quarta-feira, 3 de julho de 2013

Cura gay: preconceito, solução ou oportunismo?

Cura gay: preconceito, solução ou oportunismo?


Charge de Alpino.
Conheça-o.
O Deputado José Campos (PSDB-GO) lançou um projeto, que será incluído na pauta  da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, presidida por Marco Feliciano (PSC-SP), para abolir duas normas do Conselho Federal de Psicologia (CFP), de março de 1999: a primeira que impede expressamente os profissionais da área em oferecer tratamento e cura para a homossexualidade; e a segunda em que “os psicólogos não se pronunciarão, nem participarão de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica”.

O que faz os nossos políticos pensarem em propor isto? Há casos de instituições norte-americanas que tentaram realizar tal prática. E o resultado para as pessoas que se submeteram a isso foi uma maior confusão psíquica e de identidade, levando, não raro, à depressão e ao suicídio.

A Organização Mundial da Saúde, a Associação Americana de Psiquiatria, o Conselho Federal de Psicologia, o Conselho Federal de Medicina, entre outros, afirmam de forma categórica que a homossexualidade não possui cura, pois não é uma doença, ou seja, é impossível curar alguém que não esteja doente. A discussão vai além disso: os especialistas afirmam que a orientação sexual não é uma escolha, e sim uma característica de sua identidade; o que faz algumas pessoas procurarem por uma ajuda é devido à “difícil adaptação a uma sociedade cheia de preconceitos”, como disse o psiquiatra Jairo Bouer.

Um argumento usado para anular a segunda norma é de que fere o direito de expressão, que é uma cláusula pétrea da Constituição Federal - ou seja, que não pode ser alterada ou violada, nem mesmo por emenda constitucional. No entanto, até onde vai o limite do direito de se expressar? Até que ponto a manifestação de um psicólogo, que ratifica a opção de uma reorientação sexual, contradizendo o conhecimento científico, não alimenta o preconceito e a separação? Será que isso não incitaria um maior crescimento da homofobia por aqueles que não compreendem e veem tais lideranças como autoridades, além da intensificação do charlatanismo? 

O CFP afirmou que os profissionais que violarem a resolução receberão sanções. "É obrigação do psicólogo dizer que não há que falar em cura, porque não estamos tratando de doença. Iniciativas como a do deputado reforçam esse tipo de preconceito", disse o presidente do CFP, Humberto Verona, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, além de afirmar que o deputado está "legislando em favor de sua concepção".

Entretanto, a questão transcede o mérito propriamente dito. Pode-se indagar: Qual o nível científico de tais parlamentares para a anuência ou para a recusa? É a representação popular superior ao Direito da Minoria e, ainda, a concepções científicas universalmente desenvolvidas, de modo crítico e pela via do debate? Em que medida o sectarismo promovido por religiosos alçados a cargos no Legislativo deve interferir no Estado, representante de todos? De que maneira pode isso macular o laicismo, a separação necessária entre o Estado, democrático e plural em si, e as predileções religiosas?

Deve-se ressaltar: é livre o sujeito para a busca da transformação. São livres os cidadãos para tais expressões, favoráveis ou contrárias. No entanto, qual a valia da inserção sorrateira, no meio científico, de um discurso que aborda tal condição como uma doença, algo indesejável, reprimível, digno de vergonha, se é este desprovido de valorações sociais?

Como permitir a profissionais da saúde mental o uso de "tratamentos" demonstrados, por estudos isentos, falhos, deletérios, negativos e, sobretudo, infudamentados?

Em que medida o interesse religioso e - por que não? - econômico de tais parlamentares pode interferir no trato isonômico e despido de posturas religiosas e ideológicas, o qual seria, em tese, devido a todos os cidadãos?
Se o fato de os parlamentares serem eleitos pelo povo justifica toda e qualquer criação legal, por que não rasgamos, de uma vez, a Constituição e as leis, bastando apenas perguntar aos mesmos quando estivermos em dúvida sobre o correto para cada situação?

  

Allan Carvalho é estudante de administração na FECAP-SP, coordenador nacional do MCC e articulista da Folha Política.

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