum com a instituição da propriedade privada.  O doador e o recebedor da caridade sabem quem é o proprietário de direito da propriedade doada.  O recebedor está ciente de que ele está sendo sustentado pela generosidade de outros.  O doador também decide quem ele quer ajudar e até que ponto ele quer ajudar tal pessoa.  Tudo isso muda quando o estado, detendo o monopólio legal da coerção, se torna o intermediário.  O recebedor não mais se considera dependente do sucesso econômico e da caridade de outros.  Ao contrário: ele agora reivindica o 'direito' de ser sustentado pelo estado — receber auxílios se torna um direito legalmente exigível pela pessoa.  Tendo agora pelo menos uma renda mínima garantida, os incentivos para que esta pessoa mude seu comportamento e readquira independência econômica são diluídos.  Enquanto isso, o proprietário original da propriedade não mais controla para onde seu dinheiro vai, e provavelmente irá perder qualquer interesse pela situação dolorosa daqueles que necessitam de auxílios.  Uma vez que ele já foi tributado pelo estado, ele considera que todos os seus deveres morais para com os membros mais fracos da sociedade já estão devidamente cumpridos.
Os defensores do estado assistencialista irão argumentar que é mais justo introduzir um elemento de incerteza nas vidas dos indivíduos economicamente independentes do que manter os membros mais frágeis da sociedade sujeitos à completa incerteza que a pobreza e a dependência da caridade inevitavelmente acarretam.  Embora este seja um argumento emocionalmente atraente — e provavelmente seja um sentimento amplamente compartilhado —, ele não dispersa a questão do conflito fundamental entre a proteção da propriedade privada e a persistente redistribuição da propriedade privada. 
Um estado assistencialista é, fundamental e conceitualmente, uma ameaça persistente à noção de propriedade privada; e a propriedade privada é inegavelmente a fundação econômica de qualquer sociedade.  Adicionalmente, qualquer conceito de 'justiça social' é, por definição, arbitrário e será fonte de enormes conflitos sempre que for utilizado para nortear políticas práticas.  No que mais, um estado que se preocupe com a distribuição de renda e de propriedade entre seus cidadãos jamais será um estado pequeno, ou mesmo limitado.
O argumento ético contra o estado assistencialista
Até aqui, o argumento se baseou em considerações utilitaristas.  Mas podemos também baseá-lo em teorias sobre ética e justiça.  Já foi argumentado que um estado que se restringe à proteção da pessoa e da propriedade de seus cidadãos contra atos espontâneos de agressão baseia este seu direito à legítima força nos direitos que os membros individuais desta sociedade têm de utilizar esta mesma força.  O estado não assume nenhuma posição privilegiada; ele simplesmente exerce os direitos que cada cidadão individual já possui, mas que considera ser mais bem assegurado e exercido por uma organização estatal.  Esta visão, no entanto, deixa de ser defensável quando o estado implementa a redistribuição da renda e da propriedade.
Embora possamos dizer que, em termos de princípios de justiça, seja amplamente aceito que eu utilize de violência em medidas proporcionais para impedir que meu vizinho roube ou danifique minha propriedade, ou que ele inflija lesões a mim ou a qualquer membro da minha família, certamente será algo que estará fora das estabelecidas normas de justiça caso eu decida forçar meu vizinho a sustentar terceiros, escolhidos por mim, os quais eu julgo serem dignos da caridade deste meu vizinho.  Ao fazer da 'justiça social' o seu objetivo, o estado reivindica o direito ao uso de uma força que nenhum outro indivíduo possui.  O estado agora se tornou uma lei própria, uma entidade 'superior e suprema' cujos padrões de certo e errado não mais correspondem aos dos cidadãos da sociedade.  Qualquer noção de que o estado poderia simplesmente representar um agrupamento conveniente e eficiente dos direitos individuais dos cidadãos, com o único propósito de melhor organizar e padronizar sua proteção, se torna insustentável.  O estado pode fazer e faz o que ninguém mais fora do estado pode fazer.  O estado, enquanto estado, define suas próprias noções de moralidade e as impõe forçosamente sobre seus cidadãos.
Até agora, explicamos por que um estado que assume responsabilidades maiores do que aquelas preconizadas por um estado mínimo — a saber, articular, esclarecer e proteger os direitos de seus cidadãos à sua vida e propriedade — incorre em inevitável violação do direito de seus cidadãos à vida e à propriedade, e não mais poderá justificar sua existência tomando por base qualquer tipo de 'contrato social', uma vez que tal contrato pode abranger somente aqueles direitos que os indivíduos já possuem, e os quais eles podem voluntariamente transferir para o estado caso tenham aceitado tal contrato.  Vimos também que um estado que se envolve na distribuição de renda e de propriedade entre seus cidadãos irá inevitavelmente solapar a instituição da propriedade privada, a qual é essencial para a cooperação humana em uma economia de mercado e é a base para qualquer sociedade próspera.
Do liberalismo clássico ao anarco-libertarianismo
Embora tal estado mínimo — um puro protetor da vida e da propriedade de seus cidadãos, um executor das leis e um provedor de tribunais para facilitar a resolução de conflitos — seja um melhor garantidor da liberdade individual e da cooperação pacífica do que o estado pesadamente intervencionista e crescentemente autoritário de hoje, e embora a maioria dos libertários ficasse feliz de ver um retorno a esta visão liberal clássica do estado mínimo, mesmo este conceito ainda continuará extremamente falho enquanto a organização que se autodenomina estado reivindicar o monopólio territorial do fornecimento de serviços de proteção e segurança e o monopólio da tomada suprema de decisões dentro deste território (esta é, na realidade, uma ótima definição do estado feita por Hans-Hermann Hoppe). 
Se o estado não apenas utiliza a violência legitimada para proteger a vida e a propriedade de seus cidadãos, mas também — como presentemente o fazem todos os estados — utiliza a força para impedir que os cidadãos abdiquem voluntariamente das estruturas do estado e estabeleçam ou se juntem a diferentes e concorrentes arranjos dentro deste mesmo território, então temos também de rejeitar este estado mínimo com base na análise acima.
Primeiro, novamente, as considerações utilitaristas.  Fornecer serviços de segurança também requer o uso de recursos escassos.  Quantos recursos devem ser alocados para o fornecimento de segurança, quais recursos devem ser utilizados e em que grau, são questões essenciais.  Sem propriedade privada, preços de mercado e liberdade de entrada no mercado da oferta de segurança, os resultados serão, como explicado, longe do ótimo.  Mesmo na área da oferta de segurança, soluções de mercado são indubitavelmente superiores.  Este importante argumento foi inicialmente desenvolvido pelo economista belga do século XIX, Gustave de Molinari.
Segundo, temos considerações de ética e de justiça.  Se o estado alega que sua legitimidade do uso da força advém do direito do cidadão de utilizar a força para defender sua própria vida e propriedade, isto significa que os direitos do indivíduo são a origem dos direitos do estado, e que este último jamais pode substituir o primeiro.  Colocando de maneira diferente, um estado que reivindica o monopólio territorial da oferta de segurança e da resolução de conflitos tem de argumentar que o indivíduo que tinha o direito de utilizar de violência para defender a vida e a propriedade decidiu, ao entregar estes direitos a uma organização estatal, abrir mão destes direitos para sempre, e que ele não mais pode recuperar estes direitos e aplicá-los por meios alternativos.  Esta, logicamente, é uma posição insustentável.
Parece correto assumir que as leis e a oferta de segurança têm muito em comum com o dinheiro no sentido de que elas, também, estão sujeitas a efeitos de rede.  Assim como a coexistência de várias moedas paralelas é algo sub-ótimo, a coexistência de várias estruturas legais e de vários arranjos de segurança também é ineficiente.  Porém, isso não significa que indivíduos não possuam o direito de criar arranjos alternativos caso julguem que os arranjos atuais sejam insuficientes ou até mesmo uma ameaça para suas próprias vidas e propriedades.  Podemos concluir que, no mínimo, o estado mínimo deve reconhecer o direito universal e inviolável de cada indivíduo ou grupo de indivíduos de se separar a qualquer momento do monopólio estatal.
Muito do que argumentei acima pode parecer uma fútil teoria libertária com pouca relevância para a atual realidade política.  Porém, uma crise do atual sistema de papel-moeda fiduciário de curso forçado já se tornou inevitável.  Esta crise faz parte de uma crise mais ampla, que é a crise do estado de bem-estar social e, com efeito, da própria democracia.  À medida que estas crises vão se desdobrando, as pessoas irão novamente revisitar algumas questões fundamentais sobre o tamanho e o papel do estado e sua relação com o indivíduo.  Sob esta perspectiva, discussões como esta poderão se tornar de fato muito relevantes.  À medida que os estados ao redor do mundo forem quebrando, à medida que as promessas de assistencialismo estatal do berço ao túmulo forem sendo descumpridas, e à medida que os políticos forem perdendo o controle sobre seus impérios construídos com dinheiro de papel, os cidadãos irão considerar novas e mais adequadas alternativas aos atuais aparatos estatais.
Finalizarei este ensaio com um pequeno excerto do sensacional panfleto No Treason, NO II, de Lysander Spooner, escrito em 1867, no qual ele faz uma fascinante interpretação da constituição americana e que é uma excelente apresentação dos pontos que tentei abordar ao final da análise acima.  Eis Spooner:
A Constituição diz:
Nós, o povo dos Estados Unidos, com o intuito de formar uma união mais perfeita, estabelecer a justiça, garantir a tranquilidade doméstica, prover a defesa comum, promover o bem-estar geral e garantir as bênçãos da liberdade para nós mesmos e para nossa posteridade, ordenamos e estabelecemos esta Constituição para os Estados Unidos da América.
O significado disto é simplesmente: Nós, o povo, agindo livremente e voluntariamente como indivíduos, consentimos e concordamos que iremos cooperar mutuamente para sustentar o governo na forma como ele foi descrito nesta Constituição.
A necessidade do consentimento do "povo" está implícita nesta declaração.  Toda a autoridade da Constituição depende disto.  Se o povo não consentir, ela não terá validade.  É claro que ela só teve validade entre aqueles que de fato consentiram com ela.  Nenhum consentimento poderia ser presumido para um indivíduo sem que ele de fato o expressasse, assim como ocorre com qualquer outro contrato que envolva o pagamento de dinheiro ou a prestação de algum serviço.  E para tornar a constituição vinculante sobre qualquer indivíduo, sua assinatura, ou outra evidência positiva de consentimento, era tão necessária quanto no caso de qualquer outro contrato.  Se o instrumento tinha a intenção de dizer que qualquer indivíduo que pertencesse ao "povo dos Estados Unidos" estaria vinculado a ele, sem ter seu consentimento, isto seria uma usurpação e uma mentira.  O máximo que pode ser inferido da frase "Nós, o povo" é que tal documento oferecia filiação para todo "o povo dos Estados Unidos", deixando para os indivíduos a opção de aceitar ou recusar, como bem entendessem.
O acordo é simples, como qualquer outro acordo.  É o mesmo que um acordo que diga: Nós, o povo da cidade X, concordamos em manter uma igreja, uma escola, um hospital, ou um teatro, para nós mesmos e para nossos filhos.
Tal acordo claramente só teria validade entre aqueles que de fato consentiram com ele.  Se apenas uma fatia do "povo da cidade X" consentisse com este contrato, e daí obrigassem aqueles indivíduos que não consentiram a contribuir com dinheiro ou com serviços, tais pessoas seriam meros assaltantes, e mereceriam ser tratadas como tal.
Nem a conduta e nem os direitos destes signatários seriam aprimorados caso eles virassem para os dissidentes e dissessem: "Oferecemos a vocês direitos iguais aos nossos em relação aos benefícios da igreja, da escola, do hospital ou do teatro que propomos construir, e um igual poder de controle sobre tal instituição".  Seria uma resposta suficiente caso os outros dissessem: "Não queremos nenhuma participação nos benefícios, e nenhum controle sobre sua instituição; e não faremos nada para sustentá-la."

Detlev Schlichter é formado em administração e economia.  Trabalhou 19 anos no mercado financeiro, como corretor de derivativos e, mais tarde, como gerente de portfolio.  Nesse meio tempo, conheceu a Escola Austríaca de Economia e, desde então, dedicou seus últimos 20 anos ao estudo autônomo da mesma.  Foi apenas após conhecer a Escola Austríaca que ele percebeu o quão mais profundas e satisfatórias eram as teorias austríacas para explicar os fenômenos econômicos que ele observava diariamente em seu trabalho.  Visite seu website.

Tradução de Leandro Roque

Batalha pela fé dos índios



A famosa tela “A Primeira Missa no Brasil”(foto), de Vítor Meirelles (1832-1903), mostra que o colonizador português desde que aportou por aqui tentou catequizar os índios na doutrina católica. O invasor holandês no Nordeste, no século XVII, também se empenhou na conversão de índios ao protestantismo. É o que mostra um livro lançado nesta Bienal do Rio. “A primeira Igreja Protestante do Brasil: Igreja Reformada Potiguara” (1625-1692), da historiadora Jaquelini de Souza, editado pela Mackenzie, aborda essa experiência que resultou na primeira igreja evangélica indígena no mundo.

Veja só. Em 1625, holandeses numa frota aportaram na Baía da Traição, na Paraíba, antes de seguirem viagem para a Europa, e encontraram a tribo Potiguara. Treze índios dessa tribo foram levados para a Holanda. Pelo menos dois deles, Pedro Poty e Antonio Paraupaba, ficaram cinco anos por lá desfrutando a melhor educação formal do país. Os dois conheceram o protestantismo na Holanda, que não era tão xiita quanto os países puritanos, e foram evangelizados. Depois desse período, voltaram para a sua tribo no Brasil a fim de ensinar a doutrina e para serem mediadores culturais entre a tribo e a Holanda. Segundo Jaquelini, em 30 anos, a Holanda mandou para o Brasil 90 pastores: 

— Portugal também mandou padres, mas em número menor. Para se tornar protestante, o índio precisava estudar, entender e aceitar a doutrina. No catolicismo, os índios tinham apenas que ser batizados.

Mas, quando os holandeses foram expulsos do Brasil, todas as igrejas protestantes foram queimadas. Parte dos índios foi recatolizada. Pedro Poty foi capturado pelos portugueses durante a Batalha dos Guararapes. Preso em Pernambuco, ele foi torturado para renegar a sua fé. Não renegou e acabou morto. Ele, segundo Jaquelini de Souza, foi o primeiro latino-americano martirizado pela Igreja Católica

Laizer Fishenfeld, nosso correspondente no Jardim Botânico

FOTOGRAFIA


Laizer Fishenfeld: o fotógrafo de natureza, que colabora com a coluna de Ancelmo Gois
Por Maria Elisa Alves*
Aos 83 anos, não falta energia, muito menos paciência, a Laizer Fishenfeld. Todos os dias, ele chega bem cedo ao Jardim Botânico para se ajoelhar e curvar o corpo, ou, dependendo da situação, ficar em pé, imóvel, minutos a fio, sempre carregando peso. Penitência? Exercícios de contorcionismo? Nada disso. Laizer, um simpático senhor que veio do Rio Grande do Sul aos 19 anos, se esforça para capturar a beleza fugidia. É um fotógrafo de passarinhos.

O hobby surgiu há apenas oito anos, depois que ele acompanhou por uma semana uma coruja que fazia ninho na praia de Ipanema. Animado com o resultado das fotos — uma delas decora o corredor de sua cobertura no Leblon —, ele rumou para onde imaginou que encontraria uma variedade maior de aves, o Jardim Botânico. A dedicação diária — ele bate ponto nas aleias todos os dias, às 7h30m—, já garantiu frutos. No concurso de fotografias promovido pelo parque todos os anos, ele tirou o primeiro lugar nas três últimas edições.

Diretora de comunicação da Sociedade de Amigos do Jardim Botânico, Anamaria Giglio conta que a qualidade das fotos de Laizer é tão boa que já foi feita uma vez a categoria hour concours para ele. Se bobear, ele ganha sempre na categoria fauna. Às vezes, também na flora. E engana-se quem pensa que o concurso é fácil.

— No ano passado, ele ganhou flora e fauna. Eram mais de mil candidatos. As fotos dele, além de qualidade técnica e muita beleza, ajudam a preservar os pássaros do parque. Usamos as imagens em cartazes pedindo que não se alimente os animais, por exemplo — diz Anamaria.

O mais impressionante no trabalho de Laizer não é apenas o resultado das fotos, é o que há por trás delas: ele não enxerga nada de um olho por causa de um glaucoma mal tratado.

—Tenho muita dificuldade porque sou cego do olho direito. Não enxergo nada. Então tenho que olhar a cena com o olho esquerdo, botar a máquina no olho bom (sim, ele ainda usa o pequeno visor, que todos ignoram nas máquinas digitais), e torcer para que tudo dê certo.

Laizer também concorreu no concurso Talentos da Maturidade, mas não viu muita graça:

— Só podia mandar uma única foto. Mas já perdi a conta de quantas tenho, devem ser mais de cem mil. Na minha última viagem a Cachoeiras do Macacu, voltei com mais de três mil. Como escolher uma só?

Laizer armazena seus milhares de fotos em sete HDs externos, em DVDs e, por que não?, em velhos álbuns. Para ele, apostar na tecnologia é divertido, mas ver as fotos impressas é mais prazeroso.

— Aprendi a usar o photoshop, mas só faço ajustes normais. Não tiro galho da frente do passarinho, só mexo na intensidade da luz — diz ele, que carrega sempre três câmeras e é modesto. — Considero a câmara como um carro de Fórmula-1. Os mecânicos ajustam os pneus durante a corrida, verificam os freios, mas não sabem qual será o resultado. Nem sempre tudo sai direito. Com a foto é a mesma coisa. Nunca sei o resultado, depende do sol, do local, são muitas as nuances — diz Laizer, que só gosta de ver o que fotografou quando chega em casa.

Laizer já se tornou conhecido dos frequentadores do Jardim Botânico e dos leitores do GLOBO. Quando consegue uma imagem bonita, Laizer as manda por e-mail para o colunista Ancelmo Gois, que volta e meia publica uma das fotos. A última foi de um tucano de bico preto. Com equipamento profissional, bom enquadramento e muita sorte, Laizer registrou o momento em que a ave se alimentava. Na sequência de fotos, é possível ver o tucano pegando um fruto vermelho para depois equilibrá-lo entre o bico.

— Eu sempre faço fotos de aves soltas na natureza. Esta semana, recebi uma carta de uma moça dizendo que o que mais a entristece é ver passarinho em gaiola. Ela pediu para eu registrar alguma ave presa e mandar para o jornal para tentar começar uma campanha pela liberdade de todas.

*Maria Elisa Alves é repórter da editoria Rio do GLOBO, onde foi publicada a reportagem

Como evitar que o crescimento volte a ficar fraco e a inflação alta

Míriam Leitão - 
PROGRAMA NA GLOBONEWS


A boa notícia do crescimento forte do segundo trimestre dá novo ânimo, porém o Brasil tem crescido pouco durante muito tempo e está com inflação em torno de 6% por vários anos. Inflação alta e baixo crescimento é o que os economistas chamam de estagflação. Como evitar essa situação foi o tema que discuti no programa da semana passada na Globonews com Margarida Gutierrez, professora do Coppead/UFRJ; e com Fernando Rocha, economista e sócio da JGP Gestão de Recursos.
A alta da Selic para 9% é o remédio contra a inflação, mas pode enfraquecer mais a economia, já fraca, apesar do bom número do PIB do segundo trimestre. A grande questão é: como ficar com o efeito bom do "remédio" (combater a inflação) sem a parte ruim, de redução do crescimento?
Para a professora da UFRJ, as perspectivas de crescimento para a economia estão muito dependentes do sucesso do programa de concessões, que poderá mudar a cara do país, segundo ela. Margarida diz que a economia vem dando sinais de esgotamento desde 2011 e deve crescer pouco este ano.
Fernando concorda com a economista em relação ao crescimento de 2013, que deve ser baixo, por causa da reduzida capacidade de oferta da economia, dos investimentos aquém do considerado necessário, independentemente do que o BC faça. Ele acha que o governo, nos últimos anos, tolerou uma inflação mais alta.
O economista vê com otimismo e um pouco de ceticismo os leilões de concessões, porque o governo "se enrola" na questão das regras. Ele comentou também sobre os riscos regulatórios, as mudança nas regras, a taxa de retorno dos investimentos.
A alta do dólar e as razões internas para a desvalorização maior do real foram outro tema abordado.
Para os economistas, como a bandeira do governo é a redução dos juros, o BC demorou para elevá-los, mas Margarida prevê, por exemplo, que a autoridade monetária atuará firme agora no combate à inflação, "jogando pesado", ainda mais levando-se em conta que há a questão do câmbio a enfrentar. Já Fernando acha que o BC não será tão rigoroso - os juros subiriam até certo ponto, mas não tanto como deveriam - para trazer a inflação para menos do que foi no ano passado.
Na avaliação de Margarida, o Ministério da Fazenda, com uma política fiscal expansionista; e o BC, com a difícil tarefa de controlar a inflação, estão em direções opostas. A política de gastos do governo está atrapalhando a missão do BC, segundo ela, ao não colaborar para a queda da inflação.
Eles mostraram que tem muito erro sendo cometido na política econômica, que pesa, por exemplo, no crescimento econômico.

Vejam aqui a entrevista na íntegra:

Los médicos

LUIZ GARCIA


O programa Mais Médicos não pode ser condenado pelo nome. Ninguém deveria ser contra uma iniciativa que aumente o atendimento aos doentes brasileiros. 
Mas é compreensível a irritação dos nossos doutores com a importação, pelo Ministério da Saúde, de profissionais, quase todos cubanos, provocando nos profissionais brasileiros a desconfiança, ou mesmo a certeza, de que o governo não os considera capazes de cuidar da saúde do nosso povo. 
Mesmo assim, não é possível aplaudir as vaias e insultos contra os médicos estrangeiros que estão sendo treinados em Fortaleza esta semana. O sindicato local dos profissionais brasileiros, responsável pela manifestação, afirmou que o protesto era apenas contra o Ministério da Saúde, O que pode ser verdade — mas vaia não tem rótulo, e os profissionais importados, todos cubanos, têm direito a se sentirem injustamente insultados. 
E a opinião pública talvez esteja solidária com eles. Ela certamente quer mais médicos no país — desde, é claro, que o Ministério da Saúde não se esqueça de providenciar intérpretes em quantidade e qualidade adequadas. 
Outra providência oficial obviamente necessária é um diálogo inteligente com os profissionais brasileiros. Não será acusando-os de xenofobia — como fez o ministro da Saúde, Alexandre Padilha — que se resolverá o problema. Inclusive porque os médicos brasileiros insistem em afirmar que seu protesto não era contra os estrangeiros, e sim contra o Ministério da Saúde. Segundo o presidente do Sindicato dos Médicos do Ceará, José Maria Pontes, ninguém vaiou os cubanos: o alvo era apenas o Ministério da Saúde. Mas é óbvio que os estrangeiros se sentiram atingidos pela reação dos colegas brasileiros à sua presença. 
Parece ser uma boa ideia a sugestão dos brasileiros de que os seus colegas estrangeiros sejam submetido ao Revalida, que é um exame nacional de validação do diploma dos médicos. E ninguém falou nisso, mas é obviamente necessário resolver o problema do idioma. 
No fim das contas, é obviamente necessário aumentar e melhorar o atendimento aos nossos doentes — principalmente no interior do país. Desde, é claro, que o paciente e o médico entendam claramente o que um e outro estão dizendo.
"A opinião pública talvez esteja solidária com eles. Ela certamente quer mais médicos no país".
Publicado no Globo de hoje.

Molina é retirado de Brasília para evitar politização do caso


Renata Giraldi, Agência Brasil
Na tentativa de evitar a politização do caso, o advogado de defesa do senador boliviano Roger Pinto Molina (foto abaixo), de 53 anos, tirou o parlamentar de Brasília. Molina está desde este fim de semana em uma fazenda em Goiás, nos arredores da capital federal, e deverá ficar lá até que o governo brasileiro defina a sua situação. O advogado Fernando Tibúrcio Peña disse à Agência Brasil que o “esforço agora” é para manter a discussão em nível técnico e jurídico.
“O senador está bem de saúde e confiante que em breve a situação dele de asilado político será definida pelo governo brasileiro. Ele quer que seus direitos de asilado sejam garantidos”, disse Tibúrcio. “Mas o que nos preocupa, e por isso ele ficará fora de Brasília por alguns dias, é a politização do caso, que pode atrapalhar o debate técnico e jurídico.”

Brasília – Na tentativa de evitar a politização do caso, o advogado de defesa do senador boliviano Roger Pinto Molina, de 53 anos, tirou o parlamentar de Brasília. Molina está desde este fim de semana em uma fazenda em Goiás, nos arredores da capital federal, e deverá ficar lá até que o governo brasileiro defina a sua situação. O advogado Fernando Tibúrcio Peña disse à Agência Brasil que o “esforço agora” é para manter a discussão em nível técnico e jurídico.
“O senador está bem de saúde e confiante que em breve a situação dele de asilado político será definida pelo governo brasileiro. Ele quer que seus direitos de asilado sejam garantidos”, disse Tibúrcio. “Mas o que nos preocupa, e por isso ele ficará fora de Brasília por alguns dias, é a politização do caso, que pode atrapalhar o debate técnico e jurídico.”
O advogado lembrou que no Artigo 6º da Convenção sobre Asilo Territorial de 1954, assinada pelo Brasil, é preservado ao asilado garantir sua liberdade, inclusive de expressão e de ir e vir. No artigo, o asilado é tratado como “indivíduo [que] é perseguido”. Para Tibúrcio, é o caso de Pinto Molina, que alega sofrer ameaças das autoridades bolivianas.
Tibúrcio acrescentou que a expectativa é que nos próximos dias o governo defina o status de refugiado e conceda oficialmente o asilo político a Pinto Molina. Em seguida, segundo o advogado, o parlamentar pretende ir até o Acre, onde estão sua mulher e filhas. “Ele fala bastante em rever a família, pois faz mais de um ano que não a encontra.”
Há uma semana, Pinto Molina deixou a Embaixada do Brasil na Bolívia, onde ficou por 455 dias. A retirada do senador da embaixada pelo encarregado de Negócios (equivalente a embaixador provisório) do Brasil na Bolívia, Eduardo Saboia, desencadeou uma crise política, levando à substituição do então chanceler Antonio Patriota por Luiz Alberto Figueiredo Machado.
Saboia assumiu a responsabilidade de conduzir a retirada do boliviano. Porém, para setores do governo, como a decisão foi tomada aparentemente de forma pessoal, houve quebra de hierarquia. Paralelamente, o governo do presidente boliviano, Evo Morales, trata Pinto Molina como suspeito em mais de 20 crimes envolvendo corrupção e desvio de recursos públicos.
Em entrevista à Agência Brasil, o senador boliviano negou envolvimento nos crimes financeiros e disse ser um “perseguido político”, por defender o direito de a oposição ter voz na Bolívia. Para as autoridades bolivianas, a saída de Pinto Molina do país foi uma fuga.
Morales pediu a “devolução” de Pinto Molina. O Ministério das Relações Exteriores informou hoje (1º) àAgência Brasil que, até o momento, não recebeu documento algum do governo da Bolívia requisitando o envio do parlamentar. O senador ficou até a última sexta-feira (30) temporariamente em Brasília, na casa do advogado dele, no Lago Norte, um bairro nobre da cidade.
Edição: Graça Adjuto

Brasileiro Roberto Azevêdo assume direção-geral da OMC

ECONOMIA


G1
O brasileiro Roberto Azevêdo (foto abaixo) assumiu neste domingo (1º) a direção-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o órgão máximo do comércio internacional. Ele é o sexto diretor-geral da organização e ficará no cargo por quatro anos. Ele foi escolhido para a função em maio deste ano.
O principal desafio de Azevêdo será desbloquear as negociações da Rodada do Desenvolvimento de Doha para liberalizar o comércio mundial, lançadas em 2001 e estagnadas há anos.
De acordo com comunicado da OMC, o conselho geral da organização fará um encontro especial no dia 9 de setembro para dar as boas-vindas a Azevêdo e ouvir ao seu discurso inaugural.

 O brasileiro Roberto Azevêdo assumiu neste domingo (1º) a direção-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o órgão máximo do comércio internacional. Ele é o sexto diretor-geral da organização e ficará no cargo por quatro anos. Ele foi escolhido para a função em maio deste ano.
O principal desafio de Azevêdo será desbloquear as negociações da Rodada do Desenvolvimento de Doha para liberalizar o comércio mundial, lançadas em 2001 e estagnadas há anos.
De acordo com comunicado da OMC, o conselho geral da organização fará um encontro especial no dia 9 de setembro para dar as boas-vindas a Azevêdo e ouvir ao seu discurso inaugural. 
A primeira aparição internacional de Azevêdo como diretor-geral da OMC será na reunião dos líderes do G20 em São Petersburgo, entre 5 e 7 de setembro, diz a organização.

Ao final do evento, será anunciada a intensificação dos trabalhos preparativos para a próxima reunião ministerial, que será realizada em Bali de 3 a 6 de dezembro, e é vista como decisiva para o futuro da OMC. “Um encontro de sucesso em Bali proporcionará um tiro no braço necessário para a economia global e para a OMC”, disse Azevêdo, em sua mensagem de boas-vindas.

“Eu acredito que um acordo pode ser alcançado, apesar do pouco tempo que temos entre hoje e Bali. Eu farei tudo o que posso para que o acordo seja alcançado. Mas não existe tal coisa como uma coisa certa, e uma grande quantidade de trabalho e compromisso são necessários nas próximas semanas, se quisermos ter sucesso”, afirmou.

Diplomata de carreira, Azevêdo tem 55 anos, Azevêdo nasceu em Salvador e é formado em Engenharia Elétrica pela Universidade de Brasília (UNB). Ele trabalhava no Itamaraty desde 1983. Especialista em comércio internacional, desde 2008 ele era o representante do Brasil na OMC e atuava como "negociador-chave".
Antes, ocupou diversos cargos relacionados a assuntos econômicos no Ministério das Relações Exteriores, tendo atuado em contenciosos como os casos de Subsídios ao Algodão (iniciado pelo Brasil contra os Estados Unidos), Subsídios à Exportação de Açúcar (iniciado pelo Brasil contra as Comunidades Europeias) e Medidas que Afetam a Importação de Pneus Reformados (litígio iniciado pelas Comunidades Europeias), além de chefiar a delegação brasileira na Rodada Doha.
Boa parte de seus argumentos de campanha se basearam em seu profundo conhecimento da organização, de seus mecanismos, potencialidades e de conhecer por dentro os delicados 'equilíbrios de poder' da OMC.

Documentos da NSA apontam Dilma Rousseff como alvo de espionagem G1


Documentos classificados como ultrassecretos, que fazem parte de uma apresentação interna da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês) dos Estados Unidos, obtidos com exclusividade pelo Fantástico, mostram a presidente Dilma Roussef, e o que seriam seus principais assessores, como alvo direto de espionagem da NSA. Um código indica isso.
O jornalista Glenn Greenwald, coautor desta reportagem, foi quem recebeu os papéis das mãos de Edward Snowden - o ex-analista da NSA que deixou os EUA com documentos da agência com a intenção de divulgar o sistema de espionagem americano no mundo. Glenn afirmou que recebeu o documento na primeira semana de junho, quando esteve com Snowden em Hong Kong. “Ele me deu esses documentos com todos os outros documentos no pacote original.”


Papéis 'ultrassecretos' foram obtidos com exclusividade pelo Fantástico.
Ministro diz que Brasil vai cobrar explicações formais dos Estados Unidos.


Documentos classificados como ultrassecretos, que fazem parte de uma apresentação interna da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês) dos Estados Unidos, obtidos com exclusividade pelo Fantástico, mostram a presidente Dilma Rousseff, e o que seriam seus principais assessores, como alvo direto de espionagem da NSA. Um código indica isso. O presidente do México, Enrique Peña Nieto, também foi um alvo, segundo os documentos.
A revelação foi feita em reportagem exclusiva exibida no Fantástico deste domingo, 1º (veja no vídeo acima).  Passo a passo, a reportagem de Sônia Bridi e Glenn Greenwald  mostra como o maior sistema de espionagem do mundo está de olho no Brasil e como a NSA consegue monitorar as comunicações no centro do poder, em Brasília, inclusive da presidente Dilma Rousseff.

O jornalista Glenn Greenwald foi quem recebeu os papéis das mãos de Edward Snowden - o ex-analista da NSA que deixou os EUA com documentos da agência com a intenção de divulgar o sistema de espionagem americano no mundo.
Glenn afirmou que recebeu o documento na primeira semana de junho, quando esteve com Snowden em Hong Kong. “Ele me deu esses documentos com todos os outros documentos no pacote original.”

O pacote tinha milhares de documento secretos. Glenn analisou esses papéis com Snowden durante uma semana em Hong Kong. Pouco depois, Snowden fugiu para a Rússia, onde passou 38 dias na área de trânsito do aeroporto de Moscou, até ter seu pedido de asilo aceito no país.

Durante a produção, a reportagem conversou com Snowden por um programa de bate-papo protegido contra espionagem. Escondido em algum ponto do território russo, ele disse que por exigência do governo local não pode comentar o conteúdo dos papéis, mas disse que acompanha a repercussão que os documentos estão tendo pelo mundo, inclusive no Brasil.

Fantástico: como é que a gente pode avaliar o documento e saber se foram operações que foram consumadas, e não apenas projetos?

“Ficou muito claro, com esses documentos, que a espionagem já foi feita, porque eles não estão discutindo isso só como alguma coisa que eles estão planejando. Eles estão festejando o sucesso da espionagem”, afirmou Glenn.

Os documentos mostram que foi feita espionagem de comunicações da presidente Dilma com seus principais assessores. Também é espionada a comunicação dos assessores entre eles e com terceiros.
A apresentação secreta se chama "filtragem inteligente de dados: estudo de caso México e Brasil." Segundo a apresentação, o programa possibilita encontrar, sempre que quiser, uma "agulha no palheiro."

O palheiro, no caso, é o volume imenso de dados a que a espionagem americana tem acesso todos os dias, espionando as redes de telefonia, internet, servidores de e-mail e redes sociais. A agulha é quem eles escolherem.

No documento, de junho de 2012, são dois alvos: o presidente do México, Enrique Peña Nieto, então candidato líder nas pesquisas para a presidência, e a presidente do Brasil, Dilma Rousseff.

Como funciona
Selecionado o alvo, são monitorados os números de telefone, os e-mails e o IP (a identificação do computador). É feito o mesmo para os interlocutores escolhidos - no caso, assessores.

O que eles chamam de um “pulo” é toda a comunicação entre o alvo e os assessores. Um “pulo e meio” é quando os assessores conversam entre eles. “Dois pulos” é quando eles conversam com outras pessoas.
Investigação de Peña Nieto
Para espionar o então candidato mexicano Peña Nieto, o serviço de segurança internacional da NSA para América Latina - fez uma ação intensiva. Para isso, usou dois programas - um deles é chamado "Mainway" e serve para coletar o grande volume de informações que passa pelas redes de comunicação.

As mensagens de texto por telefone do candidato também foram interceptadas, usando o programa "Association", que pega as informações que circulam nas redes sociais. Daí, as mensagens vão para outro filtro - o "Dishfire" - que busca por determinadas palavras-chave.
Sob o título "mensagens interessantes", está a prova de que o conteúdo das mensagens foi acessado. Dois trechos são citados. Num deles, Peña Nieto conta quem seriam alguns de seus ministros - que só tomariam posse seis meses depois da eleição.

Investigação da presidente Dilma
Na sequência, vem a explicação de como foi feita a espionagem da presidente Dilma. "Goal" é o objetivo da operação: "melhorar a compreensão dos métodos de comunicação e dos interlocutores da presidente do Brasil, Dilma Rousseff, e seus principais assessores".

O que eles chamam de "sementes" são os endereços eletrônicos e números de telefones monitorados.

Um dos programa usados pela NSA é chamado de "DNI selectors" - que segundo outro documento vazado por Snowden, captura tudo o que o usuário faz na internet, incluindo o conteúdo de e-mails e sites visitados.

Um gráfico mostra toda a rede de comunicações da presidente com seus assessores. No gráfico, cada bolinha representa uma pessoa.

A imagem ampliada mostra que legendas ou nomes de quem teve a comunicação interceptada foram apagados para a apresentação.

No documento, não há exemplos de mensagens ou ligações entre a presidente e seus ministros, como aconteceu quando o agora presidente do México foi mencionado.

Mas na última página o documento diz que o método de espionagem usado é "uma filtragem simples e eficiente que permite obter dados que não são disponíveis de outra forma. E que pode ser repetido." Se pode ser repetido, tudo indica que foi levado a cabo.

Conclui, ainda, dizendo que a união de dois setores da NSA teve sucesso contra alvos de alto escalão: Brasil e México. Alvos importantes, que sabem do perigo de espionagem e protegem sua comunicação. Novamente, se houve sucesso é porque foram exemplos reais.

Comunicações de brasileiros
No mês passado, uma reportagem do jornal “O Globo”, mostrada também no Fantástico, revelou, com documentos vazados por Snowden, que os EUA interceptam milhões de comunicações de brasileiros.

Na ocasião, o embaixador dos EUA no Brasil, Thomas Shannon, negou que e-mails e telefonemas de cidadãos brasileiros estivessem sendo espionados. Admitiu apenas que eram acessados os chamados metadados (o total de conexões, que passavam pelo Brasil).

Falta de clareza
Não está claro se a interceptação das ligações da presidente Dilma foi feita apenas com acesso às redes de comunicação, ou se houve participação de espiões em território brasileiro.

James Bramford, especialista que escreveu três livros sobre a NSA, falou com o Fantástico, em Washington. Ele diz que a NSA tem espiões nas embaixadas e consulados americanos pelo mundo.

“Temos uma grande embaixada em Brasília e um consulado no Rio de Janeiro. A NSA opera nesses prédios”, afirmou. Antenas nas embaixadas podem interceptar sinais de microondas e telefones celulares, disse Bramford.

Ainda em Hong Kong, quando se encontrou com Glenn Greenwald, Edward Snowden comentou os documentos que envolvem a espionagem à presidente Dilma.

Ele disse o seguinte: "a tática do governo americano desde o 11 de setembro é dizer que tudo é justificado pelo terrorismo, assustando o povo para que aceite essas medidas como necessárias. Mas a maior parte da espionagem que eles fazem não tem nada a ver comsegurança nacional, é para obter vantagens injustas sobre outras nações em suas indústrias e comércio em acordos econômicos".

No mês passado a revista “Época” publicou com exclusividade um documento comprovando que a espionagem americana é também comercial.

Trata-se de uma carta escrita pelo atual embaixador americano no Brasil, Thomas Shannon, em 2009, quando ainda era subsecretário de estado.

Ele agradece à NSA pelas informações repassadas à diplomacia americana antes da 5ª Cúpula das Américas - um encontro entre os chefes de estado do continente para discutir assuntos comerciais e diplomáticos da região.

Na carta, Thomas Shannon escreveu: "mais de 100 relatórios que recebemos da agência nos deram uma compreensão profunda dos planos e intenções dos outros participantes da cúpula e permitiram que nossos diplomatas estivessem bem preparados para aconselhar o presidente Obama em como lidar com questões controversas".

“Em questões comerciais, saber o que os outros estão pensando antes das reuniões multilaterais é como jogar pôquer sabendo quais as cartas de todos na mesa”, disse Bramford.

Outro documento obtido com exclusividade pelo Fantástico diz que uma divisão inteira da NSA é dedicada à política internacional e atividades comerciais, com um setor encarregado de países da Europa Ocidental, Japão, México e Brasil.
Um terceiro documento ultrassecreto enumera os desafios geopolíticos dos Estados Unidospara os anos de 2014 a 2019. O surgimento do Brasil e da Turquia no cenário global é classificado como risco para a estabilidade regional.

E o Brasil aparece de novo, junto com outros países, como uma dúvida no cenário diplomático americano: nosso país seria amigo, inimigo ou problema? Também são citados Egito, Índia, Irã, Turquia, México.

“Quando o país fica mais independente, mais forte, como o Brasil está (...), competindo com os Estados Unidos, empresas americanas. E por causa disso, o governo americano está pensando diferente sobre o Brasil”, afirmou Glenn.

Fantástico: por que Edward Snowden torna públicos esses documentos?

“Ele me disse: olha, eu acho que a privacidade do norte-americano é muito importante, mas também eu acho que o privacidade dos estrangeiros, das pessoas na América Latina, dos brasileiros, é muito importante também. A importância é igual. E eu não quero proteger somente a privacidade do norte-americano. Eu quero proteger a de todas as pessoas.”

Nesta semana, o jornal americano "Washington Post" publicou o orçamento secreto dos serviços de espionagem americanos, o equivalente a R$ 126 bilhões.

Reação do governo brasileiro
Neste domingo (1º), o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, se reuniu com a presidente Dilma Rousseff para discutir a reação as novas revelações de espionagem do governo americano. O governo brasileiro decidiu tomar três medidas: o Ministério das Relações Exteriores vai chamar o embaixador americano no Brasil, Thomas Shannon, para que ele dê novos esclarecimentos, vai cobrar explicações formais do governo dos Estados Unidos e vai ainda recorrer aos órgãos internacionais, como a ONU, para discutir a violação de direitos de autoridades e cidadãos brasileiros.
“Se forem comprovados esses fatos, nós estamos diante de uma situação que é inadmissível, inaceitável, por que eles qualificam uma clara violência à soberania do nosso país. O Brasil cumpre fielmente com suas obrigações e gostaria que todos os seus parceiros também as cumprissem e respeitassem aquilo que é muito caro para um país que é a sua soberania”, disse Cardozo.

O ministro esteve na semana passada nos Estados Unidos, onde se reuniu com o vice-presidente, Joe Biden. Ele levou a proposta de que as comunicações só sejam acessadas com autorização da Justiça e no caso de investigações criminais. A proposta não foi aceita.
Procuradas, as embaixadas dos Estados Unidos e do México não se manifestaram.