segunda-feira, 22 de julho de 2013

'Foco é trazer médicos cubanos', diz deputado sobre MP dos Médicos

Eleuses Paiva (PSD-SP) organiza a resistência à proposta governista e 

afirma que o programa Mais Médicos é uma medida eleitoreira que 

colocará em risco tratamento da população de baixa renda no interior 

do país

Marcela Mattos, de Brasília
Deputado Eleuses Paiva PSD/SP
Paiva apresentou 31 emendas ao projeto e pretende que proposta seja totalmente rejeitada no Congresso (Leonardo Prado/Agência Câmara)
Um dos principais opositores no Congresso Nacional ao Mais Médicos, programa
 anunciado pelo governo federal para salvar a saúde pública do país importando
profissionais estrangeiros, o deputado Eleuses Paiva (PSD-SP) afirma que a medida
tenta camuflar a verdadeira intenção do governo: “É um balão de ensaio para trazer
25 000 médicos de Cuba.”
Professor e integrante do setor de medicina nuclear do Hospital de Base de São José
 do Rio Preto e do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, o deputado afirma que as universidades de medicina do país “estão de luto” e ataca o ministro Aloizio Mercadante,
que, apesar de ser titular da Educação, assumiu o papel de articulador do governo no Congresso: “Ele não entende nada do assunto”. Leia trechos da entrevista ao site de
VEJA:
Como o programa Mais Médicos foi recebido pelo Congresso? Essa medida é
 tão constrangedora que não tem nenhum deputado da área de saúde do PT
participando da comissão [que analisa o tema]. Ninguém aceitou ir para um desgaste
 desse. A discussão é autoritária, não dá para negociar. Alguns parlamentares, a pedido
do Ministério da Saúde, querem discutir o tempo de atuação no SUS [de dois anos, de
 acordo com a proposta], se diminui para um ano ou para seis meses. O ponto é que a
forma de fazer essa discussão não é por meio de medida provisória, por ato autoritário.
A forma de fazer a discussão é dentro das universidades, no Conselho Nacional de
Educação.
O que o senhor achou da mudança de discurso quando o governo falou em 
trazer médicos espanhóis e portugueses? Esse balão de ensaio realmente é para
 trazer médico cubano. Há quatro anos, a Venezuela teve a importação de 25 000
médicos cubanos pelo governo Hugo Chávez. A Federação Médica Venezuelana nos
 disse que tinha sérias dúvidas se essas pessoas eram médicas de verdade, porque
as condutas profissionais que elas tomavam eram absurdas. É justamente esse acordo
 que nós desconfiamos que o governo brasileiro esteja fazendo, porque esses médicos
têm um contrato com o governo venezuelano que acaba agora. Eles estão retornando
para Cuba e são justamente os 25 000 que estavam trazendo para o Brasil quando nós
 os emparedamos. Baseado nisso, o ministro [Alexandre] Padilha, que é uma pessoa
muito boa para desviar a rota, diz que vai trazer profissionais portugueses e espanhóis.
 A notícia que nós temos, e que provavelmente o ministro dará, é que serão dez
é médico cubano. É isso que ele está tentando trazer.

O que é o Mais Médicos:

Programa elaborado pelos Ministérios da Saúde e da Educação que prevê a importação de
médicos estrangeiros quando os profissionais brasileiros não ocuparem as vagas disponíveis
 nos municípios do interior do país. O governo chegou a anunciar, em maio, que traria 6 000
cubanos para atuarem nos rincões. Após ser bombardeado por críticas de entidades médicas,
recuou da decisão e anunciou a importação de profissionais espanhóis e portugueses. A insistência
 em trazer médicos do exterior é tanta que a obrigatoriedade do exame que permite a atuação de
estrangeiros no país, o Revalida, foi descartada. Pelo texto, três semanas de experiência em
universidades são suficientes para atestar a qualidade do médico. O programa também atinge
a grade curricular do curso de medicina: após seis anos de graduação, os profissionais terão d
e atuar por dois anos no Sistema Único de Saúde (SUS) – regra que vale para estudantes da rede
 pública e privada.

Então o senhor é contra a importação de médicos estrangeiros?
Ninguém é
contra a entrada de médicos estrangeiros neste país. O que estamos
 discutindo é
qual profissional nós vamos trazer sob o ponto de vista de qualidade e
de conhecimento.
Nós não podemos trazer profissionais despreparados, com conhecimento
 precário. As
 provas do Revalida, quando aplicadas em médicos oriundos de Cuba, tiveram
 reprovação de mais de 90%. Recentemente, avaliaram o quinto e o sexto ano
 da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e o índice de aprovação beirou
80%.
Se um reprova 90%, e outro aprova 80%, que tipo de profissional estamos trazendo
para o nosso país?
Como o governo está reagindo às críticas? Agora está tentando o casuísmo.
Em vez de assumir a impossibilidade de uma medida provisória como essa, tenta
criar casuísmos para poder sobreviver. Estão propondo avaliar quarenta escolas
de medicina para ver o nível delas, mas são as quarenta piores avaliadas pelo MEC.
 Eles querem rebaixar o nível. Quando eu vejo um ministro brigar para rebaixar
enquanto quem está na área acadêmica briga para melhorar sempre, é um absurdo.
 A sociedade tem de ficar revoltada. É o que eu falo: coisa de ministro que não é da
área. O Mercadante não é um educador, não entende nada do assunto e resolveu
 agora virar um educador.
O problema do Brasil é a falta de médicos? Hoje, no Brasil, se formam 16 000
médicos por ano. Não é possível alguém achar que, ao formar mais 12 000 e levar o
aparelho formador para 28 000 profissionais, o problema será resolvido. Com 16 000
 já tem problema de qualidade de docentes, diagnosticado pelo MEC. Já tem problema
 de hospital de ensino, de estrutura dessas escolas. Como vai dobrar o número por
medida provisória? Ninguém que tenha o mínimo de bom senso acha que isso pode
ser feito em curto espaço de tempo. Então é uma medida eleitoreira. As três principais mudanças são totalmente inconsequentes e sem nenhum conteúdo técnico.
Já foram apresentadas 567 emendas, 31 só do senhor. Dá para acreditar que 
sairá do Congresso outra – ou nenhuma – proposta? Eu tendo a acreditar nisso.
Se o governo tiver o mínimo de responsabilidade, ele retira essa medida provisória. Até
 porque não é normal uma medida ter mais de 500 emendas. Eles conseguiram uma unanimidade: todas as medidas tentam resgatar que não se mexa na autonomia
universitária, que é importante avaliar a competência profissional, que o aparelho
 formador tem que ter critérios técnicos. Particularmente, tenho minhas sinceras
 dúvidas se será aprovado.

Mas a base é grande... Sim. Mas o PSD, por exemplo, é um partido independente.
Não nos furtamos de votar junto com o governo quando achamos que o projeto é
interessante. Nós não temos problema em votar contra o governo. Eu estou
responsável por fazer a discussão dessa MP na bancada, será na primeira semana
após o recesso para fechar um posicionamento uniforme. Vou trabalhar pela rejeição
 total da proposta.
Qual seria a solução para os conhecidos problemas da saúde no país? A
principal solução é criar a carreira de estado, a figura do médico como profissão
essencial, semelhante a juízes, promotores e defensores. Primeiro tem um incentivo
para o médico. Se não quiser ficar no interior, vai começar a carreira lá e depois pode
se mudar. Não fica sujeito à pressão política e tem autonomia nos atendimentos. E mais:
 onde não houver condição, nós vamos apontar para a estrutura chegar junto com o
 médico. Medicina não se faz com um estetoscópio e um termômetro na mão. Você
obrigar um médico a ir para um local desse jeito, não dá para fazer medicina.
Outros países também já adotaram esse tipo de medida. A Inglaterra tem muitos
médicos oriundos de outros países. Fizeram uma avaliação de que 85% dos erros
médicos seriam de estrangeiros. O caso mais grave no Brasil é a exposição da população
de baixa renda. É tudo o que não pode acontecer no SUS, que é um modelo universal,
 integral e que prevê a equidade social. Agora, está montada a diferenciação. Vai ter
um tipo de sistema para atender determinada população, e para a população de baixa
 renda eles nem sabem direito identificar o que é médico, então pode ser qualquer um.
 Eles estão discriminando, criando um cidadão de segunda categoria sob o ponto de
 vista da saúde. Isso é inaceitável, além de ser inconstitucional.

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