sábado, 16 de novembro de 2013

O fim da Blockbuster e o começo de minha cultura cinematográfica…

O fim da Blockbuster e o começo de minha cultura cinematográfica… 

Roberto Sadovski

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A Blockbuster fechou. Não importa. Antes de a gigante das locadoras de vídeo chegar ao Brasil, minha cultura cinematográfica já estava completa. Das chanchadas brasileiras dos anos 70 aos clássicos que chegavam ao mercado em “fitas seladas”; dos lançamentos de diretores que não chegavam perto dos cinemas aos blockbusters que revelavam novas facetas a cada revisão. Eu passei a adolescência numa cidade com dois cinemas nos quaisos filmes demoravam meses para estrear. Por isso minha meca era a video locadora. Centenas de filmes em VHS que passavam até gastar no bom e velho VCR. Promoções de aluguel de mais de dois filmes numa sexta para devolver só na segunda. A minha média era seis filmes a cada fim de semana. Sempre uma mistura de datas e passaportes cinematográficos. A tela grande fazia falta. Mas a boa e velha Vídeo Magia (sim, era esse o nome) se tornou um substituto de primeira.
A tecnologia atual é sensacional! Netflix e similares colocam os filmes dentro de casa, com qualidade bacana, e na velocidade que seu acesso à internet permite. Aos poucos as fatias vão ficando maiores; as ofertas de filmes on demand, melhores. Mas eu sou um velho. Perder a “cultura das videolocadoras” é um salto gigantesco para trás. O crítico Inácio Araújo uma vez comentou que sentia falta das filas nos cinemas, que deram lugar aos lugares marcados: não que ele sinta falta da bagunça, mas sim da interação de pessoas reunidas com cinema na cabeça. Conhecer gente de gosto similar, entrar em debates acalorados, compartilhar a pipoca – nada disso existe mais num mundo em que o melhor lugar é a poltrona F-15. Eu vou além. O melhor lugar para discutir cinema sempre foi o balcão da locadora! Não no esquemão da defunta Blockbuster, que tinha variedade e quantidade mas também uma certa assepsia.
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Alugar DVDs ainda era bacana, mas essa imagem vai ficar pro museu
Voltando à Video Magia. Ali não existia um batalhão uniformizado que indica todo filme, independente de qualidade. Eu não era um cliente. Era um amigo. E ali fiz vários outros, de ambos os lados do balcão. Todos eram chamados pelo nome – assim como cada um que atravessava a porta. As meninas sabiam quem era apaixonado pela arte, quem era cinéfilo de fim de semana. Sabiam que filme se encaixava no estilo de cada um. Indicavam coisas bacanas, sugeriam um título obscuro para acompanhar a novidade da semana. Ali eu prendi um monte. Tentei passar o que eu achava que sabia em minha cabeça adolescente. Descobri cinematografias que não eram comuns nas reprises da TV (Cronenberg, Besson, Antonioni, Wenders); descobri diretores que, mal sabia, bateria ótimos papos no futuro (Peter Jackson, Sam Raimi, Robert Zemeckis); onde diabos foram parar Richard Stanley, Frank Henenlotter, Stuart Gordon… Sem falar na dezena de cartazes de filmes que adornaram a parede do meu quarto!
O futuro é esse. Talvez a rapaziada que agora abraça o streaming tenha outras maneiras de discutir a paixão pelo cinema. Talvez filas de cinema e balcão de videolocadora sejam coisa de velho nostálgico. Como eu. Nada mais chato do que o tiozinho qu fica com o “no meu tempo era melhor”. Não. No “meu tempo” era só diferente. Hoje as coisas são mais velozes, a variedade é maior. Não é mais tão difícil alguém, com uma conexão de internet bala, conhecer tudo que eu conheci via VHS. Basta paciência e, claro, uma turma bacana pra apontar os caminhos e as referências. Ainda assim, eu sinto que algo se foi. O fim da Blockbuster, que romanticamente teve como última locação a boa comédia É o Fim, sinaliza também o fim de uma era. Mas não se traduz e portas fechadas. Em São Paulo mesmo ainda existe muita locadora de bairro, e aposto que, nesse exato momento em que eu escrevo, tem algum moleque discutindo algum clássico com um amigo do outro lado do balcão. Hmmm, deve ser isso. Internet é legal. Mas nada substitui o aperto de mão, acompanhado de um “bons filmes”,  quando você sai da loja com uma sacola recheada.

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