quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Por que discriminar é correto e natural


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sex_discrimination_act_.jpgNos dias de outrora, dizer que um homem estava discriminando significava estar-lhe prestando um grande elogio.  Significava dizer que ele tinha gosto: ele sabia distinguir entre o ruim, o medíocre, o bom e o excelente.  Sua capacidade de fazer distinções requintadas permitia-o viver uma vida melhor do que em outros contextos.
Hoje em dia, em nossos tempos politicamente corretos, discriminação implica ódio racial ou sexual.  Quem discrimina está, segundo o senso comum, evocando o linchamento de inocentes, o enforcamento de negros que não cometeram crime nenhum, e, no extremo, um retorno à escravidão.  Pelo menos foi isso que aconteceu com o senador recém-eleito pelo estado do Kentucky Rand Paul, que, durante sua campanha, afirmou que havia algumas partes da chamada Lei dos "Direitos Civis" de 1964 que eram repreensíveis.  Em decorrência disso, a esquerda acionou sua poderosa máquina difamatória.
Porém, tudo que o senador Paul estava dizendo é que, embora seja ilícito ao governo discriminar com base em raça, sexo ou qualquer outro critério, é um direito básico de indivíduos terem a liberdade para demonstrar exatamente quais são suas preferências.  Trata-se de um elemento básico dos direitos de propriedade.  Se os indivíduos não tiverem esse direito, então um importante elemento da liberdade está irremediavelmente perdido.
Os gritos de fúria e revolta que recepcionaram tal exposição de ideias foram tão intensos, que o senador se sentiu compelido a recuar em sua declaração.  Entretanto, estamos aqui para discutir ideias e não política.  Aqui, a verdade e a justiça são nossas únicas guias, e não os sentimentos feridos de jornalistas trabalhando para a mídia convencional e para outros veículos lacrimosos.  Sendo assim, faz-se necessário ser claro e direto: é mais do que óbvio que qualquer ato de discriminação da parte de indivíduos — porém, é claro, não da parte do estado — é um direito nato, pois trata-se do direito à liberdade.   
Quem discorda disso, por consequência lógica, teria de, por exemplo, impor a bissexualidade para todos.  A bissexualidade coerciva é a implicação lógica de qualquer movimento antidiscriminação.  Por quê?  Ora, homens heterossexuais desprezivelmente discriminam nada menos que metade da raça humana como indigna de ser sua parceira de cama/sexo/casamento: ou seja, todos os outros homens.  Tampouco podem as mulheres heterossexuais alegar inocência frente a essa terrível acusação; elas, também, repudiam metade dos seres humanos nesse aspecto. 
E quanto aos homossexuais masculinos?  Podem eles rechaçar essa acusação mortal?  Não, eles também se recusam a ter qualquer coisa com todas as fêmeas nesse contexto.  Similarmente, as fêmeas homossexuais, lésbicas, criaturas rançosas que são, também evitam manter relações amorosas com qualquer tipo de homem — de novo, metade da raça humana.
Portanto, os bissexuais, e somente os bissexuais, estão livres de tal acusação.  Somente eles são totalmente inocentes de incorrer em qualquer discriminação desse tipo.  Eles são as únicas pessoas decentes em todo o espectro sexual; apenas eles se abstêm de incorrer em prática tão abjeta.  (Vamos aqui desconsiderar o fato de que bissexuais também fazem comparações individuais baseadas em beleza, idade, senso de humor etc.)
Logo, se nós realmente nos opomos à discriminação de questões referentes ao coração, então todos nós temos de abraçar a bissexualidade.  Pois, se não o fizermos voluntariamente, a implicação lógica é que devemos ser forçados a fazê-lo.  Afinal, recusar-se a aceitar essa conclusão significa aprovar não apenas tacitamente, mas também ativamente, práticas discriminatórias — certamente uma das piores coisas dentro do arsenal do politicamente correto.
É perfeitamente possível opor-se a esse argumento dizendo que leis contra a discriminação feita por agentes privados devem ser válidas apenas para empresas e negócios, e não para interações entre pessoas.  Porém, por que somente para o comércio e não também para relações humanas?  Certamente, se há algo como "o direito de não ser discriminado", então ele deve ser aplicado em todas as áreas da existência humana, e não apenas no mercado.  Se nós temos o direito de não sermos assassinados, ou roubados — e nós o temos —, então esse direito permeia todos os domínios da existência humana.  Ser assassinado ou roubado dentro de sua casa é tãoigualmente incorreto quanto o ser dentro de uma loja.
Ademais, o fato é que as atuais leis antidiscriminação nem mesmo se aplicam uniformemente no âmbito comercial.  Antes, sua aplicação depende do "poder" envolvido nas relações, um conceito bastante sem sentido, pelo menos da maneiro como é utilizado pelos nossos amigos da esquerda.
Por exemplo, se eu odeio chineses e, por conseguinte, não quero frequentar seus restaurantes, não estou violando nenhuma lei.  Entretanto, se o dono do restaurante chinês, por exemplo, odeia judeus como eu, ele legalmente não pode me proibir de entrar em suas dependências.  Por quê?  Porque os vendedores, nesse caso, são considerados mais "poderosos" do que os compradores.
Porém, a coisa nem sempre funciona assim.  Se um grande comprador — por exemplo, uma rede varejista poderosa — se recusar a comprar estoques de uma empresa fornecedora presidida por uma mulher, porque tal rede varejista discrimina mulheres, ela jamais ficaria impune mantendo tal política.
Por que então deveria esse sentido ilegítimo de "poder" determinar a legalidade de uma decisão econômica?  Certamente, um homem "sem poder", no sentido de ser pobre, não teria permissão para estuprar uma mulher "poderosa", no sentido de que ela é rica.  Ou teria?  Bem, essa defesa nunca foi tentada antes, então, quem sabe?
Outra objeção: pode ser aceitável que um indivíduo discrimine uma minoria oprimida, mas se muitos — ou, pior, se todos os membros da maioria — resolverem incorrer nessa prática, suas vítimas irão sofrer indevidamente e excessivamente.  Por exemplo, suponha que brancos se recusem a alugar quartos de hotéis para negros, ou até mesmo a empregá-los.  Consequentemente, os negros passarão por sofrimentos e angústias atrozes.
Porém, tal objeção é economicamente ignorante.  Se os brancos boicotarem os negros dessa maneira, o livre mercado irá se levantar em defesa destes últimos.  Como?  Se nenhum proprietário estiver concedendo alugueis para um negro, então haverá aí uma grande oportunidade de lucro.  Mais ainda: os lucros subirão enormemente em decorrência do simples surgimento desse arranjo.  Consequentemente, passará a ser extremamente vantajoso para qualquer empreendedor, no sentido financeiro, passar a suprir essa demanda de mercado.
O mesmo ocorre no mercado de trabalho.  Se os brancos se recusarem a contratar negros, seus salários cairão para níveis abaixo daquele que de outra forma prevaleceria no mercado.  Isso irá criar grandes oportunidades de lucro para alguém — seja ele branco ou negro — que decida contratar essas pessoas, o que o tornará capaz de superar concorrencialmente aqueles que optaram pela discriminação.
Porém, esse fenômeno não funcionou para aliviar a má situação dos negros que eram obrigados a sentar no banco de trás dos ônibus durante a vigência das leis de segregação racial nos EUA até a década de 1960.  Por quê?  Porque a entrada no mercado de fornecimento de serviços de ônibus era estritamente regulada pelas forças políticas, as quais, antes de tudo, foram as responsáveis pela criação dessas leis raciais repreensíveis.  Se a determinação de que negros se sentassem no fundo do ônibus fosse apenas resultado de discriminação privada, tal arranjo seria completamente impotente e inócuo, pois outras empresas concorrentes certamente passariam a ofertar lucrativamente serviços de ônibus para essas pessoas discriminadas.
É com essas e outras questões que lido em meu mais novo livro, The Case for Discrimination (algo como Em Defesa da Discriminação).  A minha esperança é que esse volume possa lançar alguma luz sobre essas questões, além de se mostrar uma leitura interessante.
Walter Block é membro sênior do Mises Institute e professor de economia na Loyola University, Nova Orleans.

Dirceu pede que STF considere tese de Lewandowski para corrupção

POLÍTICA


Laryssa Borges, Veja
Na noite desta segunda-feira, sem alarde, a defesa do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (foto abaixo) encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um pedido para que os ministros da corte amenizem a pena pelo crime de corrupção cometido no esquema do mensalão.
A defesa do petista argumenta, em um memorial de sete páginas, que a trama criminosa teria ocorrido entre 2002 e 2003. Na prática, os advogados colocaram no papel a tese sustentada no plenário na semana passada pelo ministro Ricardo Lewandowski, que foi repelida com virulência pelo presidente do STF, Joaquim Barbosa.
A constatação de que a tese de Lewandowski pouco tinha de inocente foi revelada pelo site de VEJA na última sexta-feira. Após o bate-boca com Barbosa, que por pouco não terminou em pancadaria na antessala do plenário, advogados que acompanham o julgamento e dois ministros identificaram na reação desmedida do presidente do STF uma tentativa de impedir que Lewandowski reabrisse a discussão sobre a aplicação de uma legislação mais branda para os crimes de corrupção.

Na noite desta segunda-feira, sem alarde, a defesa do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um pedido para que os ministros da corte amenizem a pena pelo crime de corrupção cometido no esquema do mensalão. A defesa do petista argumenta, em um memorial de sete páginas, que a trama criminosa teria ocorrido entre 2002 e 2003. Na prática, os advogados colocaram no papel a tese sustentada no plenário na semana passada pelo ministro Ricardo Lewandowski, que foi repelida com virulência pelo presidente do STF, Joaquim Barbosa.
A constatação de que a tese de Lewandowski pouco tinha de inocente foi revelada pelo site de VEJA na última sexta-feira. Após o bate-boca com Barbosa, que por pouco não terminou em pancadaria na antessala do plenário, advogados que acompanham o julgamento e dois ministros identificaram na reação desmedida do presidente do STF uma tentativa de impedir que Lewandowski reabrisse a discussão sobre a aplicação de uma legislação mais branda para os crimes de corrupção. Ou seja, Lewandowski teria aproveitado um recurso apresentado pelo ex-deputado Carlos "Bispo" Rodrigues para preparar terreno em benefício do trio petista José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares. Nesta segunda, os advogados de Dirceu comprovaram que Barbosa - pelo menos no mérito - estava certo.
No documento apresentado, o advogado do petista, José Luís de Oliveira Lima, pede textualmente que os ministros do STF considerem o “debate estabelecido na sessão plenária de 15 de agosto”. O evento a que se refere a defesa é justamente a exposição de Lewandowski em benefício do PT. Para Dirceu, o plenário do STF deve aceitar a argumentação do antigo revisor e acatar a tese de que corruptos e corruptores articularam todo o esquema criminoso do mensalão em 2002 e no início de 2003.
O marco temporal pode ser crucial na definição do tamanho das penas de parte dos mensaleiros condenados por corrupção. É que os réus questionam o fato de terem sido condenados por corrupção ativa e passiva com base na Lei 10.763, de 2003, que prevê penas de dois a doze anos para os crimes. Se conseguirem convencer os ministros de que os acordos para repasse de propina ocorreram em 2002 ou até antes de novembro de 2003, acreditam que podem ser beneficiados porque neste período estava em vigor uma legislação mais branda para crimes de corrupção, com penas de um a oito anos de reclusão. 
Para tentar alterar o entendimento de que o mensalão foi gestado e consolidado sob a vigência de uma legislação mais leve, a defesa de Dirceu se apega ao acordo que o PT celebrou com o então presidente do PTB, José Carlos Martinez. Como o dirigente partidário morreu em outubro de 2003, as negociatas, na versão da defesa, só podem ter ocorrido antes de novembro daquele ano, quando a lei mais gravosa passou a produzir efeitos.
“O acórdão condenatório afastou a alegação dos réus de que o dinheiro recebido pelo PTB era fruto de acordos eleitorais municipais [de 2004]. Essa alegação foi tida como inverossímil. Prevaleceu o entendimento de que os repasses foram acertados nas reuniões ocorridas na Casa Civil e quitados como retribuição do apoio político prestado nas votações das reformas. Tudo no ano de 2003”, diz a defesa do ex-ministro José Dirceu.
A tese, no entanto, é capenga. Apesar de o STF ter concluído que o esquema de corrupção foi planejado logo após a vitória do petista Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, os ministros da mais alta corte do país concluíram também que em casos de crime continuado, como os sucessivos atos de corrupção praticados por Dirceu, deve ser aplicada a lei mais dura contra o criminoso.
A despeito de os magistrados terem atestado que o delito de corrupção é formal e se consuma instantaneamente com a simples solicitação ou promessa da vantagem, independentemente do efetivo recebimento do benefício, o plenário considerou que deve ser aplicado no caso do mensalão a súmula 711 do STF. O texto estabelece que aplica-se a lei mais severa se a participação criminosa se estendeu no tempo e se uma parte dos crimes ocorreu na vigência desta lei mais grave.
A próxima sessão do STF para analisar os recursos do mensalão está marcada para esta quarta-feira.

Oito bate-bocas do julgamento do mensalão

Nem sempre é possível manter a compostura quando um assunto tão importante está e pauta

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O primeiro embate

Três de agosto. Transcorria o segundo dia de julgamento quando surgiu o pedido de desmembramento do processo, o que beneficiaria os réus, o ministro Ricardo Lewandowski surpreendentemente votou favoravelmente ao pleito do advogado Márcio Thomaz Bastos. Joaquim Barbosa acusou o colega de "deslealdade". "O tom forte de vossa excelência já prenuncia que o julgamento será tumultuado", respondeu Lewandowski. Foi o primeiro embate entre o relator e o revisor. De lá para cá, em situações diversas, o antagonismo se repetiu. 

O fator Lula, por Merval Pereira

POLÍTICA


Merval Pereira, O Globo
A simples expectativa de que a economia piore com a possibilidade de a alta do dólar afetar ainda mais a inflação trouxe novamente à tona a pressão de grupos políticos e empresariais para que Lula venha a ser o candidato do PT em 2014.
Por enquanto não há, no entanto, maiores consequências decorrentes desse movimento, não apenas porque o próprio Lula não se mostra disposto a aceitar a nova missão, como também a recuperação da popularidade da presidente Dilma, embora pequena, permite que ela se mantenha como a candidata natural à reeleição, não havendo por ora qualquer indicação de que sua postulação está inviabilizada.
Ao contrário, continua liderando as pesquisas de opinião, embora mais vulnerável ao ataque dos adversários, notadamente a ex-ministra Marina Silva. Também agrada ao PSDB a recuperação de Dilma, que a recoloca no páreo, longe, porém, daquela situação em que todos consideravam praticamente certa sua reeleição, e afasta momentaneamente o fantasma de Lula.


Quem tem um problema a mais para tomar a decisão sobre o futuro é o ex-governador José Serra, que terá de fazê-lo sem ter certeza de qual será o movimento posterior de Lula. Além disso, agora Serra tem diante de si a possibilidade real de uma prévia interna.
Caso venha a ocorrer, a decisão de Lula de disputar só acontecerá próximo à data fatal, lá pelo final do primeiro semestre. Até lá haverá tempo suficiente para analisar a situação econômica do país e o balanço de forças partidárias. Mas o timing de Lula dependerá também da compatibilização com o tempo político do governador Eduardo Campos, que já está sendo pressionado a lançar-se candidato ainda este ano, com a devolução dos cargos no governo federal.
A possibilidade de ele vir a ser o real adversário da presidente Dilma no segundo turno já entra na análise de cenários de um banco como o JP Morgan, que o considera com mais chances de chegar ao segundo turno do que a ex-senadora Marina Silva ou o presidente do PSDB, Aécio Neves.
Por ser da base aliada do governo, de uma linhagem de esquerda tradicionalmente ligada ao ex-presidente Lula, o PSB poderia se tornar o escoadouro de votos de um eleitor descontente com o PT, mas disposto a votar em um projeto de esquerda moderna, que seria a base da campanha de Campos.
Ele uniria então a manutenção do projeto a uma visão de esquerda com a qualidade de gestão, que seria a base do projeto alternativo do PSDB, tendo à frente o senador Aécio Neves.

Me engana que eu gosto, por Elio Gaspari

POLÍTICA


Elio Gaspari, O Globo
Com o conhecimento do governo americano, a polícia inglesa deteve por cerca de nove horas e interrogou no aeroporto de Heathrow o cidadão brasileiro David Miranda, que desembarcara de um voo procedente de Berlim, a caminho do Rio de Janeiro.
O chanceler Antonio Patriota disse que o episódio “não é justificável” e informou que os dois governos continuarão tratando do caso. Já o embaixador da Grã-Bretanha em Brasília foi mais preciso: o assunto “continua sendo uma questão operacional da Polícia Metropolitana de Londres”. Aleluia: Sua Majestade tem um governo que fala claro na defesa dos seus interesses.
Patriota precisa definir o que “não é justificável”, pois o embaixador inglês justificou-se. Nada de novo. Em julho de 2005 o brasileiro Jean Charles de Menezes, que vivia em Londres com todos os papéis em ordem, saiu de casa, entrou num vagão de metrô e tomou sete tiros na cabeça. A Polícia Metropolitana de Londres confundira-o com um terrorista e “lamentou o episódio”. Sua família recebeu uma indenização de cem mil libras.

David Miranda, brasileiro preso e interrogado pela polícia inglesa. Foto: O Globo

Cinco anos depois, Tony Blair, o primeiro-ministro da ocasião, publicou um livro de memórias no qual lamentou o “terrível erro”, lembrando que ficou “profundamente entristecido pelos policiais que estavam agindo de boa-fé, tentando garantir a segurança do país”. Aleluia de novo. Os governantes ingleses defendem suas polícias. Já as autoridades brasileiras agem de maneira diversa: depois da morte de Jean Charles, Blair foi convidado para prestar serviços de consultoria ao Rio de Janeiro, preparando-o para as Olimpíadas.
Nessa época o governo inglês tentava criar, nos aeroportos de Pindorama, barreiras para viajantes brasileiros. Milhares de nativos eram deportados ao descer em aeroportos europeus. Uma pesquisadora da Universidade de São Paulo foi recambiada de Madri enquanto estava a caminho de Lisboa. Só depois de alguma gritaria o Itamaraty adotou um critério de reciprocidade, devolvendo espanhóis. Veio a crise e hoje é a Espanha que manda gente para o Brasil, sempre bem recebida.
Em julho o doutor Patriota repudiou o procedimento dos governos de Portugal, Espanha, França e Itália, que negaram direito de sobrevoo ao avião do presidente Evo Morales porque se supunha que tinha a bordo o americano Edward Snowden. Deu em quê? Detiveram o companheiro do jornalista americano que divulgou os documentos secretos coletados pelo ex-funcionário da CIA.
Se governos da Europa e dos Estados Unidos acreditam que suas leis especiais justificam-se porque o combate ao terrorismo é um conflito mundial, o receituário da Guerra Fria poderia ser ressuscitado. O governo brasileiro conhece as identidades dos funcionários ingleses que trabalham para o serviço de informações e vivem aqui, sob o guarda-chuva diplomático. Basta pedir que um deles retorne ao seu país, o que não chega a ser uma punição pessoal.
Seria apenas um gesto capaz de materializar o desagrado do governo, como fez a rainha Vitoria com o ditador boliviano Melgarejo. Ele amarrara o embaixador inglês a uma mula, e a soberana mandou bombardear La Paz. Ao saber que a cidade ficava fora do alcance de seus canhões, riscou a Bolívia de seu mapa e declarou que ela não existia mais.

Elio Gaspari é jornalista.

De pai para filho, por Ilimar Franco

POLÍTICA


Ilimar Franco, O Globo
O PMDB reclamou ontem da falta de empenho do PT para que as alianças avancem nos Estados. Os peemedebistas consideram que os petistas, pelo fato de estarem no governo federal, deviam fazer mais para unir sua base nas disputas regionais. As queixas foram abertas pelo senador Jader Barbalho.

 
Helder Barbalho, vice-presidente do PMDB/PA

Ele quer toda a base governista, e não apenas o PT, apoiando a candidatura do filho, Helder Barbalho, ao governo do Pará. O presidente do Senado, Renan Calheiros, também protestou. O PT está disposto a apoiá-lo para o governo de Alagoas. Mas Renan quer que o PT garanta o apoio a qualquer nome que o PMDB apresentar, inclusive o do deputado Renan Filho.

Brasil não deve remar contra a maré do câmbio (Editorial)

ECONOMIA


O Globo
As reações nos mercados financeiros brasileiros têm sido mais extremas do que a média internacional. Não por acaso, depois de liderar, anos atrás, a apreciação frente ao dólar, o real é, em 2013, a moeda que mais se depreciou, superando nos últimos dias até mesmo a rúpia indiana. Além de alguns indicadores apontarem para possíveis tempestades ao longe, há também a perda de credibilidade da política econômica.
O Banco Central tenta atenuar o que considera uma volatilidade excessiva no câmbio e nas taxas de juros, não só preocupado com o impacto dessa flutuação sobre os custos e preços domésticos, mas porque essa agitação no mercado torna a economia ainda mais imprevisível, o que pode levar os agentes econômicos, investidores em especial, a dar marcha à ré em projetos essenciais ao futuro do país.
Apesar dessa tendência ao excesso dos mercados, o Brasil conta com o mais adequado mecanismo para se defender dessa turbulência que atinge diferentes moedas. É o câmbio flutuante. Em determinados momentos, o ajuste é inexorável, e remar contra a maré significaria queimar rapidamente bilhões de dólares em reservas, e provavelmente sem resultado.


Como as demais moedas também estão se movendo, se o real ficasse paralisado o Brasil certamente perderia mercados conquistados a duras penas, e isso em um momento que a balança comercial tem registrado déficits, aumentando as necessidades de financiamento para que o país feche suas contas externas.
O câmbio flutuante embute o antídoto contra crises externas que no passado provocaram graves turbulências na economia brasileira. O ajuste no câmbio fortalece as exportações e torna o Brasil mais atrativo para visitantes estrangeiros. Em contrapartida, algumas importações devem diminuir e os brasileiros terão de ser mais comedidos em suas viagens internacionais.
Mas, como em economia há sempre os dois lados da “moeda”, o câmbio depreciado força uma parte das empresas a buscar redução de custos e eficiência, mas também abre espaço para elevação de preços domésticos no caso dos bens e serviços que ficarem menos expostos à concorrência externa.

A questão das "externalidades"



externalidade.jpgA ideia de externalidades é altamente intuitiva; faz sentido imaginar que as ações de um indivíduo afeta a felicidade e o bem-estar de outros.  Uma externalidade positiva ocorre quando a ação de um indivíduo beneficia pessoas que não participaram diretamente dessa troca.  Pense, por exemplo, no beneficio que um homem recebe quando uma mulherbonita passa ao seu lado na calçada.
Por outro lado, uma externalidade negativa impõe um custo sobre terceiros.  Uma fábrica poluindo o ar ou o abastecimento de água de uma cidade é um exemplo típico desse caso.  Muitos economistas utilizam a ideia de externalidades como base para fazer recomendações de políticas públicas: impor tributos ou conceder subsídios para "compensar" os custos externos.  Com efeito, várias atividades governamentais — para não dizer todas — já foram, cada uma à sua época, justificadas com base no argumento das externalidades.
Mas será que as externalidades realmente possuem algum papel significativo na ciência econômica?
Para a Escola Austríaca, a abordagem correta para a questão das externalidades é uma só: defender o cumprimento e a imposição de direitos de propriedade.  Nesta abordagem, os direitos de propriedade fornecem a resposta para os problemas gerados pelas externalidades.  Se um indivíduo gera danos físicos à propriedade de terceiros, ele é obrigado a pagar por esse estrago.  Tal abordagem, obviamente, só se aplica para os casos de externalidades em que os direitos de propriedade de um indivíduo foram infringidos.  Mises explica como a adoção do sistema de propriedade privada removeu as externalidades que afligiam o antigo sistema no qual não havia proprietário definido para as terras cultiváveis. 
O exemplo extremo nos é proporcionado pelo caso, já referido anteriormente, das terras sem dono.  Se a terra não tem dono, embora o formalismo jurídico possa qualificá-la de propriedade pública, as pessoas utilizam-na sem se importar com os inconvenientes de uma exploração predatória.  Quem tiver condições de usufruir de suas vantagens — a madeira e a caça dos bosques, os peixes das extensões aquáticas e os depósitos minerais do subsolo — não se preocupará com os efeitos posteriores decorrentes do modo de exploração.  Para essas pessoas, a erosão do solo, o esgotamento dos recursos exauríveis e qualquer outra redução da possibilidade de utilização futura são custos externos, não considerados nos cálculos pessoais de receita e despesa.  Cortarão as árvores sem qualquer consideração para com as que ainda estão verdes ou para com o reflorestamento. Ao caçar e pescar não hesitarão em empregar métodos contrários à preservação das reservas de caça e pesca.
Nos primórdios da civilização, quando ainda havia abundância de terras de qualidade não inferior à já utilizada, o uso de métodos predatórios era corrente.  Quando a produtividade diminuía, o lavrador abandonava sua terra e se mudava para outro lugar. Só mais tarde, à medida que a população crescia e não havia mais disponibilidade de terra virgem de primeira classe, as pessoas começaram a considerar tais métodos predatórios um desperdício. Consolidava-se assim a instituição da propriedade privada da terra; a princípio, nas terras aráveis, e depois, passo a passo, estendendo-se aos pastos, às florestas, aos pesqueiros.
Ele também argumenta que as externalidades subsequentes "poderiam ser eliminadas por meio de uma reforma das leis relativas à responsabilidade por danos infligidos e pelo cancelamento das barreiras institucionais que impedem o pleno funcionamento do sistema de propriedade privada."
No entanto, para que ações judiciais por danos infligidos corrijam as externalidades, o custo de restituição determinado deve ser igual à quantidade da externalidade.  Porém, mesmo se soubéssemos o preço de mercado correto a ser pago pela propriedade danificada, o que dizer sobre o valor do dano psíquico?  Nesse ponto, Mises está cometendo um erro similar ao de Ronald Coase, quando este disse que a decisão judicial não irá afetar a alocação de recursos (considerando-se que os custos de transação sejam zero).  Se, por exemplo, a poluição gerada por uma fábrica estiver destruindo um objeto de alto valor sentimental mas de baixo valor de mercado, o proprietário deste objeto pode não ter os meios para "subornar" o dono da fábrica para que este cesse a poluição.  Para este caso, o teorema de Coase não é válido.  Da mesma maneira, se uma decisão judicial levar em conta apenas o valor de mercado da propriedade destruída, a externalidade não será "corrigida" para o caso de objetos de valor sentimental.
Uma abordagem austríaca mais moderna para a questão das externalidades é mostrar que elas são impossíveis de ser calculadas em uma escala significativa.  Rothbard demonstrou que a economia do bem-estar era ilógica, pois é impossível fazer uma comparação interpessoal de utilidade.  Em outras palavras, a felicidade não pode ser mensurada em uma escala quantitativa da mesma forma que, por exemplo, a tensão elétrica pode.  Isso significa que é impossível calcular racionalmente a utilidade ganhada ou perdida em decorrência de uma intervenção governamental. 
Dado que os impostos ou os subsídios propostos para corrigir uma externalidade devem necessariamente ser acompanhados de algum tipo de coerção governamental, torna-se óbvio que nem todos os envolvidos irão se beneficiar desta política. Como então podemos determinar se os resultados de tal política aumentaram ou não a utilidade social da economia?  Nenhum número pode ser calculado, nem mesmo em teoria, para estipular qual foi o benefício líquido da intervenção estatal para a sociedade, ou mesmo para determinar se o benefício líquido foi positivo ou negativo.  Só é possível haver um aumento no benefício líquido se as ações dos indivíduos foremvoluntárias; um ato voluntário indica uma preferência por aquela ação escolhida em detrimento de todas as outras opções disponíveis.  A consequência lógica de tudo isso é que a afirmação de que existe uma externalidade é algo puramente arbitrário.
A análise acima sobre a natureza da utilidade é satisfatória porque traz descrédito à ideia de se utilizar as externalidades como base racional para as decisões políticas do governo.  No entanto, nem é preciso ir tão longe assim, dado que a ideia de externalidades pode ser descartada em bases puramente metodológicas.
Externalidades são definidas a partir do momento em que se toma como referencial um indivíduo que não age.  É sobre esse indivíduo passivo que recaem os custos ou os benefícios de uma ação realizada por terceiros.  Por exemplo, em uma situação em que há danos à sua propriedade, o que ocorreu é que os recursos deste indivíduo proprietário foram utilizados sem seu consentimento.  Para o caso de outras externalidades, o indivíduo que recebe o custo ou o benefício é apenas um inocente observador.  É exatamente pelo fato de os indivíduos não agirem nestas situações, que os economistas criaram uma categoria separada para descrever os efeitos sobre a utilidade deles.  Se um indivíduo age, ele demonstra preferência e espera a maximização de sua utilidade marginal; uma externalidade é o efeito de uma ação sobre a utilidade de terceiros.
Mas é justamente porque as externalidades não podem ser reveladas através da ação humana, que elas são irrelevantes para o estudo da ciência econômica.  Sendo assim, a ideia de externalidades não pode resultar em nenhum conhecimento adicional sobre economia.
Pode-se contestar dizendo que o exemplo de uma pessoa danificando a propriedade de outra demonstra uma externalidade negativa.  No entanto, é sim possível que o dono da propriedade aprove o que foi feito à sua propriedade, sendo que o único motivo de ele próprio não ter feito isso é porque ele preferiu agir de alguma outra maneira.  Ou talvez, tivesse ele tido a opção, ele teria aprovado a maneira como sua propriedade foi utilizada por esse outro indivíduo.  Você se sentiria pior caso alguém jogasse um tijolo de ouro na sua janela?
Mas e o que dizer quanto ao fato, alegado por Coase, de que as externalidades geram agentes que, por meio de barganhas e subornos, decidirão como alocar seus recursos?  A resposta a isso é uma só: do ponto de vista de um economista, isso não interessa (embora possa ser bastante interessante do ponto de vista da psicologia).  A ciência econômica se baseia em um axioma fundamental: os humanos agem.  A razão pela qual um homem escolhe uma determinada ação em detrimento de outra não é importante.  Como dito antes, a única verdade econômica que podemos retirar de uma ação é que ela demonstrou uma preferência.  O motivo dessa preferência é desconhecido e não é o escopo da ciência econômica.
Dado que um economista não estuda os motivos de uma preferência, é irrelevante determinar se uma ação individual é motivada por uma externalidade ou por outra coisa qualquer.  Por exemplo, se eu observo um indivíduo fazendo uma oferta para comprar um ornamento de jardim do vizinho, a ciência econômica vai me ajudar apenas a afirmar que esse indivíduo prefere o ornamento ao dinheiro que ele está oferecendo em troca.  Pode ser que ele esteja apenas querendo retirar aquele ornamento da vista de sua janela (pois ele o acha feio), ou pode ser que ele queira colocar o ornamento em seu próprio jardim, para que possa contemplá-lo mais de perto.  O economista não é capaz de diferenciar qual destes dois motivos gerou o ato, por isso ele deve tratar o ato como sendo o mesmo em ambos os casos.
Outra defesa possível das externalidades é que elas ilustram como a propriedade comunal é mais propensa a ser utilizada mais descuidadamente do que uma propriedade privada.  Tudo o mais constante, um indivíduo terá um incentivo para utilizar e exaurir ao máximo uma propriedade comunal enquanto ela ainda estiver utilizável.  Mas esse fenômeno pode prontamente ser explicado sem se recorrer às externalidades.  Um indivíduo não lidaria com custos de depreciação de seu capital caso utilizasse uma terra comunal, ao passo que ele arcaria integralmente com estes custos caso ela fosse propriedade privada.  Em condições normais, os custos mais baixos de se utilizar uma terra comunal fornecerão um incentivo para que ele a utilize mais negligentemente e com mais intensidade do que se ela fosse privada.  Isso é tudo o que temos de afirmar como economistas.
A teoria das externalidades é tão relevante para a ciência econômica quanto uma teoria sobre como o alinhamento dos planetas afeta o humor das pessoas.  Ambas, por definição, tentam explicar os motivos que levam um indivíduo a formar suas preferências.  Para o economista, não importa se uma pessoa vai comprar um sanduíche de presunto porque está com fome, ou porque isso irá aliviar uma inquietação provocada por ações de terceiros ou porque ela leu que tal sanduíche irá prevenir o envelhecimento.  Tudo o que interessa é que essa pessoa prefere o sanduíche aos $2 em sua mão.

Stephen Halbrook é formado em engenharia pelo Dartmouth College.

Tradução de Leandro Roque