quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Se é assim, governo pra quê?, por José Serra

POLÍTICA


José Serra
Não é segredo, mas o fato de a coisa ser óbvia não faz brotar do chão as obras: o principal problema econômico do Brasil é o imenso déficit na infraestrutura – estradas, ferrovias, hidrovias, mobilidade urbana, portos, aeroportos e energia. Esse déficit se deve à incapacidade do governo federal de dar realidade aos investimentos públicos.
Como proporção do PIB, o Brasil está entre os dez países do mundo onde o governo menos investe. Um paradoxo, sem dúvida, se levarmos em conta o tamanho da carga tributária – a maior do mundo em desenvolvimento – e a excepcional bonança externa que favoreceu a economia brasileira desde meados da década passada até recentemente.
Os frutos dessa bonança e os maiores recursos fiscais não foram aproveitados para elevar investimentos, mas para financiar gastos correntes do governo, consumo importado (que substituiu a produção doméstica), turismo no exterior e grandes desperdícios.
Não é por menos, aliás, que o Brasil caminha firme rumo à desindustrialização e, com ela, à queda de investimentos no setor, a exportação de postos de trabalho mais qualificados e à renúncia dos benefícios do progresso técnico que acompanha a atividade manufatureira.
Mais ainda: o país tornou-se vítima, novamente, do desequilíbrio externo, com um déficit em conta corrente caminhando para 4% do PIB. Nota: é bobagem relativizar o peso desse número com a máxima de que temos reservas altas. Relevante é a tendência observada, que piora as expectativas, leva à contração dos investimentos privados e à pressão sobre a taxa de câmbio.
Parece paradoxal, mas o fraco desempenho dos investimentos públicos se deve à inépcia, não à uma escassez de recursos. O teto dos investimentos federais pode até ser baixo, e é, mas o governo não conseguiu atingi-lo. A falta de projetos, de planejamento, de gestão e de prioridades é o fator dominante.

Obras da Ferrovia Oeste-Leste (Bahia)

Há exemplos já "tradicionais" de obras que, segundo o cronograma eleitoral propagandeado, já deveriam ter sido entregues, mas que percorreram de zero à metade do caminho, como a Ferrovia Transnordestina, a transposição do São Francisco, a Refinaria Abreu e Lima, a Ferrovia Oeste-Leste (Bahia), as linhas de transmissão para usinas hidelétricas prontas (Santo Antônio e Jirau) etc.
A ponte do Guaíba, no Rio Grande do Sul, nem saiu do projeto. Dez aeroportos da Infraero estão com contratos paralisados. Os atrasos nas obras nas estradas federais contemplados no PAC são, em média, de quatro anos — para a BR-101, no Rio Grande do Norte, serão no mínimo cinco: deveria ter sido entregue em 2009 e foi reprogramada para 2014. Depois de um pacote de concessões de estradas muito malfeito, em 2007, só agora, seis anos depois, o governo anuncia um novo, e em condições adversas devido às incertezas da economia e dos marcos regulatórios.

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