quinta-feira, 22 de agosto de 2013

A volta do sujismundo,

 por Mara Bergamaschi

“Toda a pessoa que for encontrada a deitar águas sujas, lixo e qualquer outra imundície nas ruas e travessas será presa e não sairá da cadeia sem pagar dois mil réis”. Esta lei, válida para a cidade do Rio de Janeiro, é de 20 de abril de 1808, logo depois da chegada da corte portuguesa.
Foi identificada como a primeira de muitas deste tipo, ao longo dos séculos. O processo civilizatório da “Paris dos Trópicos” sempre teve a higienização como meta. E a população pagou caro pelas promessas de limpeza urbana. A proibição que entrou em vigor esta semana, ganhando as manchetes, também não é nova: tenta efetivar a Lei 3.273, de 9 de junho de 2001.
O que garante que agora vai? Nada. Uma aposta? A nova maquininha arrecadadora, que identifica na hora o infrator e emite a multa, de R$157 a R$ 3 mil. Há um batalhão de fiscais treinados para flagrar e punir on line o cidadão. Ficha suja instantânea do contribuinte no cadastro municipal.
O interessante é que a engenhoca para cobrança das taxas teve prioridade sobre algo bem mais prosaico: novas lixeiras, mais do que necessárias. As atuais são poucas, pequenas, abarrotadas, imundas e fétidas. (O jeito é guardar o lixo na bolsa).
Temos uma legislação coercitiva que não vinga, mas nenhuma campanha educativa de massa foi feita antes de tentar aplicá-la mais uma vez. Parece que o poder público concluiu que a prevenção é inútil. E que o jeito é lucrar com o carioca que continua a sujar ruas, praias e praças.

Foto: Reginaldo Pimenta / Agência O Globo

Será? É impossível que a consciência cidadã nada tenha avançado em mais de três séculos... A realidade hoje é aparentemente melhor do que a verificada na insalubre capital do Brasil pré-republicano, quando cada rua do centro do Rio apavorava os estrangeiros e era descrita como “uma artéria úmida e podre, secando ao sol”.
Então, por que persiste o desapreço pelos espaços públicos na Cidade Maravilhosa? Não pode ser por que muitos consideram a ação individual uma gota no oceano? Bem, agora, o mau costume, pequeno ou não, vai doer no bolso. Mas não se pode negar que focar de novo no “Sujismundo” é a abordagem mais simplista do desastre ambiental contemporâneo.
Basta lembrar que a coletiva seletiva no Rio praticamente inexiste, chegando a 1,4% do lixo reciclável no ano passado. E que as línguas negras surgem nas praias depois de toda chuva forte. Quem paga a multa quando o descaso é público?
Ontem, enquanto as maquininhas da prefeitura tilintavam com guimbas e palitos atirados nas calçadas, dez toneladas de peixes asfixiados pelo esgoto boiavam na Lagoa de Jacarepaguá, local de futuros esportes olímpicos. Houve punição on line para tamanha violação?

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